Capítulo 22

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Quando Katniss percebe minha presença, ela praticamente engasga com sua comida enquanto seus olhos se arregalam, revelando algo próximo de pavor. Todos na mesa, Gale que se arrastou para mais próximo dela, Johanna, Delly, Annie e Finnick, olham lentamente para mim. Assustados. Deixo meu olhar pousar um pouco mais sobre Finnick, e mal contenho meu misto de felicidade e ódio por vê-lo finalmente. Ele parece feliz, e completamente apaixonado. Invejo ele. Delly, apesar de tudo lança um sorriso em minha direção. Isso faz com que minhas mãos parem de tremer, apenas um pouco.

— Peeta! — Delly me chama, tão genuinamente alegre, que eu me vejo obrigado a retribuir seu olhar. — É muito bom te ver fora... e por aqui.

As algemas ainda fazem meus pulsos doer. Meus olhos insistem em voltar para Katniss, que me encara também.

— E esses braceletes extravagantes? — Johanna pergunta, e dá um tapinha em meu braço.

— Eu não sou totalmente digno de confiança ainda — respondo. — Eu não posso mesmo sentar aqui sem suas permissões.

Indico os guardas atrás de mim.

— Sem dúvida ele pode sentar aqui. Nós somos velhos amigos — Johanna comenta me lançando um olhar conspiratório, e bate a mão no espaço vazio ao seu lado. Olho para os guardas que acenam positivamente, porém eu mesmo tenho dúvidas acerca de me sentar aqui. Com Katniss do outro lado da mesa. Uma última olhada revela os olhos de Gale irradiando ódio sobre mim.

— Peeta e eu tínhamos celas vizinhas na Capital. Nós estamos realmente familiarizados com os gritos um do outro – Johanna comenta casualmente, e eu lhe lanço um olhar repreendedor. Não quero me lembrar de nada do que aconteceu naquele inferno. Sinto meu coração acelerar. Algumas colheradas do ensopado, apesar de delicioso, faz eu me sentir enjoado.

Annie tapa os ouvidos, em desespero, e eu me pergunto o que ela sofreu na capital.

— O quê? Meu psicólogo disse que não posso censurar meus pensamentos. Isso é parte da minha terapia — Johanna diz, sem pestanejar. Sinto sua mão ossuda apertar meu joelho. Apenas a olho, um pouco surpreso, e ela pisca.

Finnick acalma Annie. Delly parece angustiada. Katniss e Gale comem fitando o chão, ou olhando um para o outro. Eu acabei com a felicidade de todos só pelo fato de estar aqui.

— Annie — Delly pigarreia, assumindo de repente um tom feliz — você sabe que foi Peeta que decorou seu bolo de casamento? Em casa sua família conduzia a padaria e ele fazia todas as coberturas de glacê.

Levanto a cabeça, e comprovo que mais uma vez os olhares de todos recaem sobre mim, como se eu fosse explodir a qualquer momento. Como se eu fosse o motivo de tanta destruição e morte.

Annie me fita, e então eu percebo como ela é linda, e aparenta tanta... inocência. Sinto algo parecido com felicidade por ter contribuído para o bolo do seu casamento.  

— Obrigado, Peeta. Estava lindo – ela murmura, e me lança um meio sorriso.

— O prazer foi meu, Annie — respondo, com toda a sinceridade.

— Se nós vamos mesmo dar aquele passeio, seria melhor nós irmos indo — Finnick fala para ela.

Finnick... Que eu achei ser meu amigo. Espero que ele não use Annie, como Katniss fez comigo.

— Bom ver você, Peeta – ele me diz, enquanto se levanta, segurando firmemente a mão da esposa, equilibrando as bandejas na outra.

— Seja gentil com ela, Finnick. Ou eu posso pegar ela e manter longe de você – digo, mas a voz não parece ser minha. O que está acontecendo comigo?

Minha cabeça lateja. Olho para Katniss, sentindo meu sangue ferver. Eu preciso sair daqui.

— Oh, Peeta — Finnick fala falsamente alegre. — Não me faça arrepender de ter reiniciado seu coração.

E então ele sai com Annie, deixando um clima de tensão para trás.

— Ele salvou sua vida, Peeta. Mais que uma vez – Delly me repreende.

— Por ela. — indico com a cabeça na direção de Katniss. — Pela rebelião. Não por mim. Eu não devo a ele qualquer coisa.

— Talvez não. Mas Mags morreu e você está aqui. O que deve contar para alguma coisa – Katniss diz, sua voz me atinge, como adagas afiadas. Eu me lembro de Maggs, caminhando para a morte, olhando em meus olhos.

— Sim – começo, minha voz subindo tons cada vez mais altos - uma porção de coisas poderia contar para alguma coisa, Katniss. Eu tenho lembrado de algumas memórias que não posso dar sentido, e não acho que a Capital trocou elas. Uma porção de noites no trem, por exemplo.

Katniss permanece em silêncio. Confirmando que realmente aconteceu. Que ela realmente adormeceu por vezes em meus braços. Mas agora, nada disso importa.

Faço um gesto ligando Gale a ela, com minha colher.

— Então, vocês dois são oficialmente um casal agora, ou eles estão prolongando a coisa de amantes destinados?

— Ainda prolongando — Johanna responde, distraidamente.

Minha cabeça dói intensamente. Meu corpo se contrai em espasmos, e eu penso estar tendo um ataque. Cerro os punhos, e tento conter o grito que explode em minha garganta.

- Tenho que me controlar – sussurro – eu não sou um louco.

— Eu não teria acreditado se eu mesmo não tivesse visto – a estrondosa voz de Gale me traz de volta.

— O quê? — pergunto de volta, irritado.

— Você — Gale responde.

— Você poderia ser um pouco mais especifico — digo e com surpresa, constato que meu desejo de acabar com Gale é tão grande quanto o de acabar com Katniss. — O que sobre mim?

— Que eles tinham substituído você por uma versão de mutação má de você mesmo —diz Johanna, passando os dedos no seu prato, pegando cada resto de ensopado, e os levando a boca.

— Você acabou? — Gale pergunta a Katniss.

Ela assente e caminha em sincronia com ele, para longe de mim. Sem um último olhar para trás.

- Você tem que parar de agir assim – os gritos de Delly ecoam no refeitório – ela não te fez nada. Ninguém aqui fez nada pra você...

- Você não sabe de nada – explodo.

- Eu sei que você sofreu muito – agora ela soluça descontroladamente – mas você tem que superar... E parar de tratar ela... todos... desta maneira....

- Por favor... pare... – levo as mãos em minha cabeça, imagens de Katniss rindo de mim, me beijando, tomam conta de mim... – tratar a todos de que maneira?

- Como se nos odiasse – ela grita, e sai correndo, com seus soluços ecoando pelo corredor.

- Talvez eu apenas me odeie – grito, sentindo lágrimas escorrer por meu rosto.... – eu vou me vingar... eu vou acabar com ela..

Sinto os guardas me levantando, eu me debato tentando inutilmente me safar deles. Vejo Johanna trocando meu prato cheio de comida pelo dela, vazio... A dor em minha cabeça me sufoca...

- Eu vou matar... Katniss... – grito, sentindo todos os olhares aflitos sobre mim. – Não é real.... não é real....

Os guardas me arrastam pelo corredor... Eu ainda me debato...

- Eu vou pôr um fim nisso – minha voz já está rouca, de tanto eu gritar... – eu a odeio....

Os guardas tentam me conter, sem muito sucesso.

- Eu amo ela – as palavras saem como um sussurro...

Já estou em minha cela no hospital... sinto a agitação ao meu redor, as agulhas em minhas veias... Suor e lágrimas escorrem por meu rosto, enquanto levo minhas mãos aos lábios, ainda descrente pelo que acabei de dizer...  Eu a amo. Talvez, no meio desta loucura em que minha mente se encontra, esta seja a única e incontestável verdade. 

A Esperança - Peeta MellarkOnde histórias criam vida. Descubra agora