Capítulo 16

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REENCONTRO

ANNE

Hoje completa nove meses que fugi novamente, estou cansada de tantas fugas, não sei qual foi o meu crime pra precisar viver fugindo. Segui todo o plano da Zélia e hoje moro em uma cidade linda, no interior de Minas Gerais, o Caio foi transferido pra cá pra trabalhar em um estudo sobre a recuperação do Rio Doce após um grande desastre ambiental. Caio é o filho da Zélia, ele é casado com a Daniela e eles são pais da Esther que tem só três aninhos e é uma fofa.
Minha vida aqui é bem pacata, logo que cheguei me matriculei em uma escola e estou terminando meu ensino médio, estudo à noite e durante o dia ajudo Zélia a cuidar da Esther enquanto Caio e Daniela trabalham. Não fiz amigos e só saio de casa pra ir à escola, estou morrendo de saudade de todos que deixei pra trás, mas não poderia colocar mais ninguém em risco.
Sinto tanta falta do Ulisses, com aquele jeito protetor, aquele olhar que me dava a certeza de que perto dele nada poderia me atingir, lembro todos os dias daquele beijo e muitas vezes me pergunto se ele esqueceu de mim. Como eu queria encontrar novamente meu cavaleiro de armadura dourada.
_ Está no mundo da lua, minha menina? - Zélia pergunta me tirando dos meus pensamentos.
_ Oi, desculpa! Só estava distraída- respondo tentando esconder a lágrima que teima em escorrer.
_ Acho que o que você chama de distração, eu conheço como saudade - diz com sorriso pequeno.
_ Ôh, mãezinha! Por que eu não posso ter uma vida normal, como qualquer garota da minha idade? - pergunto sem conter as lágrimas.
_ Minha filha, eu sei que é muito triste, mas tenho certeza que um dia tudo isso vai se resolver - diz com voz terna, enquanto me envolve em um abraço. - mas por agora, deixe a tristeza de lado e vai na padaria que vai sair pão fresquinho, já vou passar o café.

Enxugo minhas lágrimas, lavo o meu rosto e vou buscar o pão que Zélia pediu. Quando estou voltando pra casa, vejo um carro parado na porta, esse carro é familiar, mas não acredito que seja quem estou pensando, aperto o passo e entro em casa pelos fundos, deixo o pão na mesa da cozinha e quando estou chegando na sala, ouço uma voz que jamais esqueceria, fico paralizada no corredor.
_ Zélia, você tem noção do quanto eu procurei por vocês? - ouço Ulisses perguntar com a voz alterada.
_ Você não entende, Ulisses? Eu precisava proteger minha família, proteger a Anne e proteger até mesmo você! - Zélia responde também alterada.
_ Onde ela está? - ele pergunta baixo.
_ Está segura, é só isso que você precisa saber.
_ Onde ela está? Eu preciso vê-la!
_ Eu não vou dizer, você só precisa saber que ela está segura.
_ Vou perguntar pela última vez, onde ela está?- ele pergunta sem paciência.
_ Você não foi capaz de me encontrar, então preocure você mesmo. - Zélia diz em tom de desafio.
_ Estou aqui, Ulisses! - digo chegando por trás dele. - Não quero ver vocês brigando por minha causa.
Ulisses se vira devagar, me olha por alguns segundos e vejo seus olhos começarem a marejar, sinto minha garganta arder, meus olhos queimam e assim como ele, não consigo segurar as lágrimas.
_ Minha princesa na torre! - ele diz e me abraça tão forte que parece que vou quebrar.
_ Meu cavaleiro da armadura dourada, como senti sua falta! - o abraço com toda minha força.
Ficamos um longo tempo abraçados, não queria que esse abraço terminasse nunca, aos poucos fomos nos desfazendo do abraço, nossos olhos se encontraram e era uma sensação tão boa me ver refletida naqueles olhos, passei a mão pelo seu rosto, enxugando uma lágrima teimosa que descia mesmo com ele sorrindo, ele fez o mesmo no meu rosto, seus olhos pousaram em minha boca e instantaneamente eu senti minha bochecha esquentar, mas antes que eu dissesse qualquer coisa ele me beijou. Foi um beijo urgente, um beijo que deixava claro toda a saudade que ele sentiu, eu retribuí o beijo com a mesma urgência, não queria que aquele momento acabasse nunca mais.
Zélia pigarreou ao nosso lado, nos tirando daquele momento que eu queria que durasse pra sempre, paramos o beijo com um selinho, trocamos um sorriso tímido e finalmente olhamos pra ela.
_ Bom, agora que ele já sabe de tudo, o quê vamos fazer? - perguntou Zélia se dando por vencida.
_ Vamos voltar pra São Paulo e desmascarar a Suzanna e o Joaquim? - eu disse insegura.
_ Vamos voltar, mas precisamos de um plano que envolva o mínimo de pessoas possível - ponderou Ulisses.
_ Vocês só podem estar loucos! - Zélia se exaltou.
_ Zélia, ninguém sabe que encontrei vocês - explicou Ulisses - Quando encontramos seu telefone e descobrimos tudo, Fernando fez uma varredura em todos os telefones dos envolvidos, foi quando descobri que havia sido plantado um rastreador no meu telefone também, por isso o delegado me proibiu de tirar férias enquanto não investigassem como aquele rastreador foi parar ali, fui afastado do caso e proibido de participar de qualquer investigação que estivesse relacionada ao caso.
Ulisses então explicou nos mínimos detalhes como ele chegou até aqui, conversamos por bastante tempo, mas Ulisses achou melhor que Caio e Daniela não soubessem que ele estava na cidade, então ele foi embora antes que o casal chegasse do trabalho.
Depois que ele saiu, fui pro meu quarto tentar pensar melhor a respeito de tudo o que aconteceu. Faltava pouco pra eu finalizar o ensino médio, me lembrei que também faltava pouco pro meu aniversário que coincide com o aniversário da empresa do meu pai, acho que já tenho um plano.
Decido dormir, amanhã vou ter que convencer dois cabeças-duras a seguir o meu plano, e sei que não vai ser nada fácil.

Acordei com o som irritante do despertador, tive uma noite péssima com muitos sonhos e lembranças de tudo o que passei até hoje, levantei, tomei um banho gelado pra ver se afastava essas lembranças da minha mente. Depois do banho, visto uma roupa leve e vou pra cozinha ajudar Zélia a preparar o café.
_ Bom dia, mãezinha!- falo lhe dando um beijo na testa.
_ Bom dia, minha menina! - responde baixo.
_ Já vi que não foi só eu que tive uma noite difícil- falo passando por ela e indo até a mesa.
_ Quase não dormi pensando em tudo o que aconteceu- diz de cabeça baixa - Sabe, Anne, eu sempre vou querer o que é melhor pra você e eu sei que mesmo com todo amor que eu tenho por você, eu não posso impedir você de poder ter uma vida melhor e mais segura ao lado da sua família de sangue. Sei que essa sua cabecinha já está tentando encontrar um jeito de voltar, e quero que saiba o vou te apoiar no que você decidir.
_ Você não sabe como seu apoio é importante pra mim, você me acolheu no pior momento da minha vida, me deu um lar, uma família, amigos e mais do que tudo se sacrificou por mim - digo me aproximando dela - Eu sei que teme pela minha vida, mas eu preciso voltar, eu não posso fugir a minha vida inteira como se eu fosse uma criminosa.
Nos abraçamos e sinto que é hora de tomar as rédeas da minha vida.

A Herdeira Perdida - Concluído Onde histórias criam vida. Descubra agora