Catorze

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Litoral de SP, janeiro de 2011

Exaustos de tanto andar pela orla da praia debaixo do sol quente de verão, os dois desabaram juntos na areia morna, num canto afastado e tranquilo próximo da divisa das duas cidades, sentindo os grãos se grudarem em cada centímetro dos pés suados e dormentes. E assim ficaram por alguns minutos, apenas com o olhar fixo na bola laranja sendo engolida pelo mar.

A brisa salgada que vinha do oceano balançou os cachos amassados da garota, fazendo com o que algumas mechas pesadas escondessem seu rosto parcialmente. Se apoiando nos cotovelos, ela inclinou o corpo para trás, encarando por entre os fios o céu com nuances de laranja e violeta por causa do pôr do sol.

O garoto ao seu lado, num ímpeto de deslumbramento, virou o tronco e esticou a mão, tocando levemente a face dela com as pontas dos dedos e afastando seus cachos negros, colocando-os atrás da delicada orelha, adornada com um brinco brilhante e solitário. Para ele, a luz dourada banhando todo o corpo escultural dela era fascinante. A pele marrom ganhara pelo menos mais dois tons escuros por conta da longa exposição. Ele apenas a olhou, perdendo um pouco do ar só de se recordar que o tempo deles estava terminando. E ele não conseguia mais se conter. Precisava senti-la nem que fosse pela última vez.

Ela o observou por alguns segundos, sabendo o que ele pretendia ao se aproximar assim devagar. A hora do adeus já está próxima, ela pensou. Esse será o nosso último beijo.

Ele encaixou as palmas no rosto dela, encarando seus lábios fartos, beijados inúmeras vezes por ele naquela mesma tarde; no festival, na orla, no shopping, no mar e no banheiro público, trancados em uma das cabines. Com as horas passadas se acostumara à presença e energia dela, pensando que, se ela quisesse, eles poderiam tentar no futuro. Por que não?

O aparelho celular dela tremera mais uma vez convulsivamente dentro da bolsa, fazendo o garoto espantar o que pensava. Uma ligação.

E ambos souberam: o pai dela chegara.

–– Droga! –– murmurou, o desespero se infiltrando em cada parte de si. Ela tem que ir. Ela tem que olhá-lo e beijá-lo e lhe dizer adeus.

Entendendo que o tempo acabou, ele pressionou seus lábios nos dela, numa pressa sôfrega, entregando-se completamente à garota desconhecida... Ele arregalou os olhos, de repente se lembrando de algo importante. Em todas essas horas que estavam juntos, eles não trocaram números, muito menos disseram seus nomes.

O celular começou a tremer de novo. Ela arfou, levantando-se toda atrapalhada da areia. Atordoado, o garoto apenas passou a língua no lábio, ainda sentindo o resquício do gosto do suco de laranja que compartilharam dez minutos antes num quiosque perto.

–– Espera! –– grita ele, notando que ela corre pela areia, cada vez mais longe dele.

–– Eu preciso ir! –– dissera ela, sem diminuir a velocidade. Não conseguia se despedir dele. Se voltasse, ia chorar, com certeza. E ela odeia chorar. Ainda mais na frente de outras pessoas.

–– Espera! –– Ele tentou novamente, indo atrás dela, xingando-se por ter sido tão estúpido de ter esquecido de algo tão simples como trocar contatos. Mas até que tinha uma desculpa: estar com ela o fez esquecer do mundo ao seu redor.

A garota alcançou a calçada e se jogou com tudo num carro cinza que acabara de parar junto do meio-fio. O pai dela, parecendo distraído. Que acelerou o automóvel na mesma hora, aproveitando que um dos semáforos acabara de abrir.

O garoto não desistiu. A adrenalina percorreu seus ossos e uma força se apoderou de seu corpo. Ele correu desvairado e com agilidade pela calçada, se desviando dos pedestres que vinham em sua direção.

#2 - Logo Após Você PartirOnde histórias criam vida. Descubra agora