Observo enquanto todos acordam. A exaustão é palpável. Ainda me pego pensando o que Cressida tem a ganhar com isso. Pollux posso até entender pois ele foi vítima da crueldade da Capital, mas ela? Até onde eu sei ela estava dentre as pessoas bem-sucedidas da capital antes de decidir se juntar a causa rebelde. Espero que ela não seja uma traidora. Katniss como sempre se estica um pouco, ainda sentada, e mesmo após levantar ela não dirige seu olhar a ninguém. Tigris nos chama para um café da manhã, e para assistirmos a programação da capital. Enquanto me forço a comer um pouco de biscoito de figo, os rebeldes tomam lugar na programação, mostrando uma esquadra com a engenhosa ideia de mandar para as ruas carros dos cidadãos da Capital, sem nenhum motorista para engatilhar as armadilhas. Podem não ativar todas, mas com certeza estão conseguindo fazer isso com a maioria delas visto que várias esquadras já avançaram bastante rumo ao centro, a cidade circular onde fica a mansão de Snow. Katniss tira de seu bolso o mapa de papel, já desgastado, e com a ajuda de Cressida consegue decifrar onde os exércitos rebeldes possivelmente estão, o que é bom para nós, pois podemos apenas avançar pelo caminho que já fizeram, evitando as armadilhas. Nós, não, eu me corrijo. Pois eu não posso fazer essa jornada com eles.
— Isso não pode durar — diz Gale. — De fato, estou surpreso que eles mantiveram isso funcionando por tanto tempo. A Capital irá ajustar desativando armadilhas específicas e então as engatilhando manualmente quando seus alvos estiverem no alcance.
Com um tremor, percebo que isto pode mesmo acontecer. Minutos depois, vemos isso se tornar realidade, então o controle é voltado para a Capital, que assume a programação novamente. É claro que os rebeldes não querem mostrar suas perdas.
— Eu aposto que está matando Plutarco não estar na sala de controle — comento, distraído e enjoado. Afinal, ele foi idealizador. Não é algo que se possa mudar do caráter, facilmente.
Ninguém diz nada em menção ao meu comentário. Katniss continua sem ao menos olhar na minha direção.
Então, barulhos chamam a nossa atenção. Katniss se move rapidamente até a janela, passando ao meu lado, seu ombro roça o meu, o que me causa uma sensação maravilhosa, e terrível ao mesmo tempo. Eu vou para perto da janela também, mas vejo apenas silhuetas, se movendo, carregando várias coisas, uns de mãos abanando, outros bem agasalhados. É uma confusão de pessoas. Me afasto, com medo de ser visto por alguém. Estou prestes a sugerir o mesmo para Katniss, quando ela se afasta por conta própria, pensativa. A pergunta paira. Para onde todas essas pessoas estão indo? E por que?
De volta ao úmido porão, Tigris nos avisa que irá para a cidade circular, ver o que consegue descobrir. Não sei se a capital tem culpa nisso, mas não consigo mais confiar nas pessoas. Passo a tarde, temendo que Tigris tenha nos denunciado. Passo a tarde, pensando em como me matar rapidamente caso eu seja pego pelos pacificadores. Passo a tarde observando Katniss andar de um lado para o outro, ainda sem dirigir seu olhar a mim. Será que ela finalmente se deu conta do quão ridículo eu sou? Algemado numa escada, sem ter controle total sobre mim, vivendo a mercê do veneno em meu sangue, e de um pouco do amor dela?
Passa-se bastante tempo até que escutamos algum barulho. Ficamos apreensivos, até que Tigris aparece e nos chama para cima. O cheiro de carne fritando faz minhas pernas amolecerem. Ao menos minha perna que não é de metal. Quando chegamos a pequena cozinha, Tigris nos serve, generosas porções de carne macia e batatas para cada um, e uma pequena porção de carne para ela também, porém crua. Nunca vou deixar de me encantar ao ver o brilho nos olhos de Katniss perante um bom prato de comida. Com um sorriso torto em meus lábios, consigo comer, dessa vez, sem ter que me forçar a isso, pois está realmente muito delicioso. Tigris conta como trocou suas roupas de pele falsa por comida, pois com o frio que faz, roupas quentes se tornaram muito valiosas. Ela também nos informa que várias áreas invadidas por rebeldes, foram evacuadas, o que explica a multidão que vimos na rua mais cedo. Chega a ser cômico, presenciar cidadãos da Capital desabrigados. Como é viver alguns dias, da maneira em que vivemos nos distritos a vida toda? É o que eu tenho vontade de perguntar a eles.
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A Esperança - Peeta Mellark
FanfictionEsta é uma fanfiction do livro "A esperança", pela perspectiva do personagem Peeta Mellark.