Capítulo 52

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Julia não conseguia se concentrar em nenhuma tarefa que se impunha, a imagem do cadáver não saia de sua cabeça e voltava sempre que fechava os olhos. A visão de Paulo trabalhando arduamente na busca de uma cura para aquele fungo demoníaco a ajudava de vez em quando, no entanto era cada vez mais difícil ter o menor contato com o ex-namorado, que passava cada vez mais tempo no laboratório improvisado no porão.

Não que isso seja ruim, quanto mais tempo ele passar trabalhando nisso, mais rápido ele pode descobrir alguma coisa e mais rápido nós poderemos voltar à nossa vida normal. Que até ontem de manhã não era nem mesmo uma possibilidade remota.

Era o que ela pensava para si mesma, como forma de incentivo para não deixar que sua cabeça parasse de funcionar como deveria. Afinal, qualquer um na sua situação poderia simplesmente entrar em estado catatônico e esperar a morte.

A vida que estavam levando fez Julia se sentir mais isolada do que em todo o último ano que tinha passado trancada em seu apartamento sem nenhuma outra companhia humana. Ali ela era menos do que a dona de seu próprio espaço, era o resultado de uma promessa feita em momentos de sentimentos fortes e também se tornou praticamente uma dona de casa da década de 1950. Sua função era basicamente cuidar da casa e do preparo de alimentos.

Não que Paulo tenha me colocado nesta situação, que poderia ser considerada de trabalho escravo apenas alguns meses atrás. Eu estou fazendo isso por vontade própria, afinal, se eu não preparar a comida, nenhum de nós dois se alimenta direito.

Mesmo dizendo isso para si mesma pelo menos uma vez por semana, a tentativa de auto ajuda não era suficiente. Ela continuava se sentindo apenas uma perda de espaço, um conjunto de células que não vivem, apenas sobrevivem.

A situação parecia melhor no começo de cada novo dia, quando ela via Paulo se preparar para descer para o porão, colocando um macacão por cima do pijama. Naqueles momentos ela tinha a impressão de que Paulo gastava mais tempo ali em cima para lhe fazer companhia, e ela se sentia grata pela boa intenção.

Houve até um dia em que Paulo saiu do quarto carregando um segundo macacão e o estendeu perguntando se ela gostaria de lhe fazer companhia no laboratório. Julia porém, viu algo além de uma simples oferta, imaginou que por melhor que fossem as intenções do ex namorado, sua presença pudesse atrapalhar o andamento do trabalho de alguma forma. Por isso ela recusou a oferta.

E os seus dias continuaram os mesmos por semanas a perder de vista. Cozinhava, fazia companhia para Paulo e tentava se concentrar nas menores tarefas como atender seus poucos pacientes que ainda entravam em contato.

Te vejo no fim do mundoOnde histórias criam vida. Descubra agora