Finnick se foi. Conforme a sensação delirante do beijo de Katniss vai passando, a certeza irrefutável de que Finnick está morto, me domina. Portanto, eu mal reajo quando vejo que Katniss matou uma mulher, quando emergimos do esgoto direto para o apartamento dela. Eu passo por cima de seu corpo, sem vida, e me jogo no sofá, enquanto os outros revistam a casa. Dói demais perder alguém que a gente gosta. Ás vezes eu consigo me lembrar de Finnick me ajudando na arena, não permitindo que eu fosse morto, e eu nem pude fazer o mesmo por ele. Eu nem pude dizer o quanto eu gostava dele. Eu nem pude demonstrar isso. Acho que é o que mais me causa dor. Eu quero chorar, mas nem isso eu consigo. Me sinto seco por dentro, como se todos os sentimentos bons estivessem sendo levados de mim, por esse espírito de morte que paira ao nosso redor. Boggs, Mitchell, Messalla, Leeg, Jackson, Homes, Castor e Finnick.... Não consigo acreditar que estejam todos mortos. Eu somente tenho o amor que sinto por Katniss, me mantendo vivo. Mas quando nem a isso eu puder me agarrar, não sei o que será de mim. Meus dentes doem, então percebo que estou com os dentes cerrados, extremamente forte. Pego uma almofada, e a mordo. Para que de algum jeito, eu consiga aliviar minha frustração. Todos mortos, e eu não consegui salvar ninguém. Pobre Annie. Largo a almofada e forço as algemas em meus pulsos já machucados. Sangue verte e a dor me faz esquecer, ao menos um pouco, a dor emocional de perder um amigo.
Após breves instantes de silencio, Katniss decide que é hora de partirmos. Eu mais uma vez pondero se não seria melhor eu não ir com eles. Ainda tenho medo de me descontrolar, mas meu desejo de proteger Katniss fala mais alto, e eu permaneço em silencio. Nos closets da falecida mulher, achamos muitas roupas femininas e masculinas, se bem que é difícil distinguir as diferenças entre as roupas. Há também um exagero em maquiagens. Katniss libera as algemas momentaneamente para que Cressida me ajude a colocar alguns casacos, e em seguida sou algemado novamente. Vejo os olhos de katniss fixos em meus pulsos, ainda sangrando um pouco, e percebo quando ela toca novamente em seu bolso. Logo prevejo sua intenção. Eu me afasto imediatamente dela, e levo as mãos ao peito.
— Não. Não. Elas ajudaram a me segurar – digo, sentindo um desespero só de pensar em ficar livre, o que é estranho.
— Você pode precisar de suas mãos — diz Gale.
— Quando eu me sinto escorregando, aperto meus pulsos nelas, e a dor me ajuda a me focar — respondo, o que não é cem por cento mentira. Mas, meu real medo, é me perder, e acabar atacando Katniss, o que ficaria mais fácil, sem as algemas. Não posso permitir que isso aconteça.
Em seguida Katniss aplica camadas de maquiagem sobre meu rosto, e eu me sinto incapaz de desviar meus olhos dos seus lábios. Quando ela percebe, ruboriza, e logo avisa que terminou. Então, eu pego um dos estojos de maquiagem, um pincel, e com receio, a olho nos olhos, como se pedisse a permissão dela. De soslaio vejo Gale nos fitando, rígido, enquanto Cressida o maquia. Katniss assente, então eu começo a maquiar seu rosto. E então, a coisa flui por minhas mãos. É como se o rosto de Katniss fosse uma tela, eu me permito viajar, pintar toda uma aquarela contrastando ao redor de seus belos olhos, pintando seus lábios da cor do fogo, que arde dentro de mim, no desejo de beijá-la. Quando termino, sorrio, admirando o quanto ela ficou linda. Mas ainda está reconhecível. Eu também devo estar. Cressida realça nosso disfarce nos envolvendo com lenços, óculos e perucas. Por fim, saímos para rua, marchando sem um destino certo, com neve caindo sobre nós. Andamos apenas alguns metros, quando um bocado de pacificadores aparece marchando pela rua, de encontro ao nosso pequeno grupo. Nós damos caminho á eles, como o resto das pessoas faz. O terror de repente começa a preencher meu corpo, começo a me lembrar de tudo o que sofri nas mãos de pacificadores, como estes. Começo a tremer, e não é pelo frio. Uma mão segura a minha. Pollux. Por baixo de sua toca peluda, ele me lança um olhar, como se dissesse - "hey, eu sei o que você está sentindo, pois eu sinto o mesmo" – aperto sua mão, e fecho os olhos, até que os pacificadores se distanciam, e nós nos misturamos com as pessoas mais uma vez. Andamos mais um pouco, quando escuto sirenes. Katniss aponta para um apartamento, e pela televisão é possível ver fotos nossas, inclusive de Finnick e Castor. Estamos sendo dados como vivos. Ah, quem dera se fosse verdade, e que ao menos Finnick ainda estivesse entre nós. Seguimos adiante, e chegamos a uma parte diferente da capital. É como se essa fosse a parte pobre. E eu não sabia que havia uma parte assim aqui, pensava que a pobreza era dignada apenas aos distritos. Mas vejo que estava enganado. Passamos por lojas maltrapilhas, vitrines empoeiradas, e desertas. E então, Cressida empurra a porta de uma das lojas, e adentra. Apenas a seguimos, até que me deparo com a criatura mais estranha que já vi. Na capital, é possível ver de tudo. Mas esta pessoa a minha frente, com certeza conseguiu ultrapassar os limites do que é "bonito" para os habitantes daqui. Listras douradas e pretas percorrem sua face, seu nariz, é quase inexistente, e logos bigodes felinos dão o toque final, para o que eu posso descrever apenas com uma palavra. Assombroso.
VOCÊ ESTÁ LENDO
A Esperança - Peeta Mellark
FanfictionEsta é uma fanfiction do livro "A esperança", pela perspectiva do personagem Peeta Mellark.