Epílogo: iremos voltar

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A neve caía preguiçosamente lá fora. As luzes de natal que Alice e eu colocamos formavam arabescos nas árvores e iluminavam a noite de uma maneira acolhedora. A luz amarela se misturava com a vermelha e às duas se misturavam com a verde. 

— Qual você acha que vai ficar melhor? — Jane surgiu repentinamente em minha frente.

Dei um salto no banco do balcão. 

— Jane, querida, só porque você aprendeu a fazer transfiguração não significa que precisa fazê-la o tempo inteiro. — Falei levando inconscientemente minha mão até o coração petrificado em meu peito. 

Ela inclinou a cabeça colocando seu cabelo atrás da orelha e sorriu piscando inocentemente. 

Myra havia ensinado-nos muitas coisas no último mês, nossa facilidade em manipular magia ajudava, é claro. Vovó sempre dizia que não deveria ser possível bruxos que nunca tiveram contato com feitiços e magia pura conseguirem apresentar a facilidade que apresentávamos. Bem, ela também acrescentava sermos seus netos por uma razão. Agora, Jane não se dava mais o trabalho de andar de um lugar para o outro. 

— Você é um chato, Alec. — Disse ela com a voz entediada. 

— Você me diz isso há mais de um milênio, Jay. — Revirei os olhos. — Não é como se eu não tivesse notado. 

Ela riu. 

Peguei a luva de proteção contra calor, levantei do balcão e caminhei até o forno para verificar os biscoitinhos que havia colocado há uma hora exata para assar. Eles eram a única coisa que faltavam na mesa de jantar. Os retirei do forno sentindo o calor em minhas mãos. Quando coloquei os biscoitos sobre o mármore do balcão deslizei as luvas de proteção para fora das minhas mãos e as joguei na superfície fria de mármore.

— Esse é o melhor natal que temos em décadas — minha irmã sussurrou. Seu olhar longe indicava que ela estava se lembrando do último natal realmente bom que tivemos com Íris e Nix. Desde lá, não tivemos um único natal juntos. Até agora. 

— É, é sim. — Concordei, e isso foi tudo que me permiti dizer. Não queria falar sobre essa época, tinha a plena certeza que Jane também não. 

— Bem, não quero atrapalhar você e seus… Hã... biscoitinhos — ela iniciou animada novamente. — Então, qual você acha que fica melhor? Esse — Jane gesticulou com a mão e seu vestido com alças finas que se desenhava perfeitamente em seu corpo mudou de cor para o branco —, ou esse? — Ela gesticulou novamente e a cor do vestido mudou de branco para amarelo. 

Jane deu um pulo para trás quando constatou a cor do vestido em si mesma. Antes que ela entrasse em pânico fiz o mesmo gesto que ela efetuara e substituí não somente a cor como também o vestido. 

— Acredito que assim está perfeito, Líriozinho. — Eu a coloquei em um longo vestido verde com uma fenda em sua perna direita. 

Ela olhou maravilhada para o vestido. A gratidão gritando em seus olhos. 

— Obrigada, Alec — Sussurrou com a voz distante. — Eu adorei, como sempre. — Jane sorriu apoiando suas mãos no mármore do balcão. 

— A suas ordens, senhorita. Como sempre — acompanhei seu sorriso. 

— obrigada — ela falou novamente, e desapareceu da mesma forma como havia aparecido. 

Eu sabia a quê esse obrigada se referia. Ela odiava o amarelo. Odiava mesmo. Isso a fazia lembrar de fogo. Mesmo após séculos, essa lembrança ainda nos assombrava de muitas formas. Balancei a cabeça. Era natal. Jane não queria falar sobre isso, eu também não. 

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