A semana começa puxada. Amapola não estará na XFI a partir de quinta-feira por conta de mais uma rodada da corrida. Ela quer o Erus pronto para rodar na rua já na semana que vem e ainda faltam uns pequenos ajustes nele.
Um pouco antes do almoço o dia começa a azedar. Vejo o seu ex-noivo, o tal do Enrico caminhar em direção à sala dela. Será que esse grandessíssimo filho da puta quer reconquistá-la?
Porra, ele magoou a Amapola, mas foi o seu noivo por alguns anos, ela ainda deve ter sentimentos por ele. Meu desconforto aumenta quando ela sai junto com ele e parecem bem felizes.
— O que está acontecendo, piloto? Parece um bicho enjaulado, só falta urrar. — Descubro que o pessoal da oficina está prestando atenção em mim.
— Não é nada, merda. Não é nada... — Vou para o refeitório, almoço e esfrio a cabeça no meu canto preferido. Ali, entro em sintonia com a natureza e as curvas da pista.
Estou testando mais uma vez o Erus, quando a vejo vestida com seu macacão. Vai correr, a beldade. Acelero em sua direção e freio forte para parar. Ela nem se abala.
— Algum problema, piloto? — Ela tem um semblante tranquilo, está sorrindo para mim.
— Apenas testando, chefa. Está feliz? — Ela pensa.
— É, posso dizer que estou de bem com a vida. Dá a chave que eu mesmo vou constatar se meu humor vai continuar assim. — Pego em sua mão e entrego a chave.
— Vai se surpreender.
— É o que espero, sinceramente. — Ela toma seu lugar de líder e não canso de apreciar suas derrapagens. Seria uma honra pertencer a sua escuderia. É a primeira vez que esse pensamento toma forma na minha mente. Eu e ela na pole position, ou ela e eu, tanto faz.
— Só posso estar maluco. — Quando ela estaciona, a oficina está toda na expectativa das suas considerações. Ela sabe. Vive isso há anos. Anda em volta do carro, tirando lentamente as luvas, capacete e touca, com seu capacho, Alex, segurando seus pertences. Abre o zíper do macacão e arranca os braços de dentro, ficando apenas com a camiseta branca. Os rapazes eu não sei, mas isso me excita demais, me deixa arrepiado.
— É... meninos. — Joga a cabeleira de lado. — Parece que temos um campeão. Ele está pronto para os testes de rua. — A galera vibra e comemora. Eu queria mesmo era enroscá-la na minha cintura. Ela pede silêncio.
— Como todo fim de ciclo, teremos sete merecidos dias de descanso, porque logo mais o Black car sairá do forno. O novo carro de corrida terá duas mentes brilhantes no comando e vocês já sabem como nosso mais novo piloto de testes é cabeça-dura. — Ela me surpreende, chamando a atenção para mim.
— Como se fosse fácil agradá-la, chefa.
— Agora é a hora que você fica calado, Speranzi. — Todos se divertem com a brincadeira. Nunca trabalhei em um ambiente tão agradável e tão equiparado. Aqui todos têm os mesmos direitos, mesmo que cada um tenha sua função e ela seja simples.
Na terça-feira, Amapola recebe outra visita. Adams Hills, um piloto bem cotado na atualidade. Meu sensor liga. Ela está em busca de alguém para pilotar ao seu lado na próxima temporada.
— Oi, pessoal. Acho que Adams dispensa apresentações. Nós vamos discutir uns assuntos, vocês podem arrumar meu carro que ele vai dar umas voltas depois. — Todo mundo se mobiliza, enquanto eu fico ali, só olhando. Ela percebe. Ele também.
— Ora, ora, Guto Speranzi no time. — Ele estica a mão para mim. Eu aperto forte demais, acredito.
— Tudo bem, Hills?
— Você não é fraca não, Ama. Um campeão como piloto de testes.
— Sabe que ao meu lado, só os melhores. Vamos olhar o Black?
— Vim para isso e também para pilotar seu queridinho, que guarda na meia. — Olha para mim. — Acho que vamos nos ver mais vezes, Speranzi. — Concordo com a cabeça. Vai sonhando, Hills, vai sonhando!
Ela tirou a semana para me provocar. O cara pilota o carro dela e depois ela pilota junto com ele. Na sequência saem para almoçar juntinhos, de braços dados. Para ajudar, Sander fala algo ao vê-los saindo juntos.
— Tem um clima de romance no ar. A chefa merece ser feliz, não acha? — Devo ter rosnado para ele, porque faz uma cara de assustado e sai correndo de perto. Sei que ela está fazendo jogo duro. Descobriu meu ponto fraco. Quando volta do almoço interminável, manda me chamar na sua sala.
— Precisa de algo, chefa? — Ela está séria o que me deixa com o pé atrás.
— Quero saber se você vai me acompanhar na corrida dessa semana? — Assim, bem direta.
— Se eu não for atrapalhar seus planos, gostaria de ir.
— Meus planos nesses dias é a pista, o carro e minha conexão com eles. Confesso que gostei de te ter por perto. O voo é comercial. Envio por e-mail os horários. — Ficamos ali, olho no olho até que ela abre seu notebook e me dispensa com a mão.
Por que tenho a sensação de que sua provocação não acabou ainda?
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PAIXÃO NO RETROVISOR
RomanceNunca imaginei que eu, Augusto Speranzi, bicampeão de Fórmula 3, apreciaria ser comandado por uma mulher no meu novo emprego de piloto de testes. Depois de passar três anos sendo pisoteado por uma, as mulheres passaram a ser apenas companhia de uma...