AINDA ME LEMBRO DE meu pai. Era um homem alto e bonito, com uns olhos grandes e um bigode preto. Sempre que estava comigo, era a me beijar, a me contar histórias, a me fazer os gostos. Tudo dele era para mim. Eu mexia nos seus livros, sujava as suas roupas, e meu pai não se importava. Às vezes, porém, ele entrava em casa calado. Sentava-se numa cadeira ou passeava pelo corredor com as mãos para trás, e discutia muito com minha mãe. Gritava, dizia tanta coisa, ficava com uma cara de raiva que me fazia medo. E minha mãe saía para o quarto aos soluços. Eu não sabia compreender o porquê de toda aquela discussão. Sei que, com um pouco mais, lá estava ele com a minha mãe aos beijos. E o resto da noite, até ir me deitar, era só com ela que ele estava, com os olhos vermelhos de ter chorado também.
Eu o amava porque o que eu queria fazer, ele consentia, e brincava comigo no chão como um menino de minha idade. Depois é que vim a saber muita coisa a seu respeito: que era um temperamento excitado, um nervoso, para quem a vida só tivera o seu lado amargo. A sua história, que mais tarde conheci, era a de um arrebatado pelas paixões, a de um coração sensível demais às suas mágoas. Coitado de meu pai! Parece que o vejo quando saía de casa com os soldados, no dia de seu crime. Que ar de desespero ele levava, no rosto de moço! E o abraço doloroso que me deu nessa ocasião! Vim a compreender, com o tempo, porque se deixara levar ao desespero. O amor que tinha pela esposa era o amor de um louco. O seu lugar não era no presídio para onde o levaram. O meu pobre pai, dez anos depois, morria na casa de saúde, liquidado por uma paralisia geral.