Alguém se lembra da família Santos?

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Se a minha vida virasse uma série ou uma fic, esse seria o momento perfeito da virada em que eu corro atrás da Ana Cristina e me declaro para ela e sei lá, nos beijamos, as coisas se desenrolam milagrosamente e tem o final feliz que passou a trama até ali pra ficarem juntos. Infelizmente não é o que acontece aqui, e eu queria que fosse fácil assim, e me questiono porque não é. Nas histórias sempre parece tão fácil, e na realidade é só conflito interno e confusão mental.

Vou direto pra casa. Sério, isso me cansou o suficiente pro resto da noite. Se eu corresse em sua direção, primeiro que eu não saberia o que dizer direito, segundo que eu conheço a Cris e sei que ela não ia responder nada, e terceiro, mesmo se eu respondesse, o que eu faria? Sério, seja lá quem estivesse vendo a situação em que estou falaria "ah não, Vitória, larga a Sofia e fica com a Cris", e nem é assim que as coisas funcionam.

Porque eu gosto de ficar com a Sofia, mesmo ela já tendo deixado claro que não espera nada vindo de nós. Não sei se ainda estou vislumbrada por seu estilo e atitudes que me fazem suspirar alto, ou se a sua companhia se torna prazerosa e gosto de passar várias horas ao seu lado, mas eu gosto de estar ali. É divertido.

Alguém me julgaria por tentar seguir em frente? Ana Cristina nunca deixou claro ter qualquer sentimento por mim além da amizade, e eu literalmente fiquei de vestes íntimas na sua frente esperando uma aceitação que nunca chegou – a propósito, me chamou de promíscua e ainda me fez pedir desculpas a ela por isso – então, aparece uma mulher linda e legal que me faz pensar nela, dou o primeiro passo e então quando as coisas estabilizam entre mim, Cris dá um ataque, brigamos e depois ela começa a demonstrar pitadas de sentimentos? Aí eu largo tudo para algo totalmente incerto?

"Calada vagabunda, você vai ficar com a pessoa que sobrar porque você não respeita ninguém além de si mesmo", ah cala a boca, vai se foder, me deixa em paz, já me culpo o suficiente por existir às vezes, imagine por estar confusa com meus sentimentos.

E pior que eu me sinto idiota de verdade, tipo, estúpida o suficiente pra duvidar se realmente tenho um cérebro ou uma pedra no lugar envolto de um monte de água para dar peso, e o motivo é que ela tinha razão: a resposta estava literalmente na minha cara.

Não que ela fale de sua vida abertamente, mas nos conhecemos bem o suficiente para ela ter falado várias coisas, e praticamente todas elas me deixaram triste. Até mesmo as mães delas falam sutilmente sobre as atribulações passadas, e Ana Cristina, em um dos seus dias ruins me vendo falar de garotas e como chegar em alguém é difícil, me esnobou falando que eu reclamava de coisas indevidas, e que eu devia agradecer por falar disso abertamente para os outros sem ser julgada. Claro, fiquei com remorso e me calei, depois fui reclamar disso e dela no Twitter.

É óbvio que se ela se atraísse por meninas as pessoas cairiam matando em cima das mães dela, e quem vê por fora não entende, e me sinto pior justamente por eu a conhecer e saber que a família dela é mais importante do que qualquer coisa. Quando se vê a dinâmica familiar, isso fica muito claro mesmo ela sendo tão calada, porque ela se expressa muito em gestos.

É quando ela limpa os pincéis de uma, ou organiza a pilha de trabalhos da outra, leva um café ou um chá, ou fica sentada só conversando. Ou quando leva o violão pra casa dos avós para tocar alguma música para eles porque eles adoram vê-la tocar, ou quando volta de viagem da casa do avô e mostra as fotos de lá. Uma dinâmica que causaria inveja a muita gente, mas no âmbito de sua casa, só se unindo ainda mais para aguentar a pressão vindo de fora.

Ana Cristina sabe – e eu também sei – que pressão demais deixa a mãe dela mal, e Cris vê-la assim é de partir meu coração, então é óbvio que ela vai evitar isso, e o pior? Amanda sabe disso, ela deixou claro ali naquela conversa, basicamente falando "minha filha anda muito na dela, Vic, acho que ela está com questões de sexualidade e não quer nos incomodar não por falta de diálogo, mas porque não se sente à vontade, você fala que gosta dela e com isso concluo que é algo envolvendo você, então se gostar dela mesmo, apoiamos o relacionamento de vocês assim como se fosse com qualquer pessoa de qualquer gênero."

Minha vida (não) tão chataOnde histórias criam vida. Descubra agora