Capítulo 14 - Quem se ajoelha

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Dother assina o recado de caligrafia impecável e estica o braço, entregando-me para que eu avalie.

Boa noite, Sir que leva e traz a Senhorita Aisling. Venho por meio desta anotação informar que a moça está em minha companhia, e que logo regressaremos ao subsolo. A pedido dela, não demoraremos muito.

Atenciosamente,
Dother

Intercalo o olhar entre o papel amarelado e Dother, que está com as mãos juntas à frente do corpo, no aguardo. Não verbalizo a minha dúvida, mas ver apenas o seu primeiro nome na assinatura do recado me faz matutar sobre a sua posição hierárquica neste ambiente incógnito. Talvez seja de mais respeito e prestígio do que imaginei. Eu o subestimei.

— É do seu agrado? — questiona-me, em expectativa.

Confirmo com a cabeça. Não estou segura com a ideia dele, embora o próprio Dother transmita a certeza de que nada vai me acontecer. Não tem motivos para ele me fazer mal. Estou sendo paranoica. Eu sou só uma ferreira que não tem nada a ver com Dother. Vai ser vantajoso para mim conhecer a residência, só isso.

Quero perguntar se ele foi a pessoa que me contratou para esse trabalho ou se por algum acaso está brincando comigo, porém guardo tudo para mim, especialmente porque seria tolo e perigoso expor a informação que Balor me passou.

Se ele for só um idiota alheio, pode me denunciar ou chantagear. Já tenho problemas demais.

― Vamos indo. ― Dother não hesita para abrir a portinha que pode me condenar no primeiro passo em falso.

Eu piso no corredor que antes bisbilhotei por um buraco de machado na parede, no meu primeiro dia de trabalho. Sigo Dother sem nenhuma naturalidade, pois minhas pernas estão começando a sentir a ansiedade e os olhos não param quietos. Quero gravar tudo na minha mente. As paredes brancas tem uma textura áspera que eu nunca vi em nenhum outro lugar e o chão de madeira é perfeitamente envernizado, parece até um espelho.

A cada passo que dou, o luxo e requintes aumentam. A minha respiração está quase travando, com medo de esbarrarmos em Balor. Ela certamente é mais forte que Dother. Ao subirmos o primeiro lance de escadas e abrir outra porta, me deparo com uma sala muito mais espaçosa. Agora todo o ambiente parece moldado no ouro e na natureza, desde as paredes aos móveis. Há incontáveis espelhos distribuídos no cômodo e são ornamentados como as portas.

Druidas amam as flores e qualquer coisa que venha da floresta, por assim dizer. É a razão para as indústrias nojentas operarem nos condados humanos. Eles se atraem pelo bucólico, o natural, nada criado pelo homem moderno. Aqui está cheio de violetas em vasos de cerâmica. O aroma doce-amadeirado-floral da sala é agradável e quase me faz espirrar. É a primeira vez que inalo um perfume real, exceto pelo dia que Dother confundiu o meu olfato. Eu estou acostumada ao odor de fumaça, não isso.

O que recebe minha maior atenção é um piano. O instrumento é transparente como o vidro. Penso até sobre o quão frágil e ridiculamente delicado deve ser, porém não levo mais que uns segundos para perceber que é feito de diamante.

Ouço o som da minha garganta, ao engolir em seco. Foi uma hora difícil de acreditar não estar delirando.

― Ah... Tem certeza sobre isso, Dother? ― chamo a sua atenção. Estou me sentindo desconfortável. ― Não vão estranhar as minhas roupas? E isso é uma festa de druidas e...

― É com isso que você está preocupada? ― Ele ri. Até consegue me acalmar um pouco, de certa forma. ― Venha. Irei te ajudar com isso, se você faz questão.

Cada corredor e sala que passamos é um soco maior no meu estômago. Estou começando a me perguntar sobre o quão extensa é a casa de Dother, porque é ridículo e além da minha compreensão. Já posso afirmar, com certeza, que o meu contratante é um magnata, para se dizer o mínimo.

A Forjadora do DesastreOnde histórias criam vida. Descubra agora