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60. CONVERSAS VERGONHOSAS
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Uma onda de calor súbita caiu sobre o reino humano. Osamu não gostava. A luz do sol ficava mais forte e irritante. Seu corpo ficava todo suado. E além disso, haviam as pulgas. O verão era a época delas, por causa do calor. No entanto, mesmo que ainda estivessem no outono, com um calor desses os malditos bichos se sentiam no direito de atazanar os outros.

Nem morto que Osamu iria pegar pulgas.

Ele havia sofrido com isso uma vez, quando tinha cerca de nove anos. Foi muito difícil para sua mãe se livrar dos bichos. Suas orelhas e cauda ficaram em carne viva de tanto coçar e levou muito tempo para o seu pelo crescer de novo. Por isso a primeira coisa que Osamu fazia sempre depois de voltar da rua era ir tomar um bom banho.

Ajudava com as pulgas, mas não com o calor. Estava tão quente que não era necessário esquentar a água. O clima estava tão opressor que saia do banho suando já.

— Eu não aguento mais — reclamou a raposa se jogando no chão. — Como é que você não está afetado por todo esse calor?

Bokuto levantou o olhar, de onde ele olhava alguns papéis.

— Mas eu estou.

— Não parece. Não está nem suando.

— Eu sou uma criatura do gelo, Abelhinha. Esse calor me afeta sim, mas eu preciso estar muito doente para suar.

— Você está quieto. É isso que quis dizer com estar afetado?

— Sim. Eu literalmente não tenho energia para nada. Bom, apesar de que eu já estive em lugares mais quentes que isso.

Osamu apoiou a bochecha no chão e fechou os olhos.

— Que tipo de lugares?

— No mundo inteiro. Em todos os lugares, menos em casa.

A raposa abriu os olhos a tempo de registrar a expressão triste da coruja. Osamu se levantou, porque o chão estava ficando quente, e sentou ao lado de Bokuto.

— Você quer falar sobre isso?

Bokuto hesitou por um momento, mas então deixou os papéis que segurava de lado.

— Eu sinto saudades. Do frio. Sinto falta dos dias em que eu podia abrir minha janela e ver tudo branco. Dos momentos de paz da manhã ou do anoitecer. Sinto falta até mesmo das lasquinhas de gelo que o vento carregava, e olha que elas viviam entrando no olho.

— Acho que entendo o que quer dizer. Eu também sinto falta de certas coisas.

— Como?

— Como o cheirinho de pão que flutuava para dentro da nossa casa todos os dias, antes mesmo do sol nascer. Como eu e o Tsumu dormíamos juntinhos nas noites mais frias. Sinto falta até mesmo de quando brigávamos por causa de um esbarrão na cauda.

— Isso é bom. Ter um irmão da sua idade.

— Quantos anos você tem de diferença com seu irmão?

— Bom, eu tenho 816 e ele tem 714, então deve ser no mínimo uns 100 anos.

— Nossa, isso é estranho. Eu estou namorando um idoso.

Bokuto riu.

— O cabelo branco eu já tenho.

Então foi a vez de Osamu rir.

— Ao menos você não tem rugas. Boo, depois que tudo isso acabar, você vai voltar para o Norte? De verdade? Voltar a morar lá.

— Provavelmente. Depois de passar séculos indo de um lado para o outro eu quero sossegar. E o Norte é a minha casa. Bom, é onde boa parte dos meus lares está.

O Reinado do Corvo (AtsuHina)Onde histórias criam vida. Descubra agora