A MINHA TIA SINHAZINHA era uma velha de uns setenta anos. Irmã de minha avó, ela morava há longo tempo com o seu cunhado. Casada com um dos homens mais ricos daqueles arredores, o dr. Quincas, do Salgadinho, vivia separada do marido desde os começos do matrimônio. Era um temperamento esquisito e turbulento. Contava-se que um dia amanhecera num engenho de seu pai, amarrada num carro de boi, com uma carta do marido fazendo voltar ao sogro a sua filha.
Era ela quem tomava conta da casa do meu avô, mas com um despotismo sem entranhas. Com ela estavam as chaves da despensa, e era ela quem mandava as negras no serviço doméstico. Em tudo isso, como um tirano. Meu avô, que não se casara em segundas núpcias, tinha, no entanto, esta madrasta dentro de casa.
Logo que a vi pela primeira vez, com aquele rosto enrugado e aquela voz áspera, senti que qualquer coisa de ruim se aproximava de mim. Esta velha seria o tormento da minha meninice. Minha tia Maria, um anjo junto daquele demônio, não tinha poderes para resistir às suas forças e aos seus caprichos. As pobres negras e os moleques sofriam dessa criatura uma servidão dura e cruel. Ela criava sempre uma negrinha, que dormia aos pés de sua cama, para judiar, para satisfazer os seus prazeres brutais. Vivia a resmungar, a encontrar malfeitos, poeira nos móveis, furtos em coisas da despensa, para pretexto de suas pancadas nas crias da casa.
As negras odiavam-na. Os meus primos corriam dela como de um castigo. E quando saía para a casa de uma filha, na cidade, era como se um povo tivesse perdido o seu verdugo. Minha tia Maria assumia a direção da casa — e todos iam conhecer a mansidão e a paz de uma regência de fada. Depois que vim a saber as histórias de rainhas cruéis, as intrigas perversas das Anas Bolenas, acreditava em tudo, porque me lembrava da tia Sinhazinha.