Capítulo 23 - Pai e filha

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Laura rapidamente mudou algumas coisas no Engelfreund, de modo a ficar mais a seu gosto e conforto, afinal, era um Brasília 23 pés, um barco relativamente pequeno. Instalei uma nova ducha externa e troquei o porta-pote, já que o anterior simplesmente quebrou.

Com sanitário e o chuveiro prontos, o fogão de duas bocas que improvisei no lugar do original daria conta. Também adicionei um cooler que comprei, maior e alimentado por uma placa solar montada no pequeno rack na popa.

Havia preparado tudo para que não precisássemos ter que ficar voltando até a náutica para reabastecer o barco. Dezembro não é uma época totalmente boa, afinal, as tempestades de fim de tarde são sempre uma preocupação na região.

Ensinei à Laura mais dos fundamentos da vela, torcendo no fundo, para que ela um dia tenha seu próprio barco. Minha paixão pela vela veio do Sargento Branco e da saudade de minha velha casa, onde Elisa, minha mãe, tantas vezes me pedia para não subir naquele Paturi 16 pés.

Laura tinha a felicidade estampada no rosto e ria mesmo quando as coisas iam mal, como na noite que começou a pingar água sobre a cama triangular da proa. Fiquei furioso porque havia arrumado o problema e testado várias vezes, mas na primeira tempestade, parecia uma torneira.

Eu com raiva e ela adorando tudo aquilo, uma verdadeira diversão. Fiquei chateado inicialmente, mas todo aquele encantamento dela me conquistou e passei a não ligar tanto para os problemas. Balde aqui, pano ali, enfim, noites de tempestade eram assim, "divertidas".

Enquanto os primeiros dias foram ótimos com Laura, pelo smartphone, soube que não foram tão bons para Andrea. A ruiva me bloqueou no aplicativo de mensagens, mas Eloísa teve a conversa que tanto precisava com a mãe. Brigaram feio, segundo ela, mas no final fizeram as pazes.

A filha prometeu que não teria mais nada comigo, ainda que secretamente mantivéssemos contato. Já Andrea, não disse o que faria em relação a mim e, por ora, não me preocupei. Comemorei o Natal com minha "pequena" a bordo, assim como vimos as luzes dos fogos do Réveillon, na Represa de Guarapiranga.

A vida a bordo com Laura foi boa até certo ponto. A garota fazia o almoço e eu o jantar. Brincávamos muito e passávamos horas com jogos de tabuleiro ou contando histórias. Estes momentos eram os mais importantes, especialmente quando ela falava sobre a mãe.

— Ela ainda chora escondido, eu sei.

— O que ela tem feito para passar esses momentos ruins, filha?

— Pai, ela fica lendo muitos livros e, às vezes, eu a ouço soluçar.

— Livros de quê?

— Romances, basicamente. Mas, não fica apenas nisso. Passa horas vendo séries românticas na internet e também chora... Fica muito tempo no quarto quando faz isso, mas é só eu entrar que a "doutora" disfarça.

Ainda que tenha me deixado, nutria por Diana o mesmo amor de antes e isso me entristeceu. Imaginar que, em casa, ela poderia estar afundada na cama, jorrando lágrimas de tristeza, me doía muito. Enquanto Laura falava, minha mente se perdia...

— Pai? Tudo bem? Olhe, não vou mais ficar falando da mamãe, tá? O senhor fica ruim e quero vê-lo bem.

— Desculpe, filha, mas a culpa é toda minha. Era para agora estarmos os três aqui. Não! Os quatro, pois, amo muito sua irmã, a minha "Deusa do Ébano".

Laura sorriu e aproveitou a deixa.

— Então, Diana é uma deusa. Leonor é uma deusa. E eu? Sou deusa do quê?

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