14

1.2K 136 4
                                    

O dia já havia chegado ao fim, mas os olhos verdes ainda se mantinham na estrada. As três garotas que dormiam na parte de trás foram para lá em um momento onde a chuva havia cessado. Apesar do breu, no céu ainda se podia notar as nuvens carregadas e graças ao farol aceso se notava os grossos pingos de chuva caindo. 
 
-- Já que você não fala comigo será que poderia me emprestar seu livro? -- Any comentou, sendo a primeira a falar em horas.
 
-- Não!
 
-- Eu estou no tédio, Savannah. Você não fala, não quer a rádio e nem a TV ligada agora, não deixa eu ler o seu livro. Poxa, isso é chato! -- Ela disse e bufou cruzando os braços.
 
-- Se você tivesse pegado carona com um mudo que tem um caminhão velho sem TV ou rádio e que não gosta de ler teria dado na mesma. Então não reclame.
 
-- Chata! -- Any vociferou e para sua surpresa Savannah riu baixinho.
 
-- Se não fosse esse aniversário eu não teria parado e meu humor estaria bem melhor. -- Savannah falou, fazendo Any se virar para lhe fitar de frente.
 
-- Eu disse que não precisava de nada daquilo. Vocês conversando comigo bastaria! -- Any disse docemente e então o rubor tomou conta de suas bochechas pelo que ela diria a seguir. -- Sabe, foi o primeiro aniversário em anos que eu passei me divertindo, tendo alguém conversando comigo sem me xingar ou...
 
-- Meu pai costumava comemorar os aniversários como se fossem uma benção dos céus. Eu só quis honrar a tradição, mas isso acabou me custando várias horas, graças à uma viajante sem rumo que encontramos na estrada. -- Savannah disse rindo friamente, fazendo Any realmente perder a paciência.
 
-- Você que quis seguir a tradição do seu pai, então não me culpe! Eu jamais pedi por aquilo, jamais pedi por nada daquilo. Eu deixei claro que estava tudo bem do jeito que estava. -- Any disse sentindo seu peito inflar de raiva, mas respirou fundo em busca de autocontrole.
 
-- Vamos parar por hoje. -- Savannah disse, parando o caminhão e se virando bruscamente para Any. -- Vejamos, você chegou aqui com a sua gata, com aquele jeitinho doce e fofo, com o sorriso calmo e roubou o resto de paz que me sobrava. -- Ela alegou com veemência. -- Tocou na porcaria da rádio quando eu disse para não mexer, ficou usando aquele tom fodido e sensual quando eu disse que sexo era algo sério para mim, me constrangeu com o assunto do DVD e ainda quer invadir a minha privacidade ao ler o meu livro. -- Savannah falou, vendo Any abrir a boca e sua expressão beirar à fúria. -- Além de te ceder o meu lugar de dormir você ainda quer o que mais?
 
-- Por que continuou me dando carona se eu te incomodo tanto, então? 
 
-- Eu não deixaria você no meio do nada. Não sou tão ruim assim.
 
-- Mas é uma idiota. Uma grande idiota! -- A menor proferiu.
 
-- Por quê? Só porque ainda não transei com você? -- Savannah perguntou irritada. -- Costuma sempre se oferecer para desconhecidos?
 
O silêncio a seguir veio da parte de ambas. Any negou a cabeça incrédula e abriu a porta do caminhão, saindo na chuva sem se importar com o frio.
 
-- Any! O que está fazendo? -- Savannah gritou, vendo a garota bater a porta de seu caminhão com força. -- Pare de birra, volte já aqui. -- Seus olhos acompanharam a garota seguir o caminho a pé, sem olhar para trás. 
 
"Ela vai voltar quando ver que eu não vou atrás." Savannah pensou, mas o tempo foi passando e a figura de Any quase sumia de sua vista. 
 
Savannah bufou irritada e voltou a andar com o caminhão, alcançando Any e parando o caminhão. Ela correu para a janela do passageiro e a abriu.
 
-- Any, está muito frio. Pare com isso! -- A garota nada respondeu, seguiu seu caminho. Savannah se encolheu ao sentir o vento frio cortar sua espinha e fechou os olhos sentindo o cheiro de terra molhada. -- A sua gata ainda está aqui.
 
-- Não posso submeter ela a isso. Diga a Sofya para por favor cuidar dela e com sorte nos encontramos em San Diego, assim recupero meu nenêm. -- Any disse e Savannah bufou.
 
-- Vou soltar ela na chuva se não entrar. -- Any parou e se virou bruscamente, não enxergando nada devido ao farol em seu rosto.
 
-- De você não duvido nada. Vamos lá! Solte-a! A chuva não irá matá-la e pela manhã estarei com ela, pelo menos. -- Any disse e Savannah revirou os olhos.
 
-- Certo. Eu não iria soltá-la de verdade, agora pode voltar, por favor? 
 
-- Não! -- Any disse, voltando a se virar e a caminhar. Abraçou seu próprio corpo ao sentir a rajada forte de vento que atingiu todo o seu ser. As gotas eram quase congelantes, mas ela realmente havia se sentido ofendida.
 
Savannah reclamou e deu um tapa forte na porta, antes de fazer uma careta de raiva e abrir a porta, saindo no meio da chuva para seguir Any.
 
-- Espere! -- Savannah disse, ao alcançar Any, já que havia corrido. -- Me desculpe.
 
-- Sabe de uma coisa, Savannah? Eu nunca pensei que uma pessoa que eu conheci a menos de uma semana pudesse me magoar, mas adivinha? Aconteceu. -- Ela disse ao se virar bruscamente.
 
-- Eu não quis dizer aquilo. -- Savannah explicou, olhando a grande escuridão em volta de si.
 
-- Você nunca quer, não é mesmo? -- Any riu e negou com a cabeça. -- Eu nunca agi daquele jeito com ninguém, eu não sei que porra você tem que me fez agir pelo impulso, mas já aprendi com meu erro. Não farei isso com mais ninguém. Nunca! 
 
-- Está frio para diabos. Vamos entrar e conversar lá dentro do caminhão, por favor? -- Savannah pediu baixando o tom de voz. 
 
-- Para quê? Para na próxima oportunidade você jogar na minha cara o quanto eu te incomodo? -- Any riu com escárnio. -- Não, obrigada.
 
-- Yoon... -- Savannah disse tentando segurar o braço fino de Any, mas a menor se esquivou. Savannah fitou o rosto aborrecido em sua frente. Alguns fios de cabelo estavam grudados em sua testa por estarem molhados e, consequentemente, mais escuros; os lábios mais avermelhados e a pele mais branca devido ao frio, o vapor saindo da boca dela conforme xingava e os olhos levemente cerrados porque chovia intensamente; incrivelmente linda, pensou Savannah.
 
-- Eu cansei de te pedir desculpas por cada coisa que eu faço, Savannah. -- Any disse mais calma dessa vez. Seus olhos desceram para suas mãos e ela respirou com dificuldade, consequência do frio. -- Eu simplesmente tinha amado o dia; eu me diverti, conheci melhor você, digo... Vocês. -- Corrigiu. O farol era a única coisa que as iluminava e o barulho dos sapos era alto, trazendo a sensação de solidão ao lugar. -- Eu não vou mais te molestar, fique tranquila.
 
-- Será que você não percebe? -- Savannah perguntou, puxando o braço de Any, fazendo seus corpos se chocarem. -- Eu só te trato assim porque eu não sei agir perto de você. -- A maior sussurrou, fitando o rosto todo molhado pela chuva de Any.
 
-- Bem, agir desse jeito estúpido não melhora a situação. -- Any alegou, erguendo o rosto para falar cara a cara com Savannah.
 
-- E se eu te tratar assim? -- Savannah sussurrou, se inclinando e roçando seus lábios nos de Any. -- Melhora? -- A menor suspirou ao sentir a boca quente de Savannah escovar em seus lábios frios.
 
-- Se tivesse me tratado assim até alguns minutos atrás teria melhorado. Agora não. -- Any disse em um murmúrio, sentindo os braços de Savannah rodearam sua cintura e a mais velha colar mais os seus corpos encharcados e frios.
 
-- Nada do que eu disse lá dentro tem que ser levado a sério, Any. Você só... abalou meu mundo, minha rotina um pouco e eu não sei como agir quanto a isso. -- Savannah disse, vacilando na última palavra pois seu queixo tremeu, tamanho era o frio que sentia. -- Eu não estaria aqui na chuva se eu não estivesse arrependida. -- O olhar castanho se ergueu até as esferas verdes e Any suspirou, sentindo todo o seu corpo arrepiado.
 
-- Do que tem tanto medo? -- Any perguntou em um murmúrio, ouvindo o barulho das folhas de algumas árvores balançarem fortemente. Savannah sentiu seu estômago se revolver dentro de sua barriga e negou com a cabeça. 
 
-- Eu não sei. -- Ela confessou, baixando seu olhar em confusão.
 
-- Não sabe? -- Any perguntou em um fio de voz e Savannah voltou a menear a cabeça. -- Então deixa eu testar uma teoria. -- Sussurrou, levando uma mão ao queixo de Savannah e erguendo seu rosto. Seu olhar se encontrou com o de Savannah e então ela se inclinou vagarosamente, tocando seus lábios frios contra os lábios quentes de Savannah, mas dessa vez não era só um simples roçar de lábios. Não! era um beijo. Um de verdade.
 
------------------------------
 

Destino Incerto (Savany) Onde histórias criam vida. Descubra agora