Sete

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Ele

Eu subestimei a Milena.

Me pergunto mentalmente enquanto ando de um lado para o outro se isso é para me atingir ou ela apenas é tão má e mesquinha que não se importa com ninguém além dela mesma. Mas, sinceramente, qualquer que seja a resposta, é assustador ter noção que confiei e dividi minha vida com alguém assim um dia.

E se antes eu já estava decidido a trazer as duas, agora mesmo que não volto atrás. Até então eu não sabia do que ela era capaz, mas já que descobri, ela não perde por esperar. Eu avisei desde a primeira vez que não deixaria aquilo barato, que conseguiria a guarda unilateral das duas em breve. E se eu precisar de uma forte testemunha, acho que Isabela pode vir a ser.

Falando em Isabela... Ela está em silêncio, fazendo uma careta de dor. Tem algo de errado com ela. Se eu não estivesse tão transtornado, teria percebido antes.

–– Você está bem? –– E me aproximo.

–– Torci o pé enquanto vinha –– murmura, encarando a sapatilha preta. –– Tá doendo pra cacete. Você tem um analgésico?

–– Tenho –– respondo, segurando-a com força pela cintura. O calor que emana de seu corpo me deixa atordoado. –– Você precisa se sentar.

–– Preciso voltar para a escola daqui a pouco –– comunica, me acompanhando até a sala. Fecho a porta com um chute delicado. –– Não comi nada ainda.

–– Eu fiz o almoço –– digo, ajeitando-a no sofá. –– Você come aqui e vamos juntos no carro. Vou ir buscar a Beca. E ir até a casa da Milena pegar a Gabi. Vou trazê-las para cá.

–– Você pode? –– inquire Isabela com preocupação.

–– Posso –– respondo, indo buscar a caixinha de remédios ali perto na estante de livros. Coloco as folhas que ela me dera entre dois livros. –– Temos a guarda compartilhada por enquanto. Vou pegar um pouco de água.

–– Não precisa. –– E simples assim, ela engole o comprimido a seco. –– Bela coleção –– elogia, apontando para a estante alta de oito prateleiras. –– Qual o seu preferido dele?

–– À Espera de Um Milagre.

–– Chorei com o filme.

–– Quer chorar com o livro também? –– questiono, adentrando a cozinha. Como o cômodo é no estilo americano, eu tenho toda a visão da sala por causa do baixo balcão que os separa.

–– Você me emprestaria? –– pergunta ela. A descrença dardeja dos olhos escuros. Eu acho graça e sorrio.

–– Óbvio. Você já provou que é de confiança.

Isabela considera minhas palavras.

–– Bom saber que você me tem em alta conta.

Pego um prato limpo e fundo no armário e vou até o fogão. Coloco arroz, feijão (sem beterraba, pelo amor de Deus), alguns pedaços de carne de panela e batata cozida.

–– Eu ainda não te agradeci –– digo, pousando o prato no balcão.

–– Hum? –– Ela desvia os olhos da estante para me olhar. Volto rapidamente até a sala para ajudá-la a se erguer.

–– Pelo que você fez pela Beca. E por ter vindo me procurar.

–– Mas eu não fiz quase nada –– contesta, se apoiando em meu ombro.

–– Esse quase nada foi tudo para mim, então obrigado –– rebato com delicadeza. Sinto-a suspirar.

–– Fiquei meio desesperada quando você não atendeu o celular nas inúmeras vezes que a vice e eu tentamos –– confessa, se acomodando no banco. –– Pensei que tinha acontecido alguma coisa séria com você. Obrigada pela ajuda.

#2 - Logo Após Você PartirOnde histórias criam vida. Descubra agora