CAPÍTULO 1 - BR 232

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Caroline

Julho de 2039

Cabrobó, cidade localizada no Sertão do São Francisco, conhecida de forma disfarçada como terra da cebola e do arroz, mas todos aqui sabem que a sua verdadeira fonte de renda é a massa. É preciso encarar mais de 7 horas de volante para percorrer os 530 quilômetros que separam essa terra da capital pernambucana, contudo, não espere muita coisa além de uma bela fotografia da caatinga nordestina. A minha história começa aqui, no meio do nada e dentro de todos os motivos responsáveis por me tornar uma representante do crime brasileiro.

Eu cresci em uma pequena fazenda de ervas e temperos; meu pai plantava e vendia a colheita na feira. Ironicamente o velho queria fugir da tradição da cidade na tentativa de obter mais lucros, no entanto, a seca acabou com todos os planos milionários dele. O clima cruel do sertão nos castigou por muito tempo e nossas economias foram por água abaixo. Lembro-me como se fosse hoje, o momento onde painho beijou a minha cabeça e disse que logo voltava com dinheiro; e também não consigo esquecer de quando aqueles olhos castanhos fingiram não conhecer os meus no meio de um restaurante na Avenida Paulista. O homem nos deixou sem nada para tentar a vida em São Paulo; saiu prometendo nos mandar dinheiro e voltar em breve; entretanto, meu querido pai nunca nos ajudou financeiramente e tão pouco voltou. Eu vi a minha mãe morrer porque não tínhamos condições de comprar os seus remédios, passei fome e quase tirei a minha vida em meio a tanto desespero.

Por sorte conheci Francisco, ele estava de passagem pela cidade e se apaixonou por mim quando tentou comprar as minhas terras. Chico era um homem gentil e bonito, seus cabelos castanhos estavam sempre muito bem arrumados e seus olhos mesclavam entre azuis e verdes de acordo com a hora do dia; o homem, de sorriso galanteador, tinha um porte perfeito de boiadeiro: forte e robusto. Minha pequena; era assim que ele me chamava quando chegava em casa e me abraçava. Era possível sentir a aspereza das suas mãos, denunciando as horas seguidas em que elas tinham segurado as rédeas de seu cavalo; e mesmo assim, ele me tocava como se eu pudesse quebrar a qualquer momento, com enorme delicadeza. Seu rosto levemente ressecado, devido à exposição ao sol, e sua roupa empoeirada, eram outras delações de um dia puxado. Chegava a ser engraçada a maneira como ele praticamente se despia do lado de fora para não sujar a minha casinha, mesmo que eu não o tivesse intimado a fazer aquilo; sem falar da maneira romântica de como me cortejava, trazendo sempre uma flor de qualquer qualidade no final do dia.

Meu pretendente me enchia de mimos, sempre demonstrando o quanto podia fazer uma mulher muito feliz, mas por algum motivo eu não conseguia me apaixonar por ele, até o dia em que recebi a notícia de que Chico estaria retornando a São Paulo. Ah, foi amor ao primeiro convite! Não pensei duas vezes em aceitar o seu pedido de casamento e partir com destino a capital paulista, porém, não sem antes vender a fazenda para a Condessa de Cabrobó. Eu não a conheço, todavia, sei muito bem quem mediou a venda, a Baronesa de Caruaru, sua advogada e hoje, minha chefe.

Eu sabia que Francisco era funcionário da Duquesa de Paulo Afonso e também entendia a posição do meu marido como um Lord do crime - e não um boiadeiro, um homem de confiança de sua soberana; responsável por negociar novas terras e controlar a distribuição de drogas no Sul e Sudeste do País. Nunca me meti nos negócios dele e acredito que a Duquesa não teve conhecimento da minha existência por muito tempo, mas o homem tinha a língua solta e me contava todos os detalhes do seu dia – informações servidas para, aos poucos, me ajudar a aprender como funcionava o crime no alto escalão. Era obvio que a mulher queria comprar as minhas terras com a ideia de plantar maconha e expandir seus negócios por Pernambuco, no entanto, isso pouco me importava; eu só queria sair daquela cidade, encontrar painho e dar um belo tapa nas suas ventas, depois de pedir a benção, é claro. Contudo, por algum motivo, a toda poderosa desistiu da compra e eu acabei por vender para a Condessa por um preço ainda maior.

UMA NOVA CHANCE (Original)Onde histórias criam vida. Descubra agora