5. I'm Getting Tired of Me

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"As folhas ficarão marrons quando deixarem de ser verdes

Eles vão cair no chão quando se cansarem da árvore

Mas não há para onde ir quando estou ficando cansada de mim"

I'm Getting Tired of Me - Kings Elliot

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Naquele final de tarde, Cecília caminhava pelas ruas com um peso em seu peito. Respirar era difícil, e ela de repente se sentia sufocada.

"Se continuar se atrasando, ficará com o menor papel na peça", "Não irei colocar alguém que se atrasa no papel principal", "Tente se esforçar mais". Essas foram as palavras de seu instrutor naquele dia, que não ficou satisfeito com seus oito minutos de atraso. Embora quase nunca se atrasasse para as aulas e ensaios, isso nunca seria levado em conta. Imprevistos acontecem, mas, assim como ela, nunca eram compreendidos.

Mas o pior de tudo era ver os outros conseguirem fazer o que ela sentia ser incapaz de realizar. Devido aos seus medos, inseguranças e autoestima baixa, ela permanecia estagnada, sem saber o que fazer ou dizer.

E havia os olhares, os malditos olhares! Por que sempre sentia que todos falavam mal dela e a odiavam? Bastava um simples olhar estranho de algum de seus colegas, e Cecília já achava que tinha cometido um erro enorme, que fora completamente ridícula e que seu lugar não era ali.

Afinal, onde era mesmo o seu lugar?

Ela continuou andando, tentando pensar apenas em chegar em casa, onde poderia tomar um banho quente, espantar aqueles pensamentos e, finalmente, poder deitar em sua cama.

Mas, no final, estaria sozinha e vazia, como em todas as outras noites naquela cidade fria.

Cecília já estava na rua do distrito comercial, olhando para o reflexo dos lampiões das pequenas lâmpadas no chão. Ao passar pela livraria, seus passos se cessaram pela primeira vez desde que saíra pela porta dos fundos do teatro. Ela ficou de frente para o estabelecimento e olhou seu interior pelo vidro, e se perguntou se um certo alguém estaria ali naquele momento.

Ele. Cecília sentiu o rosto esquentar ao lembrar do que acontecera na última vez em que esteve naquele lugar, na semana passada. Tinha esbarrado nele e quase dado com o rosto no peito daquele homem! E, para piorar, fora embora sem nem se desculpar direito. Sentia-se a pior das desastradas e idiotas quando pensava naquela cena. Estivera tão perto dele, e tudo o que conseguiu foi agir daquela maneira.

Mas de que importava? Ele provavelmente não se lembrava mais daquilo. Ela era irrelevante demais e uma completa desconhecida para que ele sequer se importasse. Tudo o que queria naquele momento era uma fuga de tudo de desastroso que ocorrera naquele dia, e aquele lugar à sua frente era o único capaz de levá-la para outro mundo. Cecília deu uma pequena espiada e, quando percebeu que talvez aquele rapaz nem estivesse ali, entrou na livraria.

Foi para o mesmo canto de sempre, escondido e com uma visão da rua lá fora, sentada na mesma poltrona confortável, com o mesmo livro que já lia há quase dois meses. Ela abriu o livro, que sempre estava marcado na última página que ela lera.

Ainda achava estranho como alguém com mais condições que ela nunca aparecia para levar aquele livro embora, ou em como as pessoas que passavam por ali nem mesmo o manuseavam e tiravam o marcador de onde ela deixara. Talvez, pelo menos naquilo, ela estivesse com alguma sorte.

Mas, naquele dia, Cecília não conseguia ler. Seus olhos pousavam nas letras e tentavam se concentrar naquelas palavras, mas ela se sentia incapaz de entrar naquela história. Ela tentou, e tentou, mas nada daquilo parecia ter sentido. Até que seu olhar se voltou para a rua lá fora, e ela ficou ainda mais pensativa.

Todas aquelas pessoas, por que todas pareciam mais felizes que ela? Aqueles casais juntos. Crianças de mãos dadas com os pais. Amigos reunidos. Todos rindo, divertindo-se. Era mais uma daquelas vezes em que ela desejava estar no lugar dessas pessoas.

Porém, quanto mais olhava para aquelas pessoas, mais incapaz sentia-se de ter o que elas possuíam. Não conseguia mais imaginar um futuro em que ela conseguiria ter algum sucesso com o que queria, e também não parecia ser alguém capaz de ser amada um dia. Observar aquelas pessoas começava a se tornar uma tortura, pois nunca teria um terço daqueles momentos em sua vida. Sentia-se desprezível, a pior pessoa do mundo para tudo e todos.

A famosa Síndrome do Impostor, talvez fosse o que estivesse sentindo no momento. Como poderia fugir daqueles pensamentos? Como fugir para qualquer lugar, quando o problema era ela mesma?

Ela pegou o celular para ver a hora, e acabou se decepcionando mais uma vez ao ver que não havia nenhuma notificação. Sim, estava sozinha, completamente sozinha. Não era carência e nem exagero, ela realmente não podia contar com mais ninguém além de si mesma.

Naquele canto, como em todos os outros lugares, ninguém a via. Ela era invisível, sempre fora, sempre seria.

Eu quero fugir de mim mesma, pensou, enquanto olhava para nada em específico no celular, com o livro ainda aberto em seu colo. Não consigo fugir de mim.

━━ Olá? ━━ ela jurou ter escutado uma voz, baixa e bem perto dela. Apesar de não ter pulado de susto, sentiu seu coração bater mais rápido. Será que estava ouvindo coisas?

━━ Oi? ━━ ouviu a voz novamente, um pouco mais alta.

Alguém realmente falou com ela e, quando levantou o rosto, Cecília deparou-se com um par de olhos verdes olhando diretamente para ela.

Naquele momento, as batidas de seu coração ficaram mais fracas, prestes a parar.

The Bookstore | Matt SmithOnde histórias criam vida. Descubra agora