Chega a hora de Nancy cumprir sua promessa a Rose Maylie, e ela falha
Perita que era na arte de dissimulação, Nancy não poderia conceber o efeito que o passo que havia dado teria sobre sua mente. Seus temores por Sikes teriam sido poderosos motivos para desistir, mas estava decidida.
Porém suas batalhas mentais acabaram deixando seus rastros. Ela ficou mais pálida e magra. Às vezes não prestava atenção no que acontecia à sua frente, e outras, ria sem motivo e calava-se em seguida, dizendo que estava doente.
Era noite de domingo, e o sino da igreja mais próxima anunciou a hora. Onze.
– Uma boa noite para negócios – disse Sikes. – Precisaremos descontar o tempo perdido quando tudo estiver nos eixos.
– É assim que se fala, meu caro – respondeu Fagin.
E, puxando Sikes pela manga, apontou o dedo para Nancy, que estava saindo.
– Onde diabos está indo a essa hora? – gritou Sikes. – Não vai a lugar nenhum.
– Não estou bem – reclamou a garota. – Preciso respirar.
– Coloca a cabeça na janela – respondeu Sikes.
– Quero respirar na rua.
Ele levantou-se, trancou a porta, tirou a chave.
– O que é isso, Bill? – disse ficando muito pálida.
– Ela está fora de si – gritou Sikes virando-se para Fagin.
– Diga a ele para me deixar ir, Fagin. Ele está melhor – gritou Nancy batendo o pé no chão.
– O que aconteceu com você, sua vagabunda? – Sikes virou a cadeira para confrontá-la. – Levante-se.
– Não até você me deixar ir... – berrou a garota.
Ele agarrou as mãos dela e puxou-a para um pequeno quarto adjacente. Ela se debateu e implorou até o relógio bater doze horas e então, exausta, parou de brigar.
Sikes a deixou lá e voltou a Fagin.
– Acho que ainda tem alguma coisa daquela febre no sangue – falou.
Fagin acenou uma aprovação.
– Ela ficou comigo dia e noite quando eu estava na cama – disse Sikes. – Ficar presa aqui por tanto tempo, acabou deixando ela assim.
E então a garota apareceu. Seus olhos estavam inchados e vermelhos. Ela ficou se balançando para a frente e para trás e, após um tempo, explodiu numa gargalhada.
– Veja, agora está no outro extremo! – exclamou Sikes.
Fagin acenou para que ele não tomasse conhecimento e, em alguns minutos, a garota voltou ao seu comportamento normal. Então o velho pegou o chapéu e perguntou se ela poderia iluminar a escada escura para ele.
Quando chegaram à porta ele sussurrou.
– O que há, Nancy? Ele está sendo duro demais com você? Se quiser se vingar de quem a trata como um cachorro... como um cachorro!
– Conheço você – respondeu a garota sem demonstrar emoção. – Boa noite.
Fagin foi para casa, meditando sobre aquilo. Chegara à conclusão de que Nancy havia se apaixonado por alguém que não estava entre os seus lacaios. Além disso, Sikes sabia demais.
– Com um pouco de persuasão – pensou Fagin –, seria bem provável que ela consentisse em envenená-lo. Estaria o homem que odeio fora...
Mas talvez ela se negasse a executar um plano para tirar a vida de Sikes. "Como", pensou Fagin, "posso aumentar minha influência sobre ela?"
E se a vigiasse? Descobrindo o motivo de seu comportamento alterado, não garantiria sua cumplicidade?
– Eu posso – falou quase em voz alta. – Os meios eu tenho, basta colocar em prática.