A Forjadora do Desastre

Capítulo 21 - Cartas indecifráveis

Brancos ou vermelhos? Coço a minha cabeça com a ponta do lápis. Estou anotando tudo o que aprendi nos últimos três dias. Acho que brancos. Aponto o lápis e bufo com o grafite quebrando, então aponto de novo, até que eu possa escrever. O lápis não é frágil, eu que estou acostumada a forçar a minha mão, como se tivesse um martelo no lugar do pobre lápis.

Faz muito tempo desde a última vez que anotei alguma coisa, o suficiente para me esquecer das regras ortográficas. Os ensinamentos de Redmond estão meio distorcidos na minha mente. Devo estar errando os acentos, mas acho que conseguirei consultar as anotações no futuro.

No quarto que Muirenn e Muirne compartilham comigo há uma beliche ― onde elas dormem ― e uma cama que estava desmontada quando cheguei. Agora estou sozinha, estudando, sentada à escrivaninha que as gêmeas me cederam por não usarem, tanto que a gaveta está cheia de anotações só minhas.

A instalação onde os criados se abrigam foi apelidada de Bhaile, fica bem perto do Crann Bethadh e, agora que estou calma e racional, não tenho do que reclamar.

Para uma criada, estou estupefata com as condições impecáveis de tratamento. Eu tomo banho todos os dias na banheira coletiva que há no subsolo do Bhaile. Temos refeições duas vezes ao dia, descontando os cafés da manhã, tarde e noite. Nossos quartos são limpos ― afinal nós mesmos cuidamos do ambiente ― e não posso me esquecer dos bons horários de descanso.

Pelo o que eu entendi, Rei Dagda é um soberano que exige qualidade e esbanja perfeccionismo. Não à toa é um dos governantes mais respeitados e amados, conhecido como o Pacífico. Há mais criados para o Crann Bethadh que o necessário, pelo menos o dobro a mais, e essa é a razão para ninguém trabalhar até a exaustão ou a morte, como eu costumava na minha oficina alugada e falida. Enquanto eu durmo, outros trabalham. Enquanto eles dormem, eu acordo para o meu turno. Não é uma vida ruim, definitivamente não é.

Estou escrevendo sobre os tipos de druida. Óbvio que eu jamais teria reparado que a sociedade deles é dividida em seis grupos aos quais eu não lembro o nome de cabeça, só sei que filid é a classe mais alta de druidas, a do rei e sua família, no caso. Eles estão quase sempre de branco. Os outros grupos da pirâmide social seguem por juízes, curandeiros, poetas ou bardos e os criados por último. Cada um tem a sua cor e, no caso dos criados, é o preto e branco misturados.

Acho que os juízes são vermelhos... Não me recordo mais e o apito do relógio agrava a minha confusão.

O apito significa que está na hora de eu escovar os meus dentes e ir dormir. Espreguiço-me na cadeira e tomo um momento para respirar e me lembrar do rosto de papai e Brizo. Quero imaginá-los sorrindo. Não devo os esquecer por nenhum instante, afinal estou aqui com o propósito de os proporcionar a vida que merecem. Redmond deve tê-los informado do meu "confinamento", portanto não acho que preciso me preocupar, não agora, estou segura, ninguém chegou perto de desconfiar de mim. É fácil quando sou uma criada fazendo tudo o que uma novata faz, posso errar e me desculpar. Os druidas legítimos mal me percebem. O máximo que vejo comentarem é quanto aos meus olhos, pois dizem que é a cor mais bonita ou voluptuosa, porém que traz azar.

Dian é uma desgraça, devo mencionar. Seus horários no Crann Bethadh são semelhantes aos meus, então acabo me deparando inevitavelmente com ele todos os dias da semana, nem que seja por cinco minutos. Às vezes ele me nota, mas quase nunca fala comigo, pois está muito ocupado com Kiera Aaran, a filha do Conde Aaran, que é grande amigo do Rei Dagda.

Nas vezes que Dian decide destacar a minha presença, é nunca me chamando pelo nome Bridie, não me chama de nada, só aponta para mim e me manda fazer alguma coisa, como trazer um chá de musgo para ele. Sei que é tudo provocação. Odeio isso. Ele chama todos os outros criados pelo nome.