Capítulo 18

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- Peeta, você pode ficar comigo? - Katniss pergunta, com os olhos marejados.

- Sempre - sussurro, e envolvo seu corpo em meus braços.

E de repente, sou tirado de perto dela, sugado para um abismo, sentindo o ar sendo sugado do meu corpo, as dores, o medo, e principalmente a raiva. Abro meus olhos.

Johanna está ao lado da minha cama, e mais além vejo Haymitch em pé, olhando para o chão. Então me lembro de tudo. Da capital, distrito treze, Cinna, Moira.. As memórias vêm como uma enxurrada toda vez que acordo. Quero falar, mas há um tubo dentro da minha garganta, e quando tento dizer algo, sai apenas um grunhido, alto o suficiente para captar a tenção do meu velho mentor, traidor.

- Bem vindo de volta - ele diz, mas sem a expressão travessa, costumeira em seu olhar. Ele se aproxima da minha cama, e pelo modo como se movimenta, claramente sente dores.

Movo minhas mãos na tentativa de tirar o tubo em minha garganta, para poder perguntar o que aconteceu, mas para minha surpresa, o metal gelado machuca meus pulsos. Estou com algemas agora, não simples amarras. Johanna me olha intensamente com uma expressão indecifrável. Ela parece ainda mais magra que da última vez que a vi.

- Aquela médica sonsa falou para não contarmos nada a ele, mas dane-se o que ela pensa, ele tem que saber o que aconteceu - Johanna diz, extremamente irritada.

- Tenho que concordar com você - Haymitch diz, pesaroso. - A questão Peeta, é que eu te contei uma coisa. Muito grave e você...

A frase morre. E eu o que? Quero gritar. Mas antes que eu possa tentar protestar, Johanna como era de se esperar acaba com a enrolação.

- E você surtou - ela berra. - Não um surto qualquer... Você surtou mesmo. Você arrebentou aquelas cordas que te amarravam, e teria matado Haymitch se não fosse o batalhão inteiro daqui te segurar.

Estou confuso. Minha cabeça começa a doer. Porque eu quase matei Haymitch? Porque eu faria isso? Não consigo me imaginar machucando ninguém. Meu desejo de vingança se resume apenas a Katniss. Haymitch parece ler meus pensamentos. Ele se senta na beira da minha cama, ao lado de Johanna.

- Eu te contei o que havia acontecido com Katniss. E você, veio para cima de mim, como um louco. Me jogava contra a parede, gritando para eu dizer que era tudo mentira, que Katniss estava bem e aqui. Mas...

- Mas depois - Johanna interrompe, mis exasperada que nunca - você começou a chorar, e a socar Haymitch dizendo que era você quem devia matar ela. Que ela não podia morrer a não ser por suas mãos. Aí veio todo mundo, te separou de Haymitch, aquela sonsa te sedou até quase não restar mais remédios nesse lugar, e você quase entrou em coma por causa disso, mas agora está supostamente bem.

O silencio paira, a não ser pelo bipe calmo demais do meu coração no monitor. O mesmo barulho que ele fazia na capital. Eu ainda sou o mesmo. Não? Ou os dias amargos que eu jamais esquecerei me mudaram de uma maneira irreversível?

- Louco não? - Johanna diz, menos agressiva - surtar com o medo de perder uma pessoa, e depois esse mesmo medo se transformar em medo de não poder matá-la com as próprias mãos.

Haymitch apoia a cabeça nas mãos. Suas mãos tremem. Ele estava sóbrio nas vezes em que o vi, inclusive agora. Pobre Haymitch. Eu devo estar louco mesmo. A capital deve ter feito um estrago permanente em mim. Pois mesmo todos dizendo o quão mal estou, mesmo todos afirmando que Katniss não é um monstro, e pior que eu amei ela, e que de certa forma ela me amava também, eu não consigo controlar o impulso de querer vê-la sofrer. E não consigo também controlar as lágrimas ao lembrar da notícia de Haymitch. Ao lembrar do fato de ela estar em algum lugar, ferida. Talvez morrendo. Talvez morta. Eu gostaria de saber...

Johanna habilidosamente ajeita a quantidade de remédios fluindo para meu corpo. Ela aumenta as doses, fazendo com que eu fique imediatamente sonolento.

- Durma mais um pouco, docinho - ela diz afetuosamente.

Lanço um último olhar para Haymitch, e espero que ele possa ler nele, meu pedido de desculpas, por tê-lo machucado mesmo que uma única vez.

A Esperança - Peeta MellarkOnde histórias criam vida. Descubra agora