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Kate

Como eu tinha previsto, acordo com o corpo todo dolorido, e as marcas da presença de Hero, ainda mais evidentes. O que era vermelho ficou mais escuro e o que já era roxo se tornaram hematomas. Não consigo parar de me olhar no espelho perguntando como eu não senti isso acontecer. Tem um corte fino nos meus lábios que eu não sei responder quem fez, mas que está me incomodando um pouco. Até hoje eu não suportava ver marcas em mim, elas sempre significavam que uma grande merda tinha acontecido, e que aquilo não iria embora quando o roxo sumisse. Me sinto estranha por gostar do que vejo no espelho, por não conseguir parar de reviver alguns momentos que me deram essas marcas. Uma parte de mim diz que é só o choque de ter transado com o cara que sempre imaginei ir para a cama, a outra parte está em alerta máximo para evitar problemas futuros. Não me culpo por nenhuma das partes, tenho razões o suficiente que justificam cada uma delas, e é mais do que normal eu me sentir assim.

Decido que é melhor sair para espairecer da minha maneira favorita, sapatilhas e música alta. Entrei no balé aos seis anos, e quando a "heroterapia" não funcionava, exercícios físicos até a exaustão eram a válvula de escape perfeita. Já perdi as contas de quantas vezes desmaiei dançando, já quebrei um osso ou lesionei um músculo por causa disso. A primeira vez que subi nas sapatilhas foi como me encontrar, ali me senti livre e poderosa, assim como a primeira vez que subi em um sapato de salto. Muitas pessoas não sabem, mas só consigo fazer o que quero em cima dos meus sapatos por causa da minha sapatilha.

Checo minha mãe antes de sair, só para descobrir que está apagada no sofá. Nada novo por aqui.

Andar até o estúdio que treino desde garota nunca me levou tanto tempo, até porque nunca me senti tão dolorida entre as pernas. De um jeito bom, é claro. Destranco a sala e o reflexo do meu corpo refletido várias vezes me faz rir. De moletom e cropped pareço um zumbi fashion. Repondo as setenta mensagens de Mercy com um simples emoji de sapatilhas e coloco o celular no modo avião. Aqui dentro gosto de ser sozinha. Desde que minha antiga professora descobriu que a nossa situação financeira não era boa, depois de sair daquela maldita casa, me deixou usar o estúdio quando ninguém estivesse precisando. Com cinco quadras de casa, eu praticamente vivo aqui. Trabalho de dia dando aulas de balé para iniciantes e intermediários e treino de noite.

Depois de alongar o corpo, e descobrir mais locai doloridos, aumento a música e visto as sapatilhas. Dez minutos depois Mercy aparece na porta, já com as sapatilhas. Mercy entrou no balé por minha causa, mas se apaixonou também. a única diferença é que eu vivo de balé nas escondidas, Mercy já se apresentou em cima das sapatilhas. Seus olhos encontram os meus no espelho, pedindo autorização para entrar. Continuo o que estava fazendo, ignorando completamente sua presença.

- Você não vai me ignorar. - Sua bolsa é jogada ao lado da minha. - Vou ficar aqui até você falar.

- Não quero conversar. - Respondo bebendo água.

- Você não vem dançar no fim de semana tem alguns meses. - Mercy começa a se alongar na barra. - O que foi dessa vez?

- Depende, o fato de que eu sustento uma casa com meu salário de professora, minha mãe drogada no sofá ou a culpa por ter gostado disso? - Desço a calça de moletom, mostrando as pequenas marcas de dedo pelas pernas.

- Isso foi meu irmão? - Seus olhos estão entre chocados e bravos. - Que merda vocês fizeram?

- Sexo. - Subo a calça de volta.

- Se sexo for isso, eu não quero saber como é nunca. - Mercy para de se alongar para prender o cabelo. - Mas prefiro você aqui do que jogada junto com a sua mãe.

- Eu não uso mais nada. Estou a dois anos limpa. - Encaro o espelho por alguns segundos. - A última vez que fumei foi com você.

Quase tive um problema com o usa de drogas entre meus quatorze e dezesseis anos. Cresci com uma usuária e convivi anos com o cheiro de maconha pela casa, muitas vezes ficava chapada só de entrar na sala de casa. Não cheguei a depender propriamente da maconha, mas usava para me esquecer dos abusos, e quando eles acabaram, o uso também cessou.

Empowered Women - A história de KateOnde histórias criam vida. Descubra agora