Capítulo quatro

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- Aí - disse Lauren por entre dentes cerrados.

- Fique parada - disse o médico.

- Você é um homem grosseiro, intrometido e desajeitado - retrucou Lauren na própria língua.

- E fique quieta. Esta é uma sálvia medicinal - disse o médico.

Lauren não gostava de médicos. Durante as últimas semanas da doença de seu pai, o quarto do doente se enchera com eles. Eles haviam cantado, murmurado pronunciamentos, jogado ossos de adivinhação no ar e ministrado vários remédios, mas o pai ficara apenas mais doente. Ela se sentia diferente em relação aos pragmáticos cirurgiões de campo que tinham trabalhado incansavelmente junto do exército em campanha. O cirurgião que cuidara dela em Marlas costurara seu ombro com o mínimo de estardalhaço e restringira sua objeção a um cenho franzido quando Lauren subiu em um cavalo cinco minutos depois.

Os médicos veretianos não eram do mesmo jeito. Davam advertências para que não se mexesse e infinitas instruções e curativos que eram continuamente trocados. Esse médico usava uma túnica que chegava ao chão e um chapéu em forma de pão. A sálvia não estava tendo absolutamente nenhum efeito em suas costas que Lauren pudesse perceber, embora tivesse um aroma agradável de canela.

Fazia três dias desde as chicotadas. Lauren não se lembrava com clareza de ser retirada do tronco onde fora açoitada e devolvida ao seu quarto. As impressões turvas que tinha da jornada lhe asseguravam de ter feito a viagem de pé. A maior parte dela.

Ela se lembrava de se apoiar em dois dos guardas, ali, naquela sala, enquanto Radel olhava horrorizado para suas costas.

- A princesa ... fez mesmo isso?

- Quem mais? - perguntou Lauren.

Radel se aproximou e deu um tapa no rosto de Lauren; foi um tapa forte, e o homem usava três anéis em cada dedo.

- O que você fez para ela? - perguntou Radel.

Essa pergunta pareceu engraçada para Lauren. Isso devia ter transparecido em seu rosto, porque um segundo tapa muito mais forte seguiu-se ao primeiro. A dor momentaneamente limpou a escuridão que pressionava sua visão; Lauren aproveitou esse controle maior de sua consciência e se aferrou a ele.

Desmaiar não era algo que ela jamais tivesse feito antes, mas aquele era um dia de novidades, e ela não ia arriscar.

- Não deixe que ela morra ainda - foi a última coisa dita por Camila.

A palavra da princesa era lei. Por isso, pelo pequeno preço da pele de suas costas, houve uma série de vantagens concessões ao encarceramento de Lauren, incluindo a gratificação dúbia de ser apalpada regularmente pelo médico.

Uma cama substituiu as almofadas do chão, de modo que ela podia se deitar confortavelmente de bruços (para proteger as costas). Ela também recebeu cobertores e vários cortes de seda colorida, embora devesse usá-los apenas para cobrir a parte inferior do corpo (para proteger as costas). A corrente permanecia, mas em vez de prendê-la a sua coleira, ela estava conectada a uma das algemas de ouro (para proteger suas costas). A preocupação com suas costas também lhe pareceu engraçada.

Ela era banhada com frequência, a pele delicadamente limpa com esponja e água retirada de uma tina.

Depois, os criados descartavam a água, que, no primeiro dia, ficou vermelha.

Para a surpresa de Lauren, a maior mudança não foi a mobília nem as rotinas, mas a atitude dos criados e dos alfas que a vigiavam. Lauren esperava que eles reagissem como Radel, com animosidade e ultraje. Em vez disso, havia simpatia por parte dos criados. Dos guardas, havia - o que era ainda mais inesperado - camaradagem. Se a luta no ringue mostrara que Lauren era uma lutadora como eles, ser pulverizada sob o chicote da princesa tinha aparentemente feito dela um membro da fraternidade. Até o guarda mais alto, Orlant, que ameaçara Lauren depois da sua luta, parecia ter começado a gostar um pouco dela. Ao examinar as costas de Lauren, Orlant tinha - com bastante orgulho - proclamado a princesa uma vadia feita de ferro, e deu um tapinha alegre no ombro de Lauren, deixando-a momentaneamente pálida.

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