Capitulo 9

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A chuva bate na janela de vidro do meu quarto. Depois de semanas sem cair uma gota de água do céu, o mundo parece desmorona. O tédio de domingo toma conta de toda parte da casa. A Vanessa viajou novamente a trabalho na sexta e provavelmente volta hoje à noite ou amanhã de manhã. Meu pai provavelmente está na sala assistindo ao jogo de futebol, nem precisei ir até a sala para saber já que ele está xingando e desliga a Tv a cada cinco minutos e liga ela novamente em menos de um segundo.

Tem coisas que nunca mudam, penso.

Fecho os olhos, respiro fundo e me permito viajar um pouco pela minha mente. Nas últimas semanas tenho corrido de mim mesma, tenho tentado me manter em movimento e com a cabeça sempre ocupada para não ter que pensar muito nas coisas que estão acontecendo. Na mudança e na saudade que aperta tanto o peito.

A essa altura meu quarto já está com a minha cara. Os livros perfeitamente organizados nas prateleiras, as fotos em um mural improvisado na parede, a bagunça na escrivaninha, as folhas amassadas que pulam para fora da pequena lata de lixo, o papel de parede floral, os pisca-pisca ao redor da janela... Depois de um tempo achei que o melhor era me entregar ao lugar e deixar de lado essa relutância. Hoje esse quarto tem cara de meu, tem meus gostos em cada pequeno detalhe, minha cara, minha personalidade. Mas mesmo com tanta coisa minha eu ainda não sinto como se pertencesse a esse lugar.

- Filha – o rosto do meu pai aparece na porta entreaberta, acho que é um costume local fazer esse tipo de coisa, no lugar de onde eu venho a gente costuma bater na porta. – Vou pedir uma pizza, quer me ajudar a escolher o sabor?

Sorrio e aceno com a cabeça freneticamente. Respiro fundo e levanto correndo em direção a cozinha. Desde que me conheço por gente, eu e meu pai brigamos na hora de escolher o sabor da pizza. E mesmo ele sabendo perfeitamente de que entraremos em uma acirrada disputa entre quatro queijos e portuguesa ele ainda sempre me chama para “ajudar” a escolher o sabor. E no fim das contas, sempre pedimos duas pizzas. Quatro queijos para ele e portuguesa para mim.

- A pizza deve chegar em uns trinta minutos – ele diz após desligar o telefone e se sentar no sofá. – Amanhã é seu primeiro dia de aula, está ansiosa?

- Não sei. – Digo depois de pensar um pouco. – Estou nervosa por não conhecer ninguém e um pouco ansiosa para conhecer gente nova. Faz sentido?

Ele balança a cabeça de um lado pro outro e depois abre um largo sorriso. Sempre achei uma besteira esse drama todo de mudar de escola no último ano. Até acontecer comigo e me atacar o desespero.

Um ano é exatamente o tempo em que você conhece novas pessoas e cria laços. E justamente quando você começa a ter amizade com as pessoas, tudo acaba. E por mais que todo mundo negue, cada um segue seu rumo e só conseguimos nos lembrar daquelas pessoas que realmente nos marcaram, e mesmo assim isso não significa que iremos conseguir manter os laços. A distancia sempre acaba com tudo, principalmente aquela que não é medida por metros ou quilômetros.

- Tem um rapaz aqui no prédio que vai estudar com você. – Volto a realidade no mesmo instante.

- É mesmo? – Tento parecer desinteressada. Não sou muito boa em fingir e aposto que minha expressão corporal deve estar me denunciando. Sorte minha que meu pai não entende nada disso e é mais desligado que rádio queimado.

- Sim, ele é filho de dois amigos meu. Coloquei você nessa escola justamente por indicação deles. Bom menino, você deveria fazer amizade com ele.

Suspendo as sobrancelhas de leve e solto um pequeno murmuro. Não foi isso que a Vanessa me disse. Pelo que ela me contou ele é bem metido a playboy e pegador. E pelo que parece já tem dezoito anos, já que vive pra cima e pra baixo em cima de uma moto preta.

Just a Year - (COMPLETA)Onde histórias criam vida. Descubra agora