Capítulo 43

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- É uma realidade que parece um soco no estômago – Katie contou para a mãe enquanto falava sobre a Ucrânia. – As pessoas falam muito sobre isso aí na América, mas a verdade é que ninguém sabe muito bem como é viver assim, ver de perto.

Addison estava em horário de almoço, comendo sozinha na cozinha. Tinha colocado o celular apoiado em um copo para que pudesse comer enquanto conversava com a filha. Nos últimos meses seus relacionamentos tinham sido tão virtuais, que ela já estava acostumada a viver com aquele celular a sua frente.

- Eles não estão respeitando nenhum acordo diplomático. As pessoas precisam ficar se escondendo em todos os lugares. Imagina só... Pessoas que sempre tiveram suas vidas, suas próprias casas, tendo que deixar tudo para se esconder nos metrôs – ela continuou. – Os metrôs se transformaram em hospitais! Tem médicos sendo obrigados a fazer até cesárias nos metrôs enquanto o bombardeio acontece lá fora.

- Meu Deus, Katie. Você está participando disso? – Addison perguntou, depois de engolir o que estava mastigando. – Você disse que você não ia pra Ucrânia.

- Não. Eu atendo os pacientes que conseguem cruzar as fronteiras e chegam aqui como refugiados. É cada história que eu ouço, mãe. Às vezes eu nem consigo dormir pensando nisso.

- Eu imagino.

Jake entrou na cozinha e Addison sentiu um arrepio passando no corpo, como sempre sentia quando ele estava por perto, mas naquele dia em especial porque Katie estava na ligação. Ela não percebeu que alguém tinha chegado e continuou falando.

- Outro dia eu atendi uma criança, uma menina que atravessou a fronteira sozinha porque os pais mandaram. Eles queriam que pelo menos ela tivesse a chance de viver em um lugar com segurança, mas a coitada estava completamente perdida. Eu fiquei pensando se eles não se arrependeram depois.

- E-Eles podem ter se arrependido.

- Como é que se larga uma criança assim sozinha no mundo?

- As pessoas fazem coisas inexplicáveis para tentar proteger os filhos – a mãe tentou justificar.

- Nas eu não sei se isso é proteger. Eu mesma ia preferir morrer com você do que ser largada em um lugar seguro sozinha. Eu acho que essa garota também preferia.

- Eu sei, mas deve ser uma posição complicada demais para que as pessoas pensem racionalmente.

- É. Pode apostar que sim

Addison percebeu que a filha desviou o olhar da tela e movimentou a cabeça para alguém como se estivesse assentindo. Havia a diferença de horário entre elas, então sempre que Addison estava almoçando, – que era quando tinha um tempo realmente livre para falar com qualquer pessoa, – Katie estava indo dormir. Então imaginava que a filha não estaria no trabalho àquela hora. Quem quer que fosse, estava com ela em outro lugar.

- Você está ocupada? – perguntou.

- Não

- Você está acompanhada?

- O Matthew está aqui comigo – Katie respondeu.

A mãe arqueou as sobrancelhas.

- Katie, o que você está arrumando pra sua vida? – questionou em uma voz baixa.

- O quê?

- Esse rapaz não é casado?

- Não, mãe. Ele não é.

Ela se deu conta de que Jake ainda estava lá e ficou sem jeito.

- Eu acho melhor a gente conversar outra hora, não é?

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