Como Oliver passou o tempo na companhia de seus respeitáveis amigos
No dia seguinte, quando o Trapaceiro e Bates estavam fora, Fagin aproveitou para fazer um longo discurso sobre o pecado da ingratidão e concluiu relatando um desagradável cenário dos desconfortos do enforcamento, expressando sua esperança de nunca precisar ser obrigado a submeter Oliver Twist a tal situação.
O garotou compreendeu as ameaças que se encontravam naquelas palavras. Então o homem saiu, trancando a porta.
E ali Oliver permaneceu o dia todo, e a maior parte de muitos dias, não vendo ninguém entre a manhã e a meia-noite. Deixado com seus próprios pensamentos durante longas horas.
Uma tarde, o Trapaceiro e Mestre Bates estavam preparando-se para sair. E, enquanto Oliver lustrava suas botas, o Trapaceiro soltou um suspiro discreto e falou, em parte de modo abstrato, em parte dirigindo-se para Mestre Bates:
– Uma pena ele não ser um gatuno!
– Ah! – respondeu Charles Bates. – Ele não sabe o que é bom para ele.
– Sabe o que é um gatuno, Oliver? – o Trapaceiro perguntou.
– Acho que sei. É o... Você é um, não é?
– Eu sou – respondeu o Trapaceiro. – E detestaria ser outra coisa. Charley também é. Fagin também é. E Sikes, e Nancy, e Bet. Todos somos, até o cachorro!
– Por que não entra para o serviço de Fagin, Oliver? – perguntou Charley. – E ganha um bom dinheiro? E então se aposenta na sua propriedade?
– Eu não gosto – replicou Oliver timidamente. – Eu queria que me deixassem ir. Eu... eu... preferia ir embora.
– E Fagin prefere que não.
Oliver sabia disso, então suspirou e voltou para a limpeza das botas.
– Fagin fará alguma coisa com você – falou o Trapaceiro –, ou seria o primeiro a não ser lucrativo. Está perdendo tempo, Oliver.
Então os dois começaram uma brilhante descrição dos prazeres da vida que levavam.
– E bote isso na cabeça, Nolly – disse o Trapaceiro quando ouviram o velho destrancando a porta –, se não pegar lenços e relógios, um outro malandro vai fazer, então será pior.
– Certamente! – falou o Judeu, que havia entrado sem que Oliver o visse. – Tudo se resume em poucas palavras, meu rapaz. Ouça o Trapaceiro. Ha! Ha! Ha! Ele entende do negócio.
A conversa não foi além, pois Fagin retornara acompanhado de Betsy e de um cavalheiro que Oliver nunca vira antes, mas a quem o Trapaceiro se referiu como Tom Chitling.
O Sr. Chitling tinha, talvez, uns dezoito anos e pediu desculpas, pois havia saído do seu "tempo" apenas uma hora atrás e não tivera a possibilidade de dar atenção à própria aparência.
– De onde acha que o cavalheiro veio, Oliver? – perguntou o velho, com um sorriso.
– Eu... eu... não sei, senhor – respondeu Oliver.
– Não importa de onde eu venho, garoto – comentou Tom –, você encontrará o caminho para lá logo, logo, aposto uma coroa!
Os garotos riram desse comentário e saíram.
A partir desse dia, raramente Oliver era deixado sozinho. Ficava na companhia dos dois garotos, que brincavam do velho jogo com Fagin todos os dias. Em outros momentos, o velho contava histórias de roubos que havia cometido quando era mais jovem de um jeito tão engraçado e curioso, que Oliver ria com vontade.
O velho astuto tinha o menino em sua armadilha. E, preparando sua cabeça pela solidão e pela amargura, estava lentamente injetando em sua alma o veneno que esperava enegrecê-la e mudar sua cor para sempre.