15 - AMAPOLA FISCHER

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Acordo com uma ligeira dor de cabeça. Excesso de champagne. Também foram tantas emoções em um dia que só bebendo um pouco para digerir tudo. A história do Guto é muito triste e muito intensa. Nunca imaginei que por trás desse homem existisse algo tão sombrio. Agora consigo entender algumas atitudes que ele teve desde que o conheci. Sou muito semelhante à mulher da sua história. Filhinha de papai rico e poderoso, que pensa mandar nos atos da filha. Acho que agora ele não pensa mais assim porque até confiou em mim, contando sua história.

Olho o relógio e preciso sair da cama. Tomo um banho rápido e peço algo para comer no quarto. Do aeroporto vou direto para XFI. Tenho que saber como está nosso bebezinho, Erus.

Quando chego ao hall, encontro alguém com mais saudades do que eu do trabalho.

— Já de uniforme, Guto?

— Os meninos me avisaram que eu não teria o dia de folga. A chefa costuma ser rigorosa com o horário.

— Adoro essa submissão e o medo dos meus colaboradores. Isso faz o meu dia melhorar cem por cento. — Ele me olha daquele jeito que me faz querer ser a submissa. Nem precisa articular uma palavra. Eu entendo o que acontece entre nós.

— Porra, Guto. Para de olhar assim.

— Você é a culpada, chefa. Tem que ter um cheiro tão bom. Mexe com a minha libido.

— Não vou trocar de perfume para te agradar, piloto. Controle sua excitação.

— Não vou parar de te olhar desse jeito. Controle os seus desejos. — Foi dessa maneira que o dia fluiu bem demais. A família da oficina me faz muito bem.

O carro novo está quase pronto para ganhar os testes de rua. Mais alguns ajustes e estará apto a transitar por aí. Na quarta-feira, em frente ao meu computador, tenho uma ideia maluca. Subo até a sala de papai para pedir a sua opinião.

— A que devo a honra da visita da mulher mais linda do mundo? — Ganho um abraço de urso dele.

— Falando assim, parece que sou uma filha desnaturada, pai. Você me vê todos os dias, vai.

— É verdade, querida. Sou um pai abençoado mesmo, não tenho do que reclamar, quer dizer, tenho sim que reclamar que você anda mais ainda trancada nessa empresa e atrás de corridas arriscadas. Por onde anda Enrico?

— Bom, pai. Enrico e eu demos um tempo para pensar no nosso noivado. Andávamos com o relacionamento um pouco frio, estagnado.

— Sabe, Amapola. Eu percebi que você não andava muito feliz. Acho que ele fica demais em Nova Iorque e te deixa aqui sozinha. Mas ele é um bom moço, filha. Quem sabe vocês se acertam.

— Estou sentindo saudades dele, pai. Isso diz algo, não é?

— Claro que sim, filha. Conversem e se acertem logo. Eu quero um neto, você sabe.

— Eu e Curitiba inteira. Contratou o Guto para me fazer trabalhar menos, não é mesmo? — Ele desconversa.

— O que te trouxe aqui?

— Quero montar mais um carro de corrida. — Meu pai fica surpreso.

— Você já tem o seu, Amapola. Qual é a sua ideia?

— Quero ter um companheiro de equipe. Sinto-me sozinha nos boxes, pai. Já que você contratou o Guto, ele pode ser o testador do carro novo.

— Mas criar o design demora um bom tempo, querida.

— Pensei em pular essa etapa e utilizar um design do Frederic Hans. Vou até Nova Iorque, vejo o catálogo de ideias dele e monto no chassi daqui. Só preciso mesmo do seu aval e da sua grana, é claro. Pense no que isso vai render aos seus cofres quando estiver acelerando.

— Sabe que isso não me interessa, Amapola. Ganhar dinheiro não é tudo nessa vida. O seu amor vale mais. Sei que tem mais alguma coisa nessa história toda e a senhorita não quer me contar, mas não tem problema. Confio no seu julgamento. Tem o aval e a grana que precisar.

— Vou aproveitar a ida até Nova Iorque e visitar Enrico. Sair para um passeio, um jantar, tentar me entender com ele.

— Obedeça ao seu coração, filha, e tudo dará certo. Torço pela sua felicidade.

— Obrigada, pai. Você é o cara.

— Você me faz ser assim. Parabéns pela vitória. Foi linda a sua corrida.

— Valeu, senhor Fischer. Te amo. — Desço para minha sala super empolgada. Encontro Guto no corredor e me jogo em seus braços. Ele me gira dando risadas e depois me coloca no chão.

— Está maluca?

— Não tinha percebido ainda? Fugi do manicômio.

— Estou desconfiado disso.

— É que estou feliz, só isso. Cuida do meu bebê que tenho algumas coisas importantes para resolver.

— Sim, chefa. Mais algum pedido?

— Eu quero que você mantenha a mente aberta, Speranzi. — Entro na minha sala antes que ele me questione sobre o que eu quis dizer com isso.

A primeira coisa que faço é ligar e marcar um horário com o Frederic. Ele é um homem muito ocupado e fico contente por ter conseguido agendar um horário para terça-feira da próxima semana. Pego o celular e ligo para Enrico. Ele atende.

Oi, Amapola.

— Oi, Enrico.

Que bom ouvir sua voz, querida.

— Também estou com saudades. Está no Brasil?

Na verdade, estou no aeroporto. Embarco em uma hora para Nova Iorque. Fico lá uma semana.

— Ahh... que pena. Queria marcar um jantar, só nós dois.

Faz assim, Ama. Na quinta-feira meu voo será de manhã. Marcamos de nos encontrarmos à noite para jantar. O que acha? — Fico decepcionada, mas ele estar em Nova Iorque é um aviso de que preciso mesmo ver o que está acontecendo por lá.

Okay. Ficamos assim. Jantar na quinta-feira.

Foi bom ouvir a sua voz, Amapola.

— Também gostei de conversar com você, Enrico. — Desligo o telefone sentindo um aperto estranho no peito. Parece mesmo um aviso.

Corro para providenciar o que é necessário para a viagem. Deixo para pensar em como abordar Guto sem que ele desconfie dos meus planos.

PAIXÃO NO RETROVISOROnde histórias criam vida. Descubra agora