31 - AMAPOLA FISCHER

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Depois do último hotel, onde agimos como um casal e não como um funcionário e sua patroa, passear em Florianópolis e viajar até Porto Alegre aconteceu na maior tranquilidade. Não o coloquei em riscos e nem fui tentada a me arriscar. Cada um respeitou o seu espaço e tudo fluiu como tinha que ser. Uma viagem profissional

Ele passou um dia com a família e fiquei chateada por não me incluir nessa visita. Paciência. Enquanto o carro ficou na concessionária da marca para revisão, visitei um parque e um shopping. Não gostei de sair sozinha e me admirei por estar me sentindo assim. Nunca liguei para a solidão. Também, desde que namorava o Enrico, não saio sozinha.

Enrico...

Parece tão distante o fim do nosso noivado, da maneira que foi. Não penso nele desde a assinatura da venda do apartamento. Isso só prova que eu não estava mesmo conectada nesse relacionamento e ele demorou para acabar. Pelo menos esse ciclo se encerrou completamente.

Guto fica tenso quando chegamos em Gramado e não entendo a mudança de humor, se tudo está bem, pelo menos até agora. Vou para meu quarto e tomo um banho, me troco e vou ao encontro que o meu pai inventou. A noite está fria, caminho até a Rua Coberta apreciando a beleza da cidade. Antônio me aguarda na porta do restaurante.

É um homem muito bem-vestido e seu olhar malicioso me deixa incomodada. É cavalheiro, puxa a cadeira, pergunta sobre a escolha do vinho e inicialmente o assunto gira em torno da XFI e a sua empresa. Assim que o vinho começa a fazer efeito, que na minha opinião foi consumido em excesso para um jantar de negócios, ele começa a perguntar da minha vida pessoal. Tento de uma maneira educada mostrar que não tenho intenção de conversar sobre mim.

— Eu não estou te entendendo, Amapola. Seu pai deixou bem claro para mim que você está totalmente disponível e carente. Que está triste porque saiu de um noivado longo e precisa de atenção. Vai ficar fazendo cu doce? — Perco o resto de paciência que existe em mim.

— Escuta aqui, mimadinho de uma figa, estou sim disponível, e também estou chateada com o fim de uma relação longa, mas não, não estou interessada em um idiota e insensível igual a você. Homens da sua estirpe tem aos montes por aí. Cresça um pouco, faça uma escola de como lidar com as mulheres, porque você vai acabar sozinho com seu discurso machista. — Levanto-me da mesa abruptamente. — O cu é meu e você nunca saberá se ele é doce. Vá para o inferno. — Saio do restaurante e quase corro de volta para o hotel. Tenho ódio dessa mania absurda do senhor Robert querer manipular a minha vida, achando que preciso de um homem ao meu lado para me orientar. Foi assim a vida inteira.

Entro no hotel e subo para meu quarto. Ao passar em frente à porta do quarto do Guto, tomo uma decisão.

Bato nela.

Ele abre.

Seu olhar passa de surpreso a voraz, e me analisa meticulosamente.

— Não vou te dar apenas um orgasmo hoje, Amapola.

— Hoje eu não me contentaria apenas com um, Speranzi. — Ele me coloca para dentro e fecha a porta. Toca a minha face suavemente como se estivesse decorando meus traços, igualzinho faz com o Black.

— Conversaremos depois. Agora quero amar você. — O que ele me proporciona nos momentos seguintes, eu nunca vivi com ninguém. Um Guto novo aflora todos os meus sentidos e faz literalmente a terra tremer. No toque das mãos, no carinho da língua, no gosto da boca ao encontro da minha. Tudo é intenso com ele, o que é simples na vida com ele ganha requinte. Quando gozo mais uma vez e ele vem junto comigo, não quero que o momento acabe. Não o deixo sair de cima de mim. Abarco os braços nas suas costas e prendo-o forte junto ao meu corpo.

— Vai me sufocar, mocinha.

— Preciso de você perto de mim.

— Estou dentro de você, Ama. Mais perto impossível. É que se eu continuar assim, usamos preservativo à toa. — Afrouxo um pouco para ele se organizar. Assim que faz isso, me coloca em seus braços.

— Quer conversar agora?

— Jantei com um cara imbecil, que falou um monte de besteiras para mim.

— Besteiras? O que foi que ele falou? Não era um jantar de negócios?

— Coisa de Robert Fischer, querendo que eu arrume outro candidato urgente. O cara veio disposto a me comer e quando viu que não ia rolar me chamou de cu doce.

— Porra, Amapola, o que você fez?

— Gritei para o restaurante inteiro ouvir que ele nunca descobrirá se meu cu é doce. Fiquei até com vergonha do que fiz. — Ele ri gostoso.

— Ama, eu sei que seu cu é doce. Agora quero descobrir se ele é apertado.

— Vocês homens têm um quê de loucura para arrombar um.

— É um fetiche, Ama. Dos maiores fetiches de um homem. É porque é apertado, é proibido, dá tesão. Abrir a carne, ver aquele botão e saber que com jeitinho cabe um caralho grosso e enorme dentro.

— Como você consegue toda essa energia? Minhas pernas estão bambas ainda e você roçando esse pau duro na minha bunda.

— Não vou mentir, Amapola. Vira para mim. — Eu fico de frente para ele. Ele toca meus mamilos e imediatamente eles eriçam.

— Faz algum tempo que uma mulher não provoca essas reações no meu corpo a todo momento. Eu não sei explicar o que está acontecendo entre nós, sei que é forte. — Suspiro alto.

— Deixe-me ver se entendi, você está me dizendo que sente algo especial por mim e que desde a sua ex-mulher você não sente nada parecido? É isso?

— Sim, você entendeu perfeitamente. Existe algo rolando entre nós além de atração sexual.

— Nossa... acho que ganhei a noite. Nunca pensei que fosse ouvir isso da sua boca. Estou chocada.

— Não exagere, Ama. Eu ainda tenho questões dentro de mim para resolver, mas acho que isso pode ser um começo, essa viagem nos aproximou. Eu conheci um pouco mais de você e expus um pouco mais de mim. Não é um relacionamento, é apenas uma chance de talvez chegarmos a um.

— Eu entendi as entrelinhas. Continuaremos fodendo de vez em quando, brigando feito gato e rato, mantendo a relação de chefe e empregado para os outros, enquanto você descobre o que sente de verdade por mim. Sem se arriscar. Bem cômodo para você.

— Esse é o seu problema, Amapola. Tem urgência nas coisas. Sai atropelando tudo na sua frente quando as coisas não são à sua maneira.

— Você não disse isso...

— Sim, eu disse exatamente isso. Eu sempre disse, lá no começo, somente sexo não funciona com você. Precisa ser completo: romance, flores e beijo na boca. Ahh... esqueci de falar que também tem que ter o eu te amo e viveremos felizes para sempre. Por isso seu lance com o Enrico miou. A vida não é um conto de fadas, Amapola. — Nessa hora é que percebo que já estou vestida e ele também.

— É pecado querer isso para mim? Você não buscou isso quando casou com a Nataly? Não buscou amor, segurança, cumplicidade, sexo intenso. Eu também quero isso, Guto. Eu quero ser feliz e me sentir completa. — Recolho todas as minhas coisas e as amontoo nas mãos. — Sabe do que mais? Você é incapaz de amar, sente algo por mim, mas vai passar a vida inteira sem entender o que é ou sem verbalizar o que é. O que eu senti nessa cama com você hoje não foi sexo, foi algo mágico, muito maior que apenas uma união de corpos. Você sabe disso, mas vai ficar se enganando com medo de que eu seja igual a ela. — Abro a porta do quarto e olho para ele chocado com as minhas palavras. — Não existe uma pessoa igual a outra no mundo. No fim, você só foi mais prazeroso que o imbecil do jantar. — Seguir os instintos nem sempre é uma boa saída.

Entro no meu quarto decidida. Tomo um banho para tirar o cheiro dele da minha pele, abro o notebook e disparo alguns e-mails.

Arrumo minhas malas e acabo de vez com essa tentativa frustrada de me fazer enxergar. Escrevo uma carta bem impessoal e totalmente profissional, desço, faço o checkout, entrego o envelope com as chaves e as informações do carro, além do bilhete para a recepcionista entregar a ele. Peço um táxi e ele me leva até o aeroporto de Porto Alegre. Espero por cinco horas o primeiro voo.

Fugi e não me arrependo.

PAIXÃO NO RETROVISOROnde histórias criam vida. Descubra agora