Capítulo 4

152 21 2
                                    

Mesmo exausta da noite anterior, fui obrigada a participar no café da manhã. Sônia me acordou às sete e meia, porque o José teve uma ótima ideia de reunir toda família e é claro parabenizar o nosso sucesso, que está em todas as revistas possíveis, até o William Bonner comentou sobre a virada do ano na TV. E obviamente deixou o papai feliz, adoro estampar um sorriso nos seus lábios, assim, mais limite no meu cartão de crédito. Agora, ele está segurando um jornal, e adivinha quem está na capa? Eu.

Pegaram um ótimo ângulo no meu rosto, estou mais magra. A foto mostra eu e o Heitor sorrindo um para o outro, parecendo um casal apaixonado. Até esqueci o deslize do Heitor com a Maria Cecília, ele é homem e ela é uma adolescente, acontece. Porém, à noite anterior me deixou com uma dúvida: O que aconteceu entre Gael e eu? Nunca fui assim, toda derretida pelo um homem mais velho, Heitor é uma exceção, sempre tive um propósito da minha vida. Casar virgem com o homem dos meus sonhos, entrar numa família que tem o mesmo padrão da minha, ter filhos bonitos e ser uma esposa exemplar.

Mas, aquele homem, Gael Miller. Abalou todas as minhas estruturas que construí há anos, construindo basicamente uma fortaleza ao meu redor. Só bastava uma noite, uma dança e um minuto e meio para desmoronar tudo numa vez só, e só deixar as incertezas no meu coração. Talvez eu não esteja no comando, sempre controlo tudo. Talvez seja uma ilusão.

— Ontem a festa foi muito boa! — Comenta Miguel, olhando discretamente para Ana Clara, está com a cabeça baixa e com as mãos juntas. Esta garota só tem cara de santa mesmo

Papai vai adorar quando souber disso, ou Sônia, quando souber que a sua adorável filha está envolvida com o filho do seu patrão. Será que os dois tiveram algo bastante íntimo? Algo que envolvesse as suas genitálias? Olhando para Ana Clara, uma sujeita cafona, na hipótese ela esperando um filho? Aposto que o papai esmagaria essa criança com os próprios punhos.

— Ótimo trabalho, Rafaella! Está em todos os jornais a sua festa, como sempre, me surpreendendo com as suas ideias inovadoras. — Papai elogiou dobrando o jornal, seu olhar cruzou com a Maria Cecília — E você também, Maria. Recebi só elogios vindo da Luíza, acho que ela gostou bastante de você.

Maria Cecília se endireitou na cadeira. Abriu um sorriso, as suas bochechas ruborizaram. Recebendo pela primeira vez o elogio vindo dele, ao invés de insultos ou cintadas.

— Obrigada, papai!

— Ao falar do Heitor, Rafaella, ele quer falar com você. Talvez marque um encontro, é claro, conforme com as minhas regras. Você é uma mulher de direita.

— É sério mesmo? - Miguel sorriu. — Sabiam que no exterior as mulheres podem namorar sem os pais supervisionarem? Ou fazer sexo?

— Miguel, meu querido! O Brasil é um país patriarcado, as coisas são assim mesmo — Digo — E o papai está certo, sou uma jovem de família, e preciso me comportar, o que as pessoas vão achar de mim? Que sou uma pessoa promíscua?

— Como sempre sendo uma boa filha para José Cavalcanti — Debochou — Rafaella Cavalcanti é um exemplo para as meninas jovens.

— Ao contrário de você, seu imundo. Tenho que seguir as regras, aqui em casa têm regras estabelecidas.

— Chega vocês dois, Rafaella, por favor. Não se exalte, você tem dor de cabeça quando está nervosa.

— Como sempre fica ao lado da sua adorável filha, porque não diz logo que prefere Rafaella ao invés de mim ou da Maria Cecília!? — Levantou-se na cadeira.

— Todos esses anos você ainda precisa de provas? — Maria Cecília começou a sorrir. — Ela roubou tudo, até a paquera da irmã.

Não aguento mais, me levanto, saio apressadamente. Só escuto suplico do meu pai para voltar à mesa, vou pro meu quarto, preciso espairecer e respirar algo puro, esta casa parece mais um hospício. Nunca tive uma manhã agradável com aqueles dois, sempre o mesmo assunto. José prefere uma filha. É claro, Miguel bebe, fuma e beija a filha da empregada às escondidas e a Maria Cecília bebe, fuma e faz sexo com caras mais velhos. E depois reclamam o motivo do papai desprezar tantos eles. Só faz merda o tempo todo, e eu? Tenho que segurar a barra, papai tem só a mim para se orgulhar.

Pego a bolsa e a chave do carro, na garagem peguei o conversível vermelho. Ganhei de presente no ano passado quando fiz dezoito anos, saio da propriedade particular. O vento beijava os meus cabelos, ah, é tão bom ser livre, as ruas estão sujas por causa da comemoração de ontem. Algumas pessoas desconhecidas estão deitadas nas calçadas, e outras vomitando, nojento, com toda essa gente reconheci a minha melhor amiga de longe. A sua cabeleira ruiva destacava dos demais.

Estacionei o carro ao lado dela, a mesma estava sentada ao lado da estátua de bronze. A sua aparência está horrível, o rímel borrado, a sua blusa branca suja possivelmente do seu próprio vômito e areia nos seus pés.

— Bianca — A chamo.

Levantou a cabeça.

— Rafaella? Que diabos... — Parou de falar, jogou o seu corpo para frente e começou a vomitar.

As pessoas estão no seu mundo próprio e nem repara da garota ruiva vomitando até as tripas, fui obrigada a sair do carro, com nojo e enjoada do cheiro que estava vindo do seu corpo, sentei ao seu lado. Com as pontas dos dedos toquei nos seus ombros nus.

— Você devia parar de beber, essas coisas fazem mal ao corpo. Agora essas substâncias tóxicas estão percorrendo a sua corrente sanguínea.

Bianca levantou a cabeça, limpou a boca suja com o dorso da sua mão e sorriu.

— Só menininhas ricas conseguem falar desse jeito, "Agora essas substâncias tóxicas estão percorrendo a sua corrente sanguínea"- Me imitou. — Você parece uma velha, Rafaella. Ah propósito, feliz Ano Novo, e desse ano, divirta-se.

Apoiou a sua cabeça em meu ombro. Abracei o seu corpo, mesmo sujo e fedido. Bianca e eu somos amigas desde sempre, filha única de pais diplomáticos. Assim como eu, somos uma figura pública, crescemos rodeadas sob as lentes das câmeras. Somos diferentes, ao contrário de mim, Bianca tem mais liberdade de expressar.

— Vamos para casa! — Joguei o seu braço no meu pescoço — Nossa, você está gorda.

Resmungou totalmente desmaiada. Com muito custo a sentei no banco de trás, acaso ela vomite em mim. Sair do estacionamento proibido, por sorte, a sua tia mora no mesmo condomínio onde vivo. Uma hora depois, cheguei em casa, a empregada me ajudou a levá-la para dentro. A deitei na sua cama, respirei um pouco, Bianca está realmente precisando emagrecer.

— Não quero! — Choraminga ainda dormindo.

Ignorei, tirei o seu short curto e depois a sua blusa, no banheiro peguei uma vasilha de água e um pano seco, então comecei mais ou menos lavá-la. Chorou no início, mas logo depois se acalmou. A ruiva tem duas tatuagens, no braço e na barriga.

— Rafaella! — A sua tia entrou no quarto — O seu pai está te procurando.

—Já vou! E como ele soube que eu estou aqui?

— Ele te viu por acaso.

Os olhos de Teresa caíram sob a sua sobrinha, e fez uma expressão feia.

— Essa menina não tem jeito. — Negou com a cabeça e saiu do quarto.

A sós, fiz todo o trabalho, tenho experiência nesse tipo de situação. Perdi as contas quantas vezes eu limpei e cuidei da Maria Cecília, encontrada no jardim quase nua e bêbada, um desperdício de juventude. Bianca e Maria Cecília dão a mesma proporção de trabalho. Dez minutos depois, acabei, fui acalmar os meus ânimos e acabei de cuidar de uma inconsequente, uma situação bastante aleatória.



ESPOSA PERFEITA - LIVRO 1Onde histórias criam vida. Descubra agora