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O silêncio era contínuo, infinito

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O silêncio era contínuo, infinito.

De certa forma, a ausência do som me dava a sensação de viver em câmera lenta. Os alunos ao meu redor mexiam os lábios de forma lenta, se mexiam de forma lenta, expressavam suas feições — que agora posso notar o quão podem ser bizarras — de forma lenta. Eu me mexia de forma lenta.

Apesar disso, dessa parte boa, também havia as ruins; eu gostava de poder ouvir, de poder ouvir as vozes das pessoas ao meu redor e poder identificar o que diziam pela audição e não pela leitura labial, a qual, após quase três anos surdo, eu pude aperfeiçoar, e gostava de poder ouvir músicas, ouvir o som da TV e da voz da minha mãe.

Desci os três degraus para sair da escola e caminhar pelo estacionamento, os olhos bem abertos para o que estava à direita, à esquerda, à frente e à atrás. Minha mãe me esperava com um enorme sorriso dentro de seu Kwid Life marrom.

Abri um sorriso contido em sua direção enquanto dava a volta no carro e abria a porta do passageiro, me aconchegando no banco em seguida.

— As aulas foram ótima, eu estou ótimo, tenho três atividades para fazer e um trabalho de sexologia sobre as infecções sexualmente transmissíveis, e não, nenhuma garota veio falar comigo. — Lancei um olhar irônico para a mulher, que já estava com os lábios entreabertos, prestes a fazer as perguntas rotineiras de sempre. — E eu amo pizza de calabresa. 

A mulher sorriu convencida e girou a chave na ignição, despertando o motor do carro que somente identifiquei quando todo o veículo tremeu continuamente, me fazendo puxar o cinto de segurança e me prender ao banco.

Seguimos para fora do colégio, meus olhos fixos na janela, nos alunos que passavam de carro, ou moto, ou bicicleta ou andando, reparando apenas naqueles que portavam a jaqueta negra do time, o que sempre faz meu peito arder em saudade da sensação boa que me corroía sempre que entrava em campo quase 3 anos antes. Antes do acidente e das suas consequências.

O caminho até minha casa é curto e poderia segui-lo a pé caso não tivesse uma mãe superprotetora que se culpa diariamente pela minha surdez e que faz questão de me levar e me trazer da escola, o que não é nada ruim, aliás, eu somente buscava um tempo a mais só para mim.

Paramos em frente a nossa moradia 5 minutos após ter entrado no carro, e de cara pude notar que minha mãe havia aparado cerca de poucos centímetros da grama em frente a residência moderadamente média. Uma das partes boa de não poder ouvir, é que meus outros sentidos (olfato e visão, principalmente) aguçaram bastante e, após ter virado a lenda do colégio pelo acidente e ter me tornado reservado e observador, me fazem notar qualquer coisa que esteja significantemente errada.

— Curti — comentei e rapidamente me voltei para minha mãe, mirando meu olhar em seus lábios.

Eles abriram e se mexeram e meu cérebro começou a processar rápido, até que, como uma máquina de pão, a frase saiu quentinha após um “tic” mental e fingido:

Sintonia Silenciosa | ✓Onde histórias criam vida. Descubra agora