Aminata andava perdida pelas ruas de São Niclau, seu vestido rasgado tinha manchas de sangue, seu rosto estava marcado pelas lágrimas escorridas, seu cabelo estava empoeirado, com um aspeto deplorável.
A jovem moça sentada no chão asfaltado, num canto escondido agora voltava a chorar, tenta levantar-se mas não obtém sucesso. Deitada de barriga pra baixo no chão, começa a arrastar seu corpo em direção à discoteca onde havia uma fila de jovens que ali esperavam para poderem ter uma noite de diversão, como sempre acontecia, os bares e as discotecas sempre estavam cheias durante a noite, principalmente numa sexta-feira.
Aminata sabia que se não tentasse pedir ajuda poderia morrer nas ruas de São Niclau, seu corpo magro estava a mercê da fadiga e da fraqueza, se tentasse dar um passo em pé, suas pernas ficavam bambas, não conseguia deslocar-se, não queria chamar a atenção das pessoas durante o dia, então escondeu-se em um beco, se esforçou para adormecer, até que caísse a noite, para que pudesse conseguir a ajuda de alguém que estivesse a passar por ali.
Notou o céu escuro, e se apercebeu que a fila era grande, tinha muita gente. Não ousava se aproximar das pessoas durante o dia, para não ser vista, seu vestido amarelo estava sujo, ela estava menstruada e tinha o cheiro impregnado em si, sentia vergonha de si mesma, por estar assim, por estar naquela situação.
Foi uma dificuldade imensa para ela o simples facto de ter que abrir os olhos, buscava adormecer para tolerar a fome que sentia, as tonturas e a dor de cabeça, mas dessa vez estava tão debilitada que quase não acordava, que quase não abria os olhos.
Aminata arrastava seu corpo com a pouca força que lhe restava e mesmo com o olhar embaçado e levantando a cabeça com dificuldade, conseguiu enxergar duas pessoas no final da fila, dois jovens que pareciam ter sua idade, uma menina e um moço. Aminata se apressou em segurar no pé direito da menina que gritou e se soltou, magoando o braço de Aminata.
—Socorro, esta louca agarrou-me o pé! —Dizia a jovem menina assustada para o seu companheiro ao lado, abraçando-o enquanto olhava irritada para Aminata.
—Acalme-se...Por f-favor eu só preciso de ajuda....—Diz Aminata com a voz baixa e com o olhar desesperado.
O jovem rapaz coloca-se frente à menina em proteção, olhando para baixo. Até que abaixa-se para olhar bem para Aminata.
—Ela está muito fraca, acho que precisa de ajuda...—Diz o jovem rapaz com pena olhando para ela e em seguida para a sua companheira.
—Israel! Afasta-te dela! Sabe-se lá de onde ela saiu, ela cheira mal!—Reclama a jovem menina com um olhar de nojo e de desprezo.
—Por f-favor...Eu-eu não sou de cá....Eu-eu só preciso de um pouco de água...só para conseguir a-aguentar a f-fome...—Aminata se esforçou imenso para falar, e já não conseguia olhar para os rostos que a olhavam.
—Moça...O seu vestido está cheio de sangue e seus braços têm feridas...Vou lhe ajudar!—Diz o jovem Rapaz preocupado com uma completa desconhecida, que precisava de ajuda.
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Abro o álbum fotográfico para ver algumas fotos de família. Quando meu pai era vivo, gostava de tirar fotos de tudo, do céu, das estrelas, do mar, da praia, das flores....De mim, de minha mãe, de Zénny, e as últimas fotos que tirou foram as de meus irmãos, de David e Pedro, quando ainda eram bebés.
Seu amor me consolava em todos os momentos, eu gostava de o ouvir a falar, quando se descobriu que ele tinha cancro, muita coisa mudou, meu pai começou a ter dores fortes e constantes no abdómen, numa das vezes em que ele me contava estórias para dormir, mesmo eu já sabendo ler, eu só queria que ele lesse para mim, porque sua voz era agradável e doce, eu olhei para seus olhos....E estavam amarelos. Eu fiquei com medo, mas não disse nada, perguntei se ele se sentia bem...E ele disse que iria ficar tudo bem, mostrou-me o sorriso carinhoso que era tão familiar para mim, deu-me um abraço apertado e deixou-me dormir. Mas eu não consegui ter uma boa noite de sono naquele dia...
Acordei mal disposto no dia seguinte, porque eu tinha descoberto a gravidade de seu estado de saúde.Toco na foto em minha mão, meu pai esboçava um sorriso radiante, não sei quantos anos eu tinha nessa foto, provavelmente menos de 5 anos, minha mãe irradiava alegria nessa foto comigo no colo e com meu pai nos abraçando e sorrindo para a câmera.
Viro a página e vejo outra foto. Meus pais quando se casaram, minha mãe estava deslumbrante com um vestido branco que parecia de princesa, segurava as duas mãos de meu pai e seu sorriso apaixonado e olhar emocionado era perceptível. Meu pai à essa altura já tinha derramado diversas lágrimas, olhava para minha mãe com uma ternura que quem vê a foto era capaz de perceber e sentir.
"Meu coração quer te amar...
Porque tu me tratas como quem ama,
Porque tu me olhas como quem ama,
Porque teu amor só tem calma.
Porque me fizeste conhecer um Deus que salva.
Porque esse mesmo Deus me entregou à ti...
E me fez uma mulher mais do que feliz.
-Para o meu amado esposo,
Meu companheiro amoroso,
Meu amado Israel Johannes."Na parte de trás da foto deles tem uma declaração de amor de minha mãe, coloco a mão no peito, recordo como minha mãe caiu no chão ajoelhada a chorar como se o mundo tivesse chegado ao seu fim, como se tudo tivesse acabado, seus olhos estavam cansados e arregalados, com as mãos sobre suas pernas, e com as lágrimas molhadas em sua blusa, chorava mas não emitia som algum, as lágrimas só caiam como água, me senti horrível, a sensação de vê-lá assim foi destruidora, era numa altura em que o estado de meu pai só se agravava.
—Oh mãe....—Digo e fecho os olhos, me lembrando do rosto dela e abro os olhos pensando em ligar para ela.
Quando me levanto para guardar o álbum fotográfico e tirar o meu telemóvel da tomada, ouço alguns toques na porta do meu quarto e me assusto. Já era final de tarde, e eu não estava a espera de ninguém. Pouso o álbum e vou abrir a porta.
Rafael a minha frente tem o rosto avermelhado e parecia cansado, e estava a chorar.
—Rafael? O que é que se passa?—Pergunto preocupado, nos últimos tempos temos criado uma boa amizade, temos mais em comum do que eu esperava. Faço-o entrar e fecho a porta a nossa atrás.
—Desculpa por te incomodar....—Diz ele sentado na poltrona que tem no canto do meu quarto ao lado da janela.
—Sem problemas, pareces abalado...Aconteceu alguma coisa?—Pergunto enquanto me sento em minha cama, olhando para ele.
—Eu....Fugi de meus colegas. Tenho os evitado a semana inteira, temos um trabalho em grupo mas eu não quero fazer o trabalho. Minhas notas nos exercícios escritos têm sido muito baixas, eu não consigo estudar e nem me concentrar....Eu estou com muitas dificuldades em fazer coisas básicas...—Rafael começa a falar e algumas lágrimas caem de seu rosto, presto atenção no que ele me diz.—Faz dias que não consigo dormir ou comer, sinto dor no corpo e...—Baixa a cabeça e começa a chorar de forma descontrolada e a soluçar.—Me sinto exausto, tentei fazer coisas que eu gosto para voltar ao meu estado normal. Mas não consigo ter vontade ou forças para fazer nada, nem mesmo o que eu gosto de fazer e agora durmo tanto que perco a hora de ir à aula, tenho faltado à muitas aulas....E tenho pensamentos de.....—Rafael interrompe sua fala cobre seu rosto com as duas mãos.
Me levanto e fico de pé ao seu lado, toco em seu ombro suavemente e seu choro começa a se regularizar.
—Eu me sinto péssimo, me sinto mal...Me sinto doente e não quero mais ficar aqui, não quero mais estar aqui. Já nem consigo mais orar.—Diz ele a chorar e eu olho para ele compreendendo-o.—Me desculpa por vir aqui e estar a chorar, eu sou um idiota mesmo....Eu sou sensível demais, meu pai tem razão sobre mim, eu não deveria agir assim.—Ele limpa as lágrimas rapidamente e se levanta abrindo um sorriso fraco para mim, e eu olho para ele de forma séria.
—Rafael...—Digo num tom de voz calmo, seguro em seus dois ombros e olho para ele amigavelmente, e falo de forma cuidadosa.—Eu acho que tu tens depressão.
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Entre Laços
SpiritualAkin nunca imaginou que sua vida tomaria o rumo que tomou, entre laços de amizade, laços familiares e laços de amor, o jovem rapaz encontra o refúgio e a força que pensou que não existisse, em Deus. Sem pensar no que Deus reservou para ele, Akin ac...