Pov. Narrador
Augusto acordou com uma sensação estranha, uma preocupação. Não uma preocupação qualquer, do tipo: não posso esquecer de avisar fulano sobre o cancelamento do encontro. Não. Era algo maior do tipo: ciclano está em perigo. Passava das seis horas da manhã quando ele acordou desse jeito, ele estava acostumado a acordar cedo, especialmente em dias de semana, mas naquele dia ele não tinha nada que o obrigasse a levantar antes das dez da manhã.
Tinha alguma coisa errada.
Augusto ficou um tempo encarando o teto sobre a cama, era uma sensação que nunca sentiu antes. Ele nem sabia se era preocupação realmente, podia até estar tendo um ataque cardíaco. Resolveu se levantar, voltar a dormir estava fora de cogitação, também não tinha nada que fazer em pé, mas precisava manter o corpo em movimento para aliviar a tensão. Se encaminhou ao banheiro, um banho talvez ajudasse.
A água não foi a melhor amiga que ele esperava, mas tudo bem, a água do planeta está acabando, melhor não desperdiçar. Escovava os dentes em frente ao espelho, parou para observar seu rosto. Nada demais, poros suaves, graças a última esfoliação que fez. Seus dentes também lhe davam orgulho, nada dessa modinha de lentes dentárias, era um sorriso natural, tratado a base de aparelhos ortodônticos, adolescência fodida que ele teve. Mas o que preocupava Augusto naquele momento era os olhos, pareciam meio apagados, distantes, culpa daquele sentimento que não ia embora.
Iria correr, nada melhor que uma boa corrida para soltar endorfina e acabar com a preocupação.
Vestiu uma calça de moletom, camiseta de algodão e os tênis. Não se parecia em nada com as roupas que usava geralmente para os treinos, lá era sempre regata e short de malha, que evidenciava bastante a região abaixo da cintura. Deu de ombros. Colocou o AirPods e saiu do prédio para a corrida.
Augusto correu sem pressa, aproveitando a vista, observando as ruas no seu início de despertar, o sol já estava alto, o que significava que o dia seria quente. Nada diferente para aquele país. Havia dias que ele sentia falta da sua terra natal, o clima mais ameno, você sabia se o dia ia ser frio ou quente, não como no Brasil, que o dia começa com uma geada, se transforma em quente como o inferno e acaba com o dilúvio da arca de Noé.
Mas não era só o clima que fazia Augusto suspirar ao pensar na velha e boa Alemanha. Sua família ainda morava lá, sentia falta dos pais todos os dias, e a sobrinha, filha da sua irmã mais velha, que já estava com um pouco mais de dois anos, ele nem sequer tinha conhecido. Ele encontrava os pais, pelo menos uma vez no ano, sempre fora do país. Ele não podia voltar para lá, não sem ser pego pelo pai de Beatriz. A primeira e última vez que pôs os pés no país depois da fuga repentina, quase dois anos depois, foi preso pelo homem, que apreendeu seu passaporte e o manteve em cárcere por duas longas semanas, até que a mãe da sua amiga se compadeceu e o deixou fugir, com a promessa que manteria sua filha a salvo, e a forçaria entrar em contato. Depois disso, seus pais sempre iam a um país diferente para se verem.
Beatriz.
Augusto a conhecia desde criança, hoje ele ri da época, mas quando se conheceram, ele a achou imensamente insuportável. Foi um jantar na casa dela, ele não se lembra se era alguma data especial, mas sabe que a família tinha acabado se mudar para Berlin vindo de Munique, onde nasceu e passou parte da sua infância. Ele não conhecia ninguém, nem crianças e nem os adultos, sua irmã já era uma adolescente que não queria ser vista com ele e seus pais tinham coisas mais importantes para fazer.
Ele lembra com exatidão da primeira vez que viu Beatriz, ela estava descendo as escadas, tinha o rosto levantado e descia os degraus como uma rainha, tinha até súditos, as crianças atrás dela faziam um cortejo. Ele tinha achado aquela cena muito engraçada e muito intimidadora ao mesmo tempo. Augusto estava parado ao lado da escada, bem no caminho onde ela ia passar, quando ela o percebeu ali, levantou ainda mais o nariz e jogou os cabelos por cima do ombro e desviando o caminho, sem se incomodar em saber quem era o recém-chegado. Um dos meninos que a seguia o empurrou e ele caiu sentado. Ele odiou aquela noite.
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Escolha de sucesso
Chick-LitBeatriz Saldanha não é a tipica mocinha dos romances de Hollywood. Talvez ela seja classificada como uma bela atriz porno. Mas a questão não é essa. Beatriz é uma mulher forte, destemida, determinada e que vai fazer grandes descobertas na sua vida...