Capítulo 39

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Aos poucos as coisas vão melhorando. Só o fato de saber que Snow não está mais no comando, já é algo para se comemorar. Recebo sempre as mesmas visitas e a médica que está cuidando de mim, diz que a companhia constante dos meus amigos está fazendo com que eu me recupere depressa. Sem pensar fiz um comentário estúpido sobre todas as minhas médicas estarem mortas. Ela não voltou mais para me ver. Agora, só as enfermeiras aparecem para administrar os remédios, que são muitos. Haymitch tem se mantido num total estado de embriaguez. Sei que essa recaída enorme, se deve ao fato de ele se culpar pelo que aconteceu a mim e a Katniss. Já tentei tirar essa suposição de sua cabeça, mas ele se provou teimoso como uma mula. É difícil vê-lo sóbrio. Johanna parece tão sem rumo quanto eu, agora que tudo acabou. Não temos saúde física muito menos mental, mal temos uma profissão, somos apenas vencedores de jogos brutais que não existem mais. Sua diversão tem sido fazer piadas sobre minha nova aparência, mas conforme minha pele vai cicatrizando, suas piadas vão diminuindo. Ao fim de nossos encontros temos que nos segurar para não chorar. As marcas da tortura na capital ainda estão bem recentes para nós. Certa vez, ela me confessou que os únicos homens que ela não tem vontade de sair correndo quando a tocam, são Haymitch e eu. Delly vem dar minhas refeições. Eu sei que devo ter uma conversa séria com ela, pois eu me lembro bem do nosso beijo de despedida. Mas eu simplesmente não consigo nem mencionar esse assunto, pois parece algum tipo de traição. E eu nunca poderei dar o amor que ela merece, não seria justo magoá-la tentando dar algo que eu simplesmente não posso. Para meu alívio ela também não toca no assunto, e parece muito feliz em apenas ficar ao meu lado, dar sopa na minha boca e me observar dormir. Até dói ver o tamanho de seu amor por mim, sabendo que nunca será recíproco. Carolynn tem aparecido menos, ela diz se sentir uma intrusa. Eu brinco, e digo que ela pode até ser uma intrusa, mas é uma intrusa que salvou a minha vida e a de Katniss também. Quando eu digo isso ela sempre mostra suas covinhas num sorriso encantador, que me faz ter vontade de guardá-la numa caixa para o mundo não a machucar. Porém eu sei a ferocidade que se encontra por detrás dessa aparência de boneca, então fico menos preocupado. Eu gostaria de perguntar a ela sobre Cinna, visto que ninguém sabia da existência dela. E se sabiam, porque ela não foi torturada como o resto de nós. Mas não acho certo fazer isso. Porém, para minha surpresa, a visita que mais me alegra, é a de Annie. Desenvolvemos uma comunicação única e esquisita. Ela vem me ver todos os dias, e passa vários minutos, absorta, roçando os dedos em minhas cicatrizes. Ela também gosta de ficar com a mão pousada em meu peito. Diz que gosta de sentir meu coração batendo. Diz que assim, consegue sentir Finnick por perto. Recentemente começamos uma discussão sobre possíveis nomes de bebês. Nada parece digno o bastante para essa criança que está por vir. Eu também gosto de tocar a barriga dela, que parece que a cada dia que passa, cresce mais, como se fosse possível. Certo dia, enquanto tocava sua barriga, senti algo estranho. No começo fiquei apavorado, era como se algo estivesse se mexendo, e eu achei que pudesse desmaiar com medo de que alguma coisa estava acontecendo ao bebê. Mas ao olhar para Annie, seus olhos cheios de lágrimas e seu sorriso no rosto, pude entender o que aconteceu. A primeira vez que a criança chutou, foi aquela. Palavras me faltam para descrever o sentimento de ser a primeira pessoa a presenciar isso. Tudo estaria bem, se não fosse as notícias angustiantes que recebo de Katniss. E hoje, é o dia em que eu finalmente poderei vê-la. Após uma recuperação excruciante minhas costelas que haviam sido quebradas de novo, estão quase recuperadas. Minha pele ainda assusta algumas pessoas, mas a considero muito melhor do que naquela primeira vez que vi meu reflexo no espelho. Ainda sinto várias dores, tenho que tomar remédios para dormir, para não vomitar, para dor. Mas ao menos estou vivo. Recebi alta do hospital apenas ontem. Fui trazido para a mansão de Snow, que agora é a mansão de Coin. A viagem foi tortuosa e cheia de recordações, seguidas por espasmos. Haymitch havia me informado sobre o julgamento e condenação de Snow, sobre Katniss ter voltado a falar, e sobre a cerimônia que aconteceria hoje na qual Katniss irá matar Snow. Mas eu estou extremamente nervoso. Não acho que seja certo, ela o matar. Eu só acho que ela deveria ficar longe disso tudo, e se contentar por saber que ele está morto. Tomo um banho rápido na suíte que me foi designada. Consigo até reconhecer alguns corredores, do tempo em que fui trazido aqui para cumprir as ordens de Snow. Haymitch aparece, e me entrega um pacote com as roupas que terei que usar, o que descubro ser um uniforme cinzento do distrito 13. Ah claro, tenho que representar os rebeldes. Em seguida dois sujeitos bem-humorados que declaram ser do distrito 8, me conduzem até uma sala, onde encontro Annie, Johanna, Haymitch, Beetee e para meu espanto, Enobaria. Isso é uma espécie de encontro de vencedores? Johanna parece estar furiosa, e Annie, assustada. Eu me sento ao lado de Johanna, para segurá-la caso ela voe para cima de Enobaria, num ataque de fúria. Bom, talvez eu não a segure, já que por culpa dessa mulher o plano original de Beetee não deu certo. Beetee parece mais distante e lunático do que antes. E agora necessita de uma cadeira de rodas. Katniss surpreende a todos nós quando adentra a sala. Eu a fito, sentindo um misto de emoções me corroer. Quero abraça-la, beijá-la, quero sumir desta sala, para que ela não me veja assim... Mas apesar do seu traje do tordo cobrir quase todo seu corpo, ainda é possível ver marcas em seu corpo. Ainda mais profundas que as minhas.

A Esperança - Peeta MellarkOnde histórias criam vida. Descubra agora