Capítulo 17 - O príncipe fraco

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Sufoco tudo, o pânico me consumindo depois das palavras de Balor. Bem-vinda à sua nova vida. Eu terei de me expor de agora em diante, fingir ser uma deles e continuar com o meu trabalho original, sabe-se lá onde. É muito pior quando penso em tudo e bagunço a minha mente com exageros, principalmente no que diz respeito a parecer uma druida.

Eu ingeri uma seiva com gosto apimentado, de corroer a alma, e tive que fingir ter tomado um chá. Foi um inferno por causa de uma bebida. Uma maldita e única bebida. Como será então a comida? Os costumes? Os trejeitos e falas? Eu não sei nada disso, e serei obrigada a aprender em tempo recorde.

A praça que estou localizada é espaçosa, muito maior que as de Wexford. Tem o piso de madeira e sinceramente isso é o de menos, apesar de ser a primeira vez que vejo tamanha delicadeza em um espaço público. Na minha terra, estar em praças é suspeito, pois ali é feita a troca e venda de itens contrabandeados de Kildare. Aqui não é assim, os druidas passam conversando alegremente e há crianças também. Há parques policromados, onde os menores se divertem nos brinquedos. Outros tomam chá em mesas e outros alimentam passarinhos. Há sorrisos onde quer que eu olhe.

Tem um símbolo de tríscele pintado em branco, no centro da praça, e é tão grande que as crianças brincam de correr por ele, como uma ponte. Lembro-me das aulas, Redmond me contou que os druidas reconhecem o símbolo como a representação do corpo, alma e espírito, embora eu e minha família o vejamos diferente, acho que representa vida, morte e renascimento. Minha mãe é a que mais acredita na versão dos druidas.

Me sinto uma celebridade, ou melhor, uma aberração à mostra. Os druidas usam panos de seda coloridos, finos e pomposos, enquanto ainda estou com meus trapos, passando longe de ser uma vestimenta adequada.

Estou imersiva no meu desespero silencioso e tortuoso, até Balor me cutucar e mostrar um papel dobrado em mãos.

― Já que Redmond disse te conhecer e ninguém sabe da sua origem, Rei Dagda ordenou que você fosse trazida para uma audiência. Dother tentou impedir isso, mas, por não ter conseguido evitar a audiência, ele planejou e escreveu o que você deverá dizer ― afirma, sem se preocupar com os pronomes de tratamento.

Dother prometeu que falaria com ela e cumpriu com sua promessa... Dessa vez ele realmente cumpriu.

― Sua Majestade bolou num único fim de semana uma história que justifique a minha presença aqui? ― Apesar da graciosidade falsa, a parte perplexa do meu tom é verdadeira. Balor assente para a minha questão. ― É muita gentileza.

― Sim, é muita gentileza.

Faço menção de pegar a folha, porém Balor afasta a sua mão da minha e a deixa ao lado de sua cabeça, onde é impossível eu alcançar.

― Vamos nos poupar da perda de tempo ― determina ela. ― Você não vai mais para o julgamento se estiver arrependida de aceitar o trabalho. Agora, ou você conclui o arco e as flechas, ou vão encontrar o seu corpo numa cova muito mal fechada e escondida.

Balor gosta de me ameaçar, então o melhor que posso fazer é demonstrar indiferença. Se ela espera me ver assustada, não a darei esse prazer.

Eu aceito e quero ser ignorável, mas não desejo ser apagável. Descartável não é uma palavra que me desce bem. Quero ser insubstituível, e irei trabalhar para isso, para garantir a minha segurança e cumprir o pedido do meu pai.

― Não estou arrependida ― asseguro e, com cuidado, estico o meu braço para ela, num gesto para que me entregue o papel.

― Posso ver que não está. ― Balor realmente não esboça surpresa, tampouco incômodo, ao abaixar o seu braço e me dar a nota de Dother. ― Aliás, posso ver até mais do que isso.

A Forjadora do DesastreOnde histórias criam vida. Descubra agora