6 - AMAPOLA FISCHER

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O que ele provoca em mim eu ainda não sei. Não lembro de Enrico ter me causado tamanho desejo. Nem no começo do namoro. Meu corpo respondeu automaticamente a sua insinuação de me fazer gozar. Inundou minha calcinha. Olhei sua língua enquanto falava e imaginei-a me lambendo. Sento no banco e seguro a cabeça apoiada nos joelhos.

Acho que o meu noivado, que já era sofrível, foi para o espaço. Já tem algum tempo que não temos aquele encantamento. Faz um bom tempo que Enrico não provoca essa umidade em mim. Guto conseguiu sem nem chegar perto. Só com o seu olhar e suas palavras maliciosas.

Ele tem razão. Odeio admitir, mas eu descontei minhas frustrações na galera.

Eu não posso fazer isso, que droga!

Se eu me desculpar, ele vai achar que tem poder sobre mim. Se eu não me desculpar, todos vão continuar me vendo como a mulher que não sabe perder. Visto o macacão, prendo os cabelos em um coque e escolho testar o carro primeiro e depois me desculpar. Assim não fica tão evidente que ele me fez voltar atrás.

Saio do vestiário com o nariz empinado, porém mais calma.

— Alex, pega meu capacete e luvas, por favor. — Ele corre me atender e agradeço quando ele volta. Todos estão ressabiados e eu entendo a tensão.

— Vou testar e depois conversamos. — Faço três voltas completas e percebo que houve mesmo uma melhora, mas não está perfeito ainda. Não consigo identificar o defeito e isso me deixa constrangida. Terei mesmo que assumir meu destempero.

Saio do carro nos boxes e ao tirar o capacete encontro o seu olhar intenso.

— Bom pessoal, senti que o defeito foi diminuído, porém ele ainda está presente. Peço desculpas por ter gritado com vocês e desmerecido os esforços da semana. Vamos trabalhar juntos para achar a solução. Vocês me desculpam? — Todo mundo aceitou na boa e cada um foi para seus afazeres. Eu fiquei ali, olhando as planilhas, absorta, quando ele chega ao meu lado.

— Viu como conversar é melhor que gritar? Não dói e não arranca pedaço.

— Desculpa, Guto. Também fui grossa com você.

— Já tinha te desculpado, chefa. Assim que vi você sem camisa. Impossível ter raiva de uma mulher tão... — Ele para de falar e olha para cima, fingindo pensar. — ...tão perfeita. — Sem querer, sorrio abertamente.

— Vamos trabalhar juntos, então? Para tirar esse mal entendido da frente. — Estico a mão para ele, que pega e beija. Sinto uma coisa louca por esse homem e eu não vou conseguir manter isso sob controle. Deixo os questionamentos para quando estiver em casa.

Foco no trabalho e toda a equipe trabalha junto. Passamos a tarde toda envolvidos no defeito, sem ter chegado a nenhuma conclusão.

— Chega pessoal. Amanhã voltamos com a cabeça fresca. Se alguém tiver alguma ideia mágica, anota, não deixe se perder. Pode ser que a resolução esteja ao alcance da mão e não estamos enxergando. — Todos saem e eu fico ali, olhando para a bancada, pensando no que fazer com esse conflito de emoções.

Estou a ponto de trocar anos de amor e convivência por um tesão de adolescente. Não posso jogar uma vida no lixo e me entregar a essa atração por um homem que eu nem conheço. Não sei nada dele a não ser o que os jornais noticiam: solteirão e mulherengo. Encrenqueiro e excelente piloto, com um passado um tanto obscuro.

— Atrapalho? — Guto entra na oficina, já vestido com seu jeans e camisa polo. É um belo homem, não tenho como negar.

— Entra aí. Já vou embora também. — Ele senta ao meu lado na bancada e seu perfume invade meus sentidos.

— Eu quero pedir desculpas a você. Eu não podia invadir o seu espaço e muito menos te falar o que falei.

— Você tinha razão, Guto. Eu sou assim mesmo. Meio grossa com a galera. Não gosto de trapaça e quando me deparo com uma, não aceito muito bem. Vou tentar controlar isso, se houver uma próxima vez.

— Você vai largar a corrida?

— Nem em sonho. Vou tirar o trapaceiro da minha frente, na moral, sem roubar. — Olho para ele que me fita orgulhoso.

— Assisto todas as corridas e não fazia ideia que Fênix era uma mulher, e antes que reclame, não é machismo, é que você pilota muito e geralmente são os homens que tem essa conexão com a máquina.

— Talvez eu seja um homem em um corpo de mulher.

Ahh... Amapola, eu não tenho dúvidas que você é uma mulher. Não depois do que vi hoje.

— Viu o quê?

— Acho que você não anda se olhando no espelho. Você é linda, tem um corpo todo curvilíneo, uns seios redondinhos. — Ele abre a mão e olha. — Devem ser o meu número. Seu rosto é harmonioso. Essa cascata preta espalhada no meu travesseiro, caralho, nem posso imaginar isso. — Eu desço da bancada, mas gostaria que ele provasse que posso mesmo ser esse mulherão que ele descreveu.

— Vamos, piloto. Tenho um compromisso com meu noivo. — Ele desce da bancada e abaixa a porta da oficina. Depois caminha ao meu lado até a portaria.

— Nunca fui de invejar alguém, mas hoje eu gostaria de trocar de lugar com ele. — Guto é bem-humorado.

— Quer tanto assim jantar comigo, piloto?

— Quero foder você, Amapola. Se sobrar tempo, aí sim, podemos comer algo. Bom jantar. — Ele vai para o seu esportivo e sai acelerando. Eu fico ali, sem chão, sem compreender os batimentos acelerados do meu coração. Entro no carro e vou para casa com um monte de ideias na cabeça.

PAIXÃO NO RETROVISOROnde histórias criam vida. Descubra agora