Capítulo 10

18 4 0
                                    

Julia não conseguia entender a energia que emanava de Alice. Talvez essa percepção desse a ideia de que ela acreditava na energia do universo ou coisas do tipo, a verdade é que não, Julia é uma das pessoas mais céticas que ela conhece. Para ela, a energia que as pessoas passavam estava relacionada ao sentimento direcionado a outra pessoa no ambiente.

Como só estavam as duas na cozinha, a sensação que Alice dava a Julia era de que o ambiente não a agradava. Pelo menos Julia se convenceu de que o problema era o ambiente, elas não se conheciam para já existir algum tipo de inimizade, logo, o problema só podia ser a casa.

Né?

O café estava bom, ajudou um pouco com a ressaca, se bem que com a noite mal dormida Julia sentia que todo o álcool já havia deixado seu corpo. A xícara de café também permitia que ela escondesse o rosto da análise constante de Alice. Um fato interessante: apesar de ser paga para analisar outras pessoas, Julia tinha pânico de ser analisada, ela sabia que isso estava relacionado com a sua insegurança na vida pessoal, na sua incapacidade de formar laços sociais importantes havia muito tempo e, em última instância, na sua timidez paralisante em frente a desconhecidos.

Ela pensava que se fizesse um pouco mais de esforço poderia ser diagnosticada como agorafóbica. Julia sabia que esse tipo de pensamento era errado, ninguém se esforça para ter alguma condição mental atípica, de fato o trabalho dela era dar apoio para aquelas pessoas com condições mentais adversas que queriam melhorar. Mesmo assim o pensamento a tranquilizava, em seus melhores dias até a fazia rir.

Hoje não era um dos seus melhores dias e algo lhe dizia que iria demorar até ter outro desses. Ela terminou o café e foi para a frente da televisão. "Se algo muito estranho acontecer, a gente deve ficar de olho nas notícias que surgem, se não nos derem uma resposta pelo menos vão nos atualizar", era o que os pais de Paulo haviam ensinado a ele e ele, a ela.

Ela não conseguia se concentrar completamente, estar naquele ambiente, definitivamente não um ambiente novo para ela, mas certamente um que ela já não estava mais acostumada a ver. E para piorar, tinha a sensação de que não era bem-vinda.

Os canais exibiam programas de notícias continuamente, ninguém precisa de intervalos comerciais em uma condição que definitivamente traumatizou e feriu muitos na noite anterior. Tudo o que as pessoas queriam era informação. O que aconteceu? Um terremoto, mas por quê? Como? Quais partes da cidade ou do estado foram atingidas? Quantas pessoas foram feridas ou morreram por causa de acidentes decorrentes do tremor?

O problema de todos os noticiários era que os apresentadores aparentavam estar tão em pânico quanto as pessoas para quem eles deviam passar as informações, alguns tremiam tanto na frente das câmeras que Julia cogitou que alguns deles sofriam de medo do palco (que é claro não se restringe aos palcos e sim se refere a qualquer profissão que envolva ser o centro das atenções), outros gaguejavam e outros pareciam tão surpresos com as notícias que recebiam pelos teleprompters ou pelos pontos que ficavam incapazes de transmitir as notícias.

Depois de navegar entre vários canais, Julia conseguiu responder algumas das perguntas e chegou até mesmo a anotá-las em um papel que pegou de um bloco de anotações para mostrar para Paulo depois que ele acordasse. Ela escreveu: "Todos concordam que foi, de fato, um terremoto (o que pode parecer redundante mas o que ela quis dizer foi que ninguém havia jogado teorias da conspiração em rede nacional), Não existe uma confirmação científica de uma possível causa. Várias cidades de diversas partes do país relataram a mesma coisa, o que significa que não foi um evento isolado; por causa disso o número total de feridos e de óbitos é quase impossível de confirmar no momento, mas com toda certeza é alto".

Tentando se distrair um pouco depois de fazer suas anotações, Julia mudou para os canais internacionais, notícias diferentes talvez dessem um ânimo extra. O que ela viu não a tranquilizou, na verdade piorou consideravelmente seu nível de estresse e ela começou a roer as unhas, um hábito que ela havia largado há pelo menos quatro anos, muito antes de seu término com Paulo.

Paulo! Não posso esperar ele acordar, preciso mostrar para ele o que está acontecendo, ele vai saber o que fazer. Eu espero.

Te vejo no fim do mundoOnde histórias criam vida. Descubra agora