Vince me leva de volta para casa depois do "crepúsculo de poesias", um grande recital de poetas millenials e da geração z que, com certeza, estavam sob efeito de alguma forte substância alucinógena quando escreveram os poemas. Ainda não imagino como Vince possa gostar daquele lugar. Não que eu tenha odiado, muito pelo contrário, mais algumas visitas e eu estarei muito bem ambientado. Mas ainda não combina com o que eu conheço do starboy.
- Nos vemos amanhã no almoço. – Ele diz parando o carro na frente da minha casa.
Viemos conversando durante todo o caminho. Estava fazendo a minha avaliação dos poetas do crepúsculo. – Sim, os apelidei assim – Vince sorri todo o caminho enquanto escuta a minha crítica. É uma versão mais leve dele e que não me dá nos nervos. Sem sorrisos debochados, mentiras ou qualquer outra coisa que me faça odiá-lo.
- Sim. – Eu digo. – Obrigado por hoje, Vince, foi minimamente agradável estar com você.
- Digo o mesmo, Russell, foi melhor do que eu esperava.
- Que você não banque o idiota amanhã. – Eu digo abrindo a porta do carro.
- Que eu não banque o idiota amanhã. – Ele afirma abrindo um sorriso sincero. – Não se esqueça do nosso trato: Almoçar na mesa dos sêniors.
- Como se você me deixasse esquecer. Até amanhã, Vince. – Digo fechando a porta do carro e caminhando para dentro de casa.
- Archie? – Escuto a minha mãe gritar assim que eu fecho a porta atrás de mim.
- Sim, mãe, sou eu. – Eu a encontro na cozinha segurando uma xícara de chá.
- Você já jantou? Deixamos um pouco de macarrão para você, seu pai fez um pesto divino.
- Ótimo, eu estou mesmo com fome. – Digo me dando conta de que realmente estou com fome. Os dois cafés que tomei na Redoma de vidro enganaram o meu estômago por um tempo.
- Você pode se servir não é, querido? – Ela pergunta caminhando para fora da cozinha. – E não se esqueça de lavar a louça, seu pai e eu teremos uma grande cirurgia pela manhã, não teremos tempo para lavar louças sujas do jantar e ah! Ia me esquecendo. Seu irmão quer falar com você.
Eu acho que sei bem o que o meu irmão quer falar comigo. Com certeza ele viu a minha postagem com Vincent e agora quer saber todas as novidades. Eu não quero ter que mentir para o meu irmão, então resolvo adiar o máximo possível essa conversa. Esquento o macarrão e como vagarosamente, escovo os meus dentes e só então ligo para o meu irmão.
Coloco os fones de ouvido para que ninguém – e com ninguém quero dizer os meus pais – possa escutar a nossa conversa. Não demora muito tempo para eu ver o rosto do meu irmão na tela do meu celular.
Seu rosto está mais corado devido ao sol da Califórnia e acho que há um pouco de decepção e pré-julgamento nele. Estou pronto para essa conversa, é só dizer que tudo aconteceu depois da sua viagem.
- Fala sério, Archie! Você e o Vince? Por que não me contou antes? Sabe como eu soube? Pem precisou me mostrar as fotos em seu perfil e ainda assim eu não acreditei... para falar a verdade eu ainda não acredito. Ele não namorava a Lily? E você não era a fim do Howard?
- Alfie, foi tudo muito rápido. – Eu começo o discurso que ensaiei enquanto jantava. – Foi logo depois de você ir embora.
- Vocês nem frequentam o mesmo ambiente. – Seu rosto raivoso me dá medo. Em dezesseis anos Alfie nunca me deu uma bronca. Eu estou certo em estar com medo. – A Alma já está sabendo? É lógico que está, ela é amiga da irmã dele. Ninguém me contou!
- Então você está chateado porque ninguém te contou?
- Sim, eu teria evitado que você cometesse esse erro. Eu nem sabia que ele gostava de meninos. Mas isso não importa, ele é o mesmo Vince que eu já vi em dezenas de festas, Archie. Um fuckboy. Ainda dá tempo de você se livrar desse cara.
Eu não posso me livrar. Assinei a merda de um contrato sem valor algum, mas mais do que isso, eu dei a minha palavra. E deixar Vince na mão parece ser um pouco desleal.
- Eu gosto dele. – Minto. – Estamos nos conhecendo, está bem? Não é bem um namoro. Ele não é nada disso que você está dizendo.
- É lógico que não. Ele é um manipulador egocêntrico. É claro que você não enxerga o que eu enxergo. Eu só espero que você não precise se machucar para entender que ele é uma péssima pessoa quando o assunto é relacionamento.
Eu não fico irritado com as palavras que Alfie usa para descrever Vince. Muitas delas eu até concordo, apesar de nunca ter visto o meu irmão usa-las para descrever uma pessoa antes. Entretanto, hoje conheci uma parte de Vince que eu não conhecia, que me deixou determinado, curioso, para tentar entender o que se passa em sua cabeça, em seu mundo que não me parece nada perfeito.
Contudo, me dói não poder dizer a verdade. Ter que mentir, enganar mais uma pessoa. Meu irmão está a algumas boas horas de Seattle. Eu poderia contar a verdade. Mas ao invés de ficar irritado com Vince como ele está agora, estaria irritado comigo por aceitar participar desse teatro ridículo. Não quero ver o desapontamento em seus olhos, que com certeza será maior do que o desapontamento e a frustração que eu vejo agora.
Se eu preciso mentir, que seja uma grande mentira e que seja convincente. Eu preciso mentir mais e defender Vince.
- Olha, eu não sei o que você viu, mas ele não está se comportando assim, ok? Não precisa se preocupar, não é um namoro, eu sou bem grandinho, sei me cuidar.
- Eu sou irmão mais velho, eu sei que você quer tomar suas próprias decisões, mas eu não consigo deixar de cuidar de você. Consegue entender isso, Archie? Eu não posso deixar você continuar por um caminho que vai te machucar.
- Você não pode ter certeza disso, Alfie. Eu acho melhor desligar, preciso dormir cedo. Até depois, Alf.
Não espero por sua resposta e encerro a ligação. Fico por um bom tempo deitado na cama sem verdadeiramente pensar em alguma coisa. Estou apenas deitado.
Se havia antes a remota possibilidade de eu desistir do meu relacionamento falso com Vince, agora não há mais, não depois de tudo. Não há como voltar atrás. Agora devo seguir até o fim.