Capítulo 6

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O livro contava a história de uma princesa amaldiçoada

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O livro contava a história de uma princesa amaldiçoada. Quando o sol sumia no horizonte, a princesa se transformava em uma besta escamosa cuspidora de fogo... um dragão. Devido à maldição, ela foi banida para viver sozinha em um castelo em ruínas na fronteira do reino. Certo dia, a princesa amaldiçoada caminhava pela floresta que circundava o castelo, quando encontrou um jovem sendo perseguido. Sem hesitar, ela guiou o rapaz para longe dos perseguidores.

O belo rapaz, agradecido, prometeu para ela que a recompensaria quando pudesse, já que no momento ele não tinha nada para oferecer além de sua companhia. Ele era o príncipe do reino vizinho e estava sendo perseguido pelo próprio irmão que queria o trono para si. Comovida com a situação do príncipe, a princesa ofereceu refúgio para ele. Sem ter para onde ir, o príncipe aceitou a oferta.

Mas ele se arrependeu assim que a noite caiu, transformando a bela princesa em um dragão. Contra todas as expectativas do príncipe, o dragão não lhe fez mal. Assim os dias passaram e uma amizade cresceu entre eles, até o dia que os apoiadores do príncipe apareceram. Com o coração partido, o príncipe foi levado pelos seus súditos para reivindicar o trono, mas sem antes prometer para a garota que voltaria assim que conquistasse o trono e que quebraria sua maldição. Sem o príncipe, os dias da princesa passaram como um borrão monótono e vazio. Ela sentia falta da companhia de seu único amigo. O único que a viu além da maldição. O único que a viu de verdade.

Quando o príncipe não voltou, ela se sentiu abandonada e afundou em um poço sem fim de tristeza e melancolia. Mas ao contrário do que a garota pensava, o príncipe não desistiu dela. Ele abandonou a corte e foi atrás do bruxo que a amaldiçoou. O bruxo disse: a filha de um rei soberbo e mimado foi criada para ser uma besta cuspidora de fogo. A maldição consumirá seu coração que nunca aprendeu a dividir e a amar, pois é impossível amar uma criatura tão odiosa.

O príncipe não entendeu as palavras do bruxo e suplicou para ele libertar a princesa. Ela podia ter sido soberba e mimada no passado, mas a princesa que ele conheceu era uma garota que conseguia ver a dor dos outros, como ela viu a dor do príncipe e o acolheu. Quando o bruxo se recusou a tirar a maldição, o jovem matou o bruxo e voltou para o castelo da princesa decepcionado e sem esperanças de quebrar a maldição...

O final? Qual era mesmo?

Eu não conseguia me lembrar. Mas eu lembrava que eu sempre gostei do livro por não ser um típico conto de fadas onde a princesa se apaixona por um príncipe inacessível e que requer um grande sacrifício. Por que sempre as princesas tinham que se sacrificar? Por que o príncipe não podia lutar e se sacrificar pelo amor da princesa? A princesa não era digna? Só o príncipe era digno de tamanho sacrifício?

Enquanto eu tentava lembrar o final do príncipe e o dragão, a escuridão sussurrou no meu ouvido:

— Um dia... eu vou te mostrar. Você vai conhecer e experimentar tudo o que seu coração desejar.

Minha visão ficou turva com as lágrimas que encheram meus olhos. Sacudi a cabeça, forçando a voz a desaparecer.

— Tudo bem, princesa? Parecia que iria chorar. — A voz da Nadia soou como uma luz na escuridão. Me trazendo de volta para a realidade.

— Estou bem. Acho que uma fuligem entrou em meus olhos. — Sorri e sequei a umidade dos olhos na manga do vestido.

— Princesa, não fique triste. Você pode conhecer o mundo ao lado de Mikhail.

— Eu duvido. Acho que ele será tão protetor quanto meus pais — disse com a voz gélida desviando de seu olhar.

— Eu achei que você amava ele.

Soltei a sua mão.

— Eu amo ele. Eu o conheço faz tanto tempo. Mas tem uma parte minha que o inveja por toda a liberdade que ele tem. Enquanto sou velada como uma donzela intocável, ele tem liberdade para fazer coisas que nunca nem imaginei fazer. — Dei uma pausa para inspirar profundamente. — Você deveria ter ouvido o que ele falou para mim no pátio do castelo — disse com um sorriso malicioso no canto dos lábios.

Ela arqueou uma sobrancelha dourada.

— Ele não é esse tipo de homem... libertino — ela cuspiu as palavras com desprezo.

— Eu também não acho que ele seja um libertino. É só que eu não acho justo que eu tenha que me manter pura e imaculada presa nesse castelo, me guardando para um marido que provavelmente não será puro e imaculado.

— Você se importa tanto assim em ele ser puro e imaculado?

— Pelos deuses — dei uma pausa enquanto me endireitei no sofá — Não — Expulsei o pesado ar dos meus pulmões. — É esperado de Mikhail ter amantes e bastardos, enquanto é esperado de mim que eu seja submissa e obediente a ele. Eu só queria que isso não fosse esperado de mim porque claramente não é esperado dele.

— Você é uma sonhadora, princesa. Acho que está lendo muitos livros e eles colocaram ideias erradas na sua cabeça.

— É verdade, os livros estão cheios de ideias e por isso eles são as armas mais poderosas desse castelo.

— Arma poderosa? Acho que um livro não resistiria um golpe da espada do impiedoso comandante Aleksander Acheron — disse ela soltando um suspiro apaixonado.

— As ideias são a prova de qualquer arma letal, Nadia. Até do seu amado e impiedoso comandante Aleksander Acheron. Você pode rasgar o livro em pedaços, mas não pode destruir o conhecimento que ele passou para quem o leu.

Ela suspirou fundo e deu de ombros.

— Bom, princesa. Vou deixar você com suas armas letais. — disse ela rindo com escárnio enquanto apontava para as prateleiras da biblioteca. — Mas em uma hora e meia eu volto aqui para te buscar e eu não vou querer ouvir mais nenhuma desculpa para atrasar ainda mais os preparativos do casamento.

Assenti com a cabeça.

Nadia saiu da biblioteca e eu me afundei de volta no sofá macio. Mais uma vez tentei dormir e mais uma vez falhei. Pensei no casamento que seria daqui a poucas horas. Meu coração acelerava e minha respiração se tornava ofegante só de pensar em caminhar até o altar. Tentei respirar devagar, mas algo em cima do meu peito me pressionava... me sufocava. Coloquei a mão no meu peito e senti que algo faltava. E de fato faltava.

O crucifixo que ganhei de minha mãe havia sumido.

Meus pais sempre quiseram ter filhos, mas eles não conseguiam gerar. Depois de vários anos tentando, eu nasci. Meus pais já estavam com a idade avançada e consideraram aquilo um milagre. Mas a alegria não durou muito tempo quando eles perceberam que além de comida, eu também precisava de sangue para sobreviver. Por ser diferente, eu era considerada um demônio pela igreja. Um monstro. Uma aberração. Era esperado que meus pais me abandonassem à própria sorte ou até me assassinassem, mas eles não fizeram isso. Eles me amaram de maneira incondicional e fizeram de tudo para me proteger.

Na tentativa de me proteger dos rumores maldosos dos residentes do reino que começaram a me chamar de "princesa amaldiçoada" minha mãe me deu um crucifixo de prata talhado em seu comprimento as palavras amor vincit omnia - o amor vence todas as coisas. O objeto foi abençoado pelo arcebispo da Transylvania para mostrar aos residentes que eu não era um demônio.

Como poderia um demônio usar o símbolo de Deus?

Eu nunca tirava aquele crucifixo do pescoço. Eu o usava como um talismã, um amuleto, uma proteção. Era o símbolo do amor incondicional e sacrifício dos meus pais para me manter segura. Quando eu percebi que o crucifixo não estava mais no meu pescoço, me senti vulnerável como se uma parte de mim estivesse exposta.

Eu precisava achá-lo.

Trono de Sangue e RuínasOnde histórias criam vida. Descubra agora