– Concentre-se.
– Eu estou concentrada.
– Se concentre mais.
– Fica difícil com você falando de cinco em cinco minutos.
Rue revirou os olhos.
– Imagine ele se dissolvendo.
– Estou imaginando.
– Imagine com mais afinco.
– Pela Mãe! Você não deveria ser um encantador frio e calculista de poucas palavras? Tagarela não faz seu tipo, então cale a boca!
Rue estalou a língua.
Seu gato pulava os olhos dela para ele. Se fosse humano, tinha certeza de que estaria com as sobrancelhas erguidas.
– É você quem guia o poder. – Rue murmurou de novo, de onde estava com os braços cruzados e as costas coladas no tronco de uma árvore.
– Sim, sim. – Resmungou entediada, observando Fumaça sentado à sua frente.
– Leve a sério, Astéria.
Ela bufou, irritada e colocou-se de pé. Rue e Fumaça observaram-na.
Andou pelo meio da clareira, olhando com atenção o chão.
O objetivo era tentar fazer com que ela manipulasse as sombras para filetes escuros como os dele. Mas Astéria não conseguia. Não sabia como o poder se enraizava dentro si. Não sabia como controlá-lo, e na verdade, começava a pensar que sequer conseguiria fazer isso. Era mais como se Fumaça fosse vivo, um ser que apenas escolhera servir a ela. E pedir para o gato assumir outra forma também não adiantara.
– O que está fazendo? – Rue perguntou quando ela se abaixou no chão e roçou os dedos na grama.
– Procurando uma pedra para atirar nele.
– Para quê?
– Para ver se assim ele se dissolve em sombras.
Ela quase ouviu Rue revirando os olhos de novo.
Pegou uma pedra pequena e segurou-a na mão. Virou-se para Fumaça. Seu gato revirava os olhos exatamente como Rue.
Atirou a pedra.
Fumaça sequer piscou quando a mesma atravessou o corpo negro e rolou pela grama até bater nos pés de Rue.
Astéria revirou os olhos exatamente como o gato e o encantador mau humorados.
– Bem, pelo menos confirmamos que ele realmente é feito de sombras! – Disse para Rue, que esfregou a ponte do nariz com os dedos.
– Vou caçar o jantar. Continue praticando.
O encantador se dissolveu em sombras sem rodeios, e Astéria mostrou a língua para o lugar onde ele estivera um segundo antes.
– Eu não chamaria isso de praticar. – Resmungou sozinha, estreitando os olhos para o gato – E você, seu gato inútil? Quando vai começar a colaborar comigo?
Fumaça bateu a ponta do rabo no chão, impaciente.
Astéria expirou, esfregando os olhos. Já estava quase anoitecendo.
Há duas semanas eles seguiam em um ritmo cansativo, procurando por Aegon. Haviam visitado um lugar diferente a cada noite, e usavam o dia para dormir, debater novas possibilidades e tentar treinar Astéria como uma encantadora de sombras. Ela também passeava entre as memórias da espada de Aegon sempre que podia, mas encontrava apenas lembranças de momentos felizes ou tristes do encantador – muitas, inclusive, envolvendo-a, e cada memória parecia partir seu coração. Não encontrara mais nada relevante. Nenhuma informação de onde ele poderia estar.
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Herdeira de Sol e Sombras
RomansaAstéria venceu a guerra de Hybern como imediata e comandante do Grão-Senhor da Corte Diurna. Agora, precisava vencer a guerra de sol e sombras dentro de si. Todos os dias ela tentava domar o mar revolto de trevas em que seu coração submergiu após os...