Capítulo 30

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Um zero. 

Era o dizia na prova que meu querido professor de álgebra me entregou. Rirena sorria do outro lado da sala para a nota que constava no papel. 

Um zero. Eu tinha tirado um zero em uma prova que não fiz. Talvez fosse justo.

-- O que é isso? -- Dei um sorriso fechado para Eric, e levantei a sobrancelha. -- Um castigo?

-- Você pareceu tão incomodada com a minha ajuda, senhorita Canter, que fiz a retirada dela. -- Eu era contra a violência em muitos dos casos, mas a decepção me abraçou como uma velha amiga quando olhei para o rosto intacto de Eric e percebi que um certo demônio de olhos de berilo não o fez uma visita. 

-- Você é um babaca. -- Vociferei enquanto os alunos levantavam e saiam da sala. Eric olhou ao redor com receio que alguém tivesse prestando atenção. Ao que parecia apenas Rirena ficara com dificuldade em fechar o ziper da bolsa. Quase revirei os olhos.

-- E você é minha aluna. Mais respeito.

-- Que tipo de respeito esta exigindo, professor? -- Cruzei os braços sob o peito, o moletom branco e tão parecido quanto o que Rirena usava. 

Embora ela nunca fosse de usar moletom, não me surpreenderia se Eric tivesse comprado para ela. Uma copia de todas as alunas que ele desejava.

-- Por acaso se consiste em uma boca bem aberta e--

-- Não se dê ao trabalho, Brina. 

Minha respiração parou quando os passos confiantes na porta pareceram parar o tempo. O apelido que ele usara ontem arrastando um sotaque forte demais para que Eric percebesse que Zayan não era daqui. 

-- Quem é esse? -- Eric me olhou com raiva. Por que ele te chamou de Brina? Foi a pergunta não pronunciada naqueles olhos aquosos.

-- Não se dirija a ela. -- A voz gelada de Zayan rasgou o vento, e sua risada rasgou o tempo quando os olhos de Eric me rasgaram. 

-- Não conheço vo-- Embora Eric olhasse para mim, as palavras eram para o demonio a minhas costas. Meias palavras, os olhos de Eric se estreitaram como se procurassem alguma coisa.

-- Na verdade não se dirija a ninguém. Além do mais, sorte sua. -- A voz cantarolada de Zayan reverberou pela sala vazia como serpentes se preparando para dá o bote. -- Sugiro que continue sem me conhecer.

Estranhei o rosto de Eric contornando com a cor do seu cabelo, o desespero ao me olhar com súplica. Folego, era o que ele estava procurando.

-- Mas que porra. -- Eric arfou, enfim encontrando ar.

Eu precisava fazer alguma coisa antes que Eric dissesse alguma besteira que incendiasse o pavio curto de Zayan, antes que Zayan resolvesse deixar uma bagunça que eu teria de limpar. 

Me levantei, pegando os materiais o mais rápido que eu conseguia. Zayan estar alí era um mal sinal, era uma péssima ideia. Porque ele era um mal sinal, uma pessima ideia. 

-- O que você pensa que está fazendo? -- Eric disse ao segurar meu caderno na mesa. -- Você não está liberada. -- Idiota. Era um idiota burro e estúpido. 

-- Aaah. -- Zayan riu mais uma vez, me perguntei se Eric se deu conta com a quantidade anormal de sorrisos perversos e risadas ameaçadoras que ele tinha. -- Ela está sim. 

Eu vi quando aqueles olhos verdes prometeram coisas horriveis para Eric, eu senti essas promessas se arrastando de forma peçonhenta por entre as cadeiras. Eric, ainda confuso, também sentiu.

-- Eu posso saber quem você é? -- Eric cruzou os braços na altura do peito. Uma armadura. Ele provavelmente precisaria mais que isso. -- A entrada no colégio não é permitida para estranhos, vou pedir para que você se retire.

Zayan deu um passo para frente. Aquilo era um terno? Nossa, aquilo era mesmo um terno preto. E se não fosse a morte iminente em sua postura, eu teria parado alguns segundos para admirar o quão bem a blusa preta social se abria em seu peito. 

-- Eu... -- Engoli em seco quando nenhum dos dois me deu atenção. Mesmo assim tentei de novo: -- Ele é meu motorista. 

Eric franziu a testa para mim, Zayan me olhou como se eu o tivesse ofendido, depois me olhou como se eu fosse burra.

Apesar do desprezo, foi o que eu precisei para sair do alcance de Eric e chegar até Zayan, o implorando para que apenas dessa vez ele não agisse como se o mundo se dobrasse ao seu favor. Apenas dessa vez.

-- Senhorita Canter, diga ao seu motorista que espere lá fora, você não está liberada. -- Eric disse as minhas costas. Ele claramente sentira a mentira no ar. Era um completo idiota. 

-- Professor. -- O olhei por cima do ombro. -- O sinal tocou. -- Mas nada na geada em seus olhos se apaziguou. 

-- Detenção, querida. 

-- Detenção? -- Virei completamente em sua direção, incrédula. -- Pelo que exatamente?

Ele me deu um sorriso fechado, tentando ao máximo se controlar para não dizer algo estupido na frente de Zayan a minhas costas, percebi. 

-- Isto. -- Ele levantou a folha do meu exame ao lado do seu rosto. -- Você tirou um zero na prova, você está com mais faltas do que deveria, e você desrespeitou o professor em sala de aula.

Talvez não fosse a bagunça de Zayan que eu teria de limpar, talvez fosse a minha, porque talvez quem fosse matar Eric era eu. Porque eu senti o sangue descer fervendo por toda a minha pele, todo o meu rosto, eu senti quando minha garganta apertou querendo explodir em raiva, desejando explodir em raiva.

Duas coisas acontecerem em questão de dois segundos. No primeiro minha visão ficou turva, não me permitindo diferenciar se o vermelho que eu via era o cabelo ou a pele de Eric. 

No segundo seguinte eu já não precisava me preocupar em diferenciar mais nada, porque tudo o que eu vi foi escuridão quando a cobra finalmente deu o bote.

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