O OUTRO MESTRE QUE eu tive foi o Zé Guedes, meu professor de muita coisa ruim. Levava-me e trazia-me da escola todos os dias. E na meia hora que ficava com ele, de ida e volta, aprendi coisas mais fáceis de aprender que a tabuada e as letras. Contava-me tudo que era história de amor, sua e dos outros.
— Ali mora Zefa Cajá.
E lá vinha com os detalhes, com as coisas erradas da vida desta mulher. Às vezes parava na porta, e era uma conversa comprida, cheia de ditos e de sem-vergonhices.
— Olha o menino, Zé Guedes! Ô homem desbocado!
Mas ele pouco se importava comigo. Eu mesmo gostava de ouvir o bate-boca imundo. Pelo caminho o moleque continuava nas suas lições, falando de mulheres e de doenças do mundo. E nome por nome, ele dava de todas as doenças: cavalo, mula, crista-de-galo.
Às vezes, da estrada, pediam para comprar coisas na vila: carretéis de linha, papel de agulhas. Zé Guedes entregava as encomendas, puxando conversas compridas com as mulatinhas.
— Aquela ali já foi passada. Quem manda nela é o doutor Juca.
E eu ia sabendo que o meu tio Juca tinha mulatas em quem mandava. De uma feita desceu numa casa de palha, onde só morava uma negra. Ficou lá dentro uma porção de tempo. Quando saiu, ouviu a mulher dizendo:
— Não vá se esquecer do corte de chita, seu xeixeiro!
Eram assim as minhas lições de porcaria com aquele mestre que não se contentava com o lado teórico de seu magistério e também dava as suas lições de coisas.
Nós tínhamos, porém, no curral pegado à casa-grande, uma aula pública de amor. O que Zé Guedes nos contava dele com as Zefas, os touros e as vacas nos faziam entrar pelo entendimento. Era ali um bom campo de demonstração. No cercado dos engenhos o menino se inicia nestes mistérios do sexo, antecipando-se por muitos anos no amor. A reprodução da espécie ficava para nós um ato sem grandeza nenhuma. Víamos as vacas e as porcas nas dores do parto. E éramos quase seus assistentes. Lembro-me de uma vaca malhada que morreu por uma malvadeza do meu primo Silvino. Ele se meteu a médico, e com uma imperícia infeliz matou a pobre novilha turina do meu avô. Ninguém soube no engenho deste crime cometido com a minha cumplicidade.
Concorríamos também no amor com os touros e os pais de chiqueiro. Tínhamos as nossas cabras e as nossas vacas para encontros de lubricidade. A promiscuidade selvagem do curral arrastava a nossa infância às experiências de prazeres que não tínhamos idade de gozar. Era apenas uma buliçosa curiosidade de menino, a mesma curiosidade que nos levava a ver o que andava por dentro dos brinquedos.
Uma tarde o primo Silvino me disse:
— Hoje vamos fazer porcaria no curral.
De fato, à boca da noite, quando o gado chegado do pastoreador descansava, uns deitados e outros parados a olhar o chão, eu vi o primo Silvino trepado na cerca, procurando pôr-se por cima de uma vaca mansinha. Nós todos ficávamos de longe, mudos e sôfregos, como se fôssemos cúmplices de um crime.
— Sai daí, menino severgonho. Vou dizer ao coronel.