Capítulo 25

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— Como se sente hoje?—Pergunta a senhorita Emma, a orientadora da universidade, estou sentado na cadeira frente à sua mesa e ela retira um dos caramelos do pote que está sobre a sua mesa e me oferece sorrindo, e eu nego educadamente.

— Bem.—Respondo, olhando para janela.

— Tudo bem. Então me diga como correu o seu dia? Algo aconteceu desde o nosso último encontro?—Pergunta ela, eu não sei muito bem o que ela quer de mim, mas sei o porquê de eu ter de vir aqui todos os dias depois das aulas. Devido ao ocorrido com o Alberto. Eu só não sei se eles me vêem como uma ameaça ou como vítima. Obviamente eu sou a vítima, mas penso que não é o que o Reitor da Universidade pensa, aposto. Vejo nitidamente que somos supervisionados por seguranças vestidos à paisana.

— Nada aconteceu, nada de especial, tudo continua igual.—Respondo. Olho para os seguranças pela janela, que olham para a janela também, como se estivessem a controlar algo.

— Me desculpe pelo constrangimento que temos lhe causado desde a sua chegada.—Olho para ela que pega no telefone fixo e liga para alguém.—Os seus serviços não serão mais necessários, ele não representa nenhum perigo.—Ela diz para alguém e eu olho para a janela e vejo um dos seguranças a olhar para aqui.—Sim, tenho certeza.—Desliga e volta a olhar para mim.

— Pode contar comigo sempre que tiver algum problema, ou tiver um mau dia, a minha porta está sempre aberta a todos os alunos e não se preocupe, tudo o que é dito aqui, nunca sairá daqui.—Emma diz e sorri amigavelmente.

— Obrigado.—Sorrio para ela com sinceridade.—Posso ir?—Pergunto.

— Olhe, fique com esse folheto.—Me entrega um folheto sobre pressão social, ansiedade e ataques de pânico.—Talvez possa lhe ajudar em algo, é apenas um folheto informativo, tenho vários aqui, ajuda muitos estudantes. Você passou por uma situação traumática, se tiver algum gatilho, não hesite em vir até aqui ou pedir ajuda.—Diz ela com simpatia.—Não será mais necessário vir até aqui, se não quiser. Saiba que se algo o estiver incomodando, sinta-se à-vontade para vir conversar comigo.—Ela finaliza e eu aceno com a cabeça e me levanto.

Me despeço e saio em seguida.

Fecho a porta e ando em direcção ao jardim do 'campus' universitário, me sento num banco um pouco afastado, onde tinham flores violetas. Tiro a mochila de minhas costas e permaneço apreciando o jardim e observando os outros estudantes. Às vezes sinto que estou numa vida paralela.

Algumas horas atrás, enquanto eu, Weza e Ester procurávamos os temas do nosso trabalho em grupo nos livros que requisitamos na biblioteca, eu ficava admirado por ver tantos livros, tanta informação, tantas coisas interessantes para descobrir dentro daquelas páginas. Sempre gostei muito de ler, eu gostava muito de ir até à biblioteca comunitária que tinha perto do bairro, que infelizmente foi fechada, porque a senhora que abriu ficou doente e acabou por falecer, nenhum de seus filhos se importava muito com o projecto que ela criou para as crianças e adolescentes da comunidade terem acesso à leitura e terem esse gosto por ler e assim adquirir conhecimentos e viajarem por novos mundos a partir da leitura, pelo menos era assim que eu me sentia, quando lia. Senhora Alanis era muito bondosa, lembro-me do seu sorriso maternal sempre que pego nalgum livro para ler.

— Olá Akin!—Meus pensamentos são interrompidos, por uma voz doce que me cumprimenta de forma simpática.—Posso sentar-me?—Pergunta Zuri educadamente.

— Olá Zuri.—Cumprimento olhando para ela.—Claro.—Sorrio para ela de maneira educada.

Ela se senta e olha para as flores violetas também.

— Parece que gostas muito de estar perto da natureza, não é? É a segunda vez que te encontro num lugar afastado observando as coisas à tua volta.—Ela diz com um sorriso e continua a olhar para mim, de forma curiosa.

— Eu gosto. Ficar quieto a observar a natureza... Onde quer que seja, me transmite paz.—Respondo, continuando a olhar para as flores do jardim.

— Eu quero-te pedir desculpas...—Ela começa a dizer e eu não entendo porque é que ela se desculpa. — Naquele dia no parque de Maré de Braz, eu juro que não queria te causar nenhum problema! Eu não posso imaginar o que sentiste naquele momento, desculpa por ter te submetido a um tratamento tão hostil da parte daquele oficial.—Diz ela com sinceridade e eu arqueio as sobrancelhas em surpresa.

— Ah! Tudo bem... Já foi há muito tempo.—Digo para ela a sorrir.—Não precisa se desculpar.—Ela sorri para mim e eu sinto um leve frio na barriga, seu olhar às vezes me deixava intrigado.

— Como se sente estudando aqui? Deve ser difícil estar longe de casa não é?—Ela me pergunta.

— É difícil sim, tenho saudades da minha família todos os dias. Cantilhena também é uma cidade muito diferente de Maré de Braz. Eu até que gosto de estudar aqui. Nunca imaginei que pudesse estar aqui. Fazia muito tempo que eu não tinha expectativas quanto a continuar os meus estudos académicos, sendo que eu deixei de frequentar a escola, desde a 7.ª classe (7.º ano).—digo continuando a olhar para as flores, mas eu sentia o olhar dela sobre mim.

— Tu mereces estudar aqui. É realmente impressionante o facto de teres tirado uma nota excelente no exame de acesso, quase a nota máxima, em relação à muitos outros jovens que estudaram nos melhores liceus, isto só prova que a dedicação e o esforço é o que importa. — Diz ela, e eu dou um pequeno sorriso.

— Como sabes sobre a minha nota? Eu pensei que essa informação ficava apenas para nós e para a universidade...—Digo olhando para ela com curiosidade, claro que eu sei que tirei 19 valores no exame de acesso, eu fui muito elogiado pelo reitor quando cheguei e pelos professores que fizeram a correcção dos exames, disseram-me que era raro alguém tirar uma nota tão alta no exame de acesso, principalmente para alguém que não frequentava a escola.

— Ah! Ah! Bem, eu fiquei a saber porque é raro alguém tirar uma nota tão alta, sabes? Tu és uma das poucas pessoas em 5 anos. — Diz ela um pouco nervosa, mas prefiro ignorar, e mostrei um sorriso a ela.

— Bem, eu continuei a estudar, eu aproveitava a biblioteca comunitária e pedia ajuda à quem tivesse mais estudo do que eu, eu de certa forma continuei a estudar, então não é como se eu tivesse uma inteligência de outro mundo. — Digo calmamente.

— Que bom! É fácil notar que és uma rapaz nobre e de bom carácter.—Diz ela com um sorriso gentil e me deixa um pouco envergonhado.

— Obrigado Zuri. — Respondo.

— Tu és originalmente de Maré de Braz?—Pergunta ela.

— Não, eu sou de São Nicolau.—Respondo sorrindo.

— Eu já estive lá. Eu amava entrar na água da praia da serra... A temperatura da água era sempre muito agradável combinando com o clima tropical de São Nicolau.—Ela diz parecendo se recordar e eu olho para ela, a observando, eu e meu pai íamos todos os Sábados na praia da serra enquanto minha mãe preparava o almoço, a praia era bem próxima da minha casa, a nostalgia se instala dentro de mim, enquanto me lembro e vem com uma pontada no coração.

— Está tudo bem?—Pergunta Zuri, parecendo preocupada.

— Sim, eu preciso ir, até mais!—Digo e me levanto, indo em direcção à saída da Universidade.

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