Capítulo 31 - As gêmeas

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Hoje é um dia de garoa fina. Está um pouco frio e o céu nublado. Devo ter ficado com Balor no seu escritório por uma hora, mais ou menos. O horário do almoço chegou e, como nós não terminamos ainda de fazer o serviço, Balor sai e regressa com dois pratos de bife com milho. Ela come à sua mesa e eu fico de pé, com o prato também na sua mesa. A carne é bem temperada e tem um gosto forte, a textura é tenra e macia e o milho é salgado.

Posteriormente ao almoço, para evitar deslizes, eu saio do escritório primeiro e sigo até onde Quinn deve estar à espera para ir embora. O percurso é de uns cinco minutos, eu tenho que sair do Crann Bethadh e, passado a Praça do Tríscele, sigo pelos limites do condado.

Eu sempre soube a localização porque, há um bom tempo, era nesse paredão branco que Balor me deixava de carruagem. Aqui é logo atrás do Crann Bethadh, onde ninguém vem. É um sentimento nostálgico ouvir os sapos e grilos, a plena quietude, e a atmosfera misteriosa e serena que envolve o ambiente abandonado.

— Bridie amiga. — Ouço a voz de Quinn.

O rapaz está sentado com as pernas cruzadas embaixo de uma árvore e encostado no tronco, sem se importar que suas roupas irão se sujar mais do que já estão. Ele acena para mim, calmo e paciente.

Eu me sento ao lado dele. O breve silêncio não incomoda, afinal é mais respeitoso da minha parte permitir que Quinn aproveite os seus primeiros momentos fora da oficina, finalmente inalando o ar de sua liberdade. Não há mais nenhum assassino atrás das nossas cabeças. Temos dinheiro. Temos um futuro melhor nos esperando.

— Você parece diferente do último dia que conversamos — ele puxa assunto. — Conseguiu a sua resposta?

— Você também. — Assim como Quinn, eu aprecio o balançar das árvores com o vento fresco. — E acho que sim. Ele é uma exceção entre os druidas... Eu gosto dele. — Essas palavras são difíceis de pronunciar. Não imaginei que seria tão doloroso admitir. — Mas quero ir para casa. Uma vez o meu professor disse que na vida nós temos um segredo inconfessável, um arrependimento irreversível, um sonho inalcançável e um amor inesquecível. E eu achava que esse tempo todo faltou apenas o amor inesquecível, mas essa foi a primeira coisa que eu tive desde o começo. Tem gente me esperando lá em casa. O amor que eles têm por mim e que eu tenho por eles é inesquecível... Nada está acima deles.

Não sei se a água que escorre pelo meu rosto é realmente só a garoa. Quinn está calado, sendo um excelente ouvinte.

— Ele disse que queria me entregar a bênção de druida. — Eu paro para limpar os olhos. — Mas isso não pode ser uma bênção se significa deixar meu velho e meu irmão tampinha para trás. Nada tem sentido sem eles.

Sinto a mão de Quinn sobre o meu ombro, em forma de apoio.

— Quinze mil monas e sua família, para você, é mais valioso do que o amor de um druida? — questiona-me. Vindo de qualquer pessoa, isso seria uma insinuação de que estou sendo tonta por optar pelo pior, só que Quinn está perguntando de verdade, sem julgar a minha prioridade. — Um monte de gente escolheria de olhos fechados.

— Quinze mil é suficiente. — Balanço a cabeça, dizendo para mim mesma que realmente é suficiente. — Acha que ele vai me perdoar?

— Você deveria saber. — Quinn afasta a mão do meu ombro e a apoia sobre o próprio joelho. — As melhores pessoas são aquelas que você conhece e não precisa conversar para as entender e simpatizar, sabe? É que nem você estar deitada no seu quarto e ouve destrancarem a porta. Só pela forma como giram a chave na maçaneta você já sabe quem é. Só pelo andar já sabe como a pessoa está se sentindo, se está acelerada ou calma.

A Forjadora do DesastreOnde histórias criam vida. Descubra agora