Capítulo 3

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ALFONSO

Duas semanas se passaram, e a Srta. Portilla continua tocando suas porcarias o dia todo. Há uma brecha. Eu poderia despejá-la. Sempre tem uma brecha. Mas, no momento, Anthony é o guardião dessa brecha. Sua obsessão pelo violão – a obsessão por ela – me obriga a ficar parado, quando eu deveria estar chutando a mulher para fora.

Aprendi do jeito mais difícil que não posso remover as fixações dele. Ele agora só fala sobre isso. Nos dias em que não tem aula de robótica, ele deixa a mochila no meu escritório e sobe para esperar Anahí terminar as sessões e depois eles tocam violão juntos.

E ela é ainda pior. Age como se eu não tivesse estabelecido o prazo de duas semanas.

Quando chegar a hora, vou ter de removê-la fisicamente do local.

— Está ajudando com a mudança deles? — Dalila é a rainha das perguntas aleatórias. Ela não olha para mim enquanto fala. Até onde sei, pode estar falando ao telefone, mas sei que não está. Ela é assim: horas de silêncio, depois uma pergunta que não sei responder.

— Quem?

— Vincent. Sei que está sufocando as emoções, mas seu melhor amigo vai embora e você ainda não disse uma palavra sequer sobre isso. Não me pediu para deixar a agenda livre para ajudá-los com a mudança, nem nada parecido.

— Ele vai se mudar, não "vai embora". E ele contratou uma empresa de mudanças. A vida é dele. Não minha. É assim. Pegou o arquivo dos Peterson para mim?

— Na sua mesa, a dez centímetros da sua mão. Se você se mexer, vai levar uma mordida do arquivo, porque está preocupado com a mudança do seu melhor amigo e com a nova inquilina fantástica que roubou o coração apaixonado por música do Anthony.

Fantástica. Ela tem razão. Anahí Portilla não é real. Mulheres esquisitas desse jeito só existem na fantasia. Os peitos perfeitos são a única parte real dela, uma anomalia, porque peitos perfeitos são uma fantasia, normalmente.

Preciso parar de pensar nos peitos dela.

— Vá avisar o Anthony que saio em cinco minutos.

Dalila se levanta e veste o casaco.

Eu suspiro.

— Por favor. — emendo.

— Desculpa. Já passei do meu horário. Vai ter que ir até lá e dizer você mesmo. Manda um oi para a Any por mim.

— Any?

— Diminutivo para Anahí.

— É preguiçosa demais para acrescentar o ahí?

— Para de ser tão... — Ela comprime os lábios e entorta a boca para um lado. — Você.

— Eu?

— Any é um apelido de Anahí. Da mesma forma que Poncho é um apelido para Alfonso.

Olho novamente para o computador. Ela sabe muito bem que meu nome não é Poncho. Estou cansado de reforçar a loucura dessa mulher.

— Está demitida.

— Oba! Já estava preocupada, pensei que hoje ia me deixar ir embora sem me demitir. Até segunda.

— Até. — Olho para ela com um meio sorriso, apesar de toda tortura com suas táticas.

Consegui evitar o segundo andar do prédio desde o dia em que fracassei na tentativa de despejar a Srta. Portilla. Já no elevador, minhas roupas parecem quentes demais, a gravata aperta o pescoço e minha pele sua. Acho que meu pescoço está coçando. É alergia a Anahí. Com certeza, Anthony vai entender porque preciso me livrar dela se eu conseguir mostrar alguma prova dessa alergia. Pensando bem, ele não vai. Seu nível de empatia melhorou um pouco, mas ele ainda está muito longe de se colocar no lugar de alguém.

Razões & Emoções -Adapt AyA [Finalizada]Onde histórias criam vida. Descubra agora