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Cecília Albuquerque

Acordei agarrada no braço do Enzo e quando fui olhar pra ele, ele já tava me olhando.

Rolou aquele clima de novo, igualzinho do dia que ele me deu uma carona. Dessa vez nos encaramos por muito mais tempo.

Ele olhou pra minha boca por alguns segundos e depois voltou a olhar nos meus olhos.

Comecei a aproximar meu rosto por impulso e ele fez o mesmo, nossas bocas estavam a poucos milímetros de distância.

    Tava prestes a acontecer, eu conseguia sentir a respiração dele sobre a minha pele.

Ele fechou os olhos calmamente e eu fiz o mesmo, quando tava quase acontecendo o Felipe entra no quarto e a gente se afasta na velocidade da luz.

— Porra, com uma puta festa lá embaixo eu não acredito que vocês estão aqui. - Felipe falou quase que gritando por causa do barulho.

— Deixa de ser intrometido e me diz onde a minha amiga tá. - Respondi mudando de assunto, morrendo de vergonha.

— Tá lá embaixo me esperando pô, vim só pegar meu celular. - Felipe respondeu procurando o celular dele pelo quarto.

— Tá em cima da escrivaninha, cabeção. - O Enzo apontou pro celular, que tava sobre uns livros.

— Aproveitando que tu desgrudou um pouco da minha amiga, vou descer pra ver se ela lembra que eu existo. - Falei enquanto calçava as havaianas do Enzo.

Saí do quarto deixando os dois sozinhos. O Enzo que explique pro Felipe o que tava acontecendo ali.

Desci as escadas e procurei a Amanda. Achei ela conversando com aquele garoto de mais cedo, irmão do Felipe.


— E aí Amanda, não lembra que tem amiga não? - Perguntei cruzando os braços, me aproximando dos dois.

— Claro que lembro, minha vida. - Ela respondeu me abraçando, percebi que ela já tava levemente alterada — Esse aqui é o André, irmão do Felipe.

— Já conheci a loira mais cedo. - Ele respondeu com um sorrisinho no rosto diferente do de mais cedo, sem malícia.

— Sentiram falta do mais gostoso da festa? - Felipe disse passando o braço por volta da cintura da Amanda.

    Será que eles ficaram? Sim ou com certeza? Bom, a Amanda vai me contar tudo depois.

— Cala a boca, mano. Saiu daqui há 5 minutos. - O Enzo respondeu negando com a cabeça, parando do meu lado.

— Felipe, comprou o que de bom pros convidados comerem? - Perguntei morrendo de fome.

— To morrendo de fome já. - O Enzo concordou comigo.

— Porra mano, só compramos as bebidas. - O André disse coçando a cabeça e eu fiz bico.

— Tem um subway aqui perto, quer ir lá? - O Enzo perguntou pra mim.

— Pode ser. - Respondi olhando as horas no meu celular — Mas será que ainda tá aberto?

— É 24h, loira. - O tal do André respondeu.

— Então vamos. - Falei pro Enzo que assentiu, pegando a chave do carro no bolso.

— Amiga, traz um pra mim? - Amanda perguntou com cara de cachorro pidão.

— Você me trocou por isso aí. - Apontei pro Felipe — Agora sustenta as consequências. - Impliquei com ambos.

— Que isso, cunhas. Vou levar pro coração. - Felipe respondeu com a mão no peito demonstrando uma falsa indignação.

— Que cunhas o que, Felipe? - Debochei dele e saí com o Enzo.

Saímos da festa e entramos no carro dele, que tava estacionando próximo a casa do Felipe.

Como tava só nós dois, o caminho todo foi em silêncio. Até porque realmente era bem perto, de fato.

Descemos do carro e fizemos nossos pedidos.

Assim que pagamos, pegamos a cestinha com os sanduíches e sentamos em uma mesa mais afastada.

— Meu Deus, isso aqui tá divino. - Falei mastigando de olhos fechados e ele riu.

— Nossa, tá bonzão mesmo. Parece até que eu tava há três dias sem comer. - Ele respondeu e eu ri concordando.

— Realmente, esqueceu até como come. - Falei abrindo o guardanapo e limpando o cantinho da boca dele — E sua irmãzinha? Tá bem?

— Tá, tá toda felizona pelo meu pai ter voltado de viagem.

— Ele tava viajando pra onde? - Perguntei puxando assunto.

— Tava no Rio, dando aula. - Respondeu sem ânimo.

— Meus pais moram lá, saudade deles. - Falei um pouco tristinha — Seu pai é professor de que? - Perguntei e ele riu.

— Ele é cirurgião dentista. Já chegou a fazer viagens internacionais dando palestras e aulas. - Respondeu normal, como se não fosse uma informação relevante.

— Caramba, então ele é bom mesmo no que faz. - Enzo assentiu — Você tá cursando Odontologia por causa dele? - Resolvi perguntar.

— É... mais ou menos. Sempre me interessei muito pela profissão por causa dele. Mas nunca vou deixar meu profissionalismo acima da minha família igual ele fez a vida toda. - Respondeu mudando de expressão, colocando o sanduíche na cestinha.

Entendi que o Enzo fica desconfortável quando o assunto é o pai. Provavelmente por causa da ausência.

— Como assim? - Perguntei querendo entender melhor.

— Desde criança eu sempre senti falta de um pai presente, sabe? Ele sempre colocou a culpa da ausência no trabalho e tá fazendo a mesma coisa com a minha irmã.

— E você já tentou conversar com ele sobre como você se sente? - Perguntei tentando ajudar — As vezes a gente pensa que conversar é bobeira, mas nem sempre é.

— Sim, já conversei inúmeras vezes. Mas há muito tempo parei de ficar implorando por atenção, fazia mais isso quando era moleque. - Respondeu.

— E por que você acha que ele age assim? - Me intrometi mais ainda.

— Ah, sinceramente? Não sei. Ele sempre foi assim, mas passou a ser muito mais ausente depois que minha mãe abandonou a gente no nascimento da minha irmã. - Respondeu desviando o olhar pra um ponto qualquer e eu fiquei um pouco chocada com essa informação.

— Abandonou? - Perguntei com um pouco de receio de ser indiscreta.

— Sim. Não sei se ela tava insatisfeita com a meia presença do meu pai. Mas ela simplesmente se mandou, sem dar uma única explicação. Semanas depois o meu pai recebeu o pedido do divórcio. - Ele respondeu respirando fundo, demonstrando ser um tópico sensível pra ele.

— Talvez ele colocar o trabalho em primeiro lugar seja o mecanismo de defesa dele pra lidar com algumas situações ou até mesmo frustrações. - Falei voltando ao assunto anterior por ter percebido que falar sobre a mãe não fazia bem pra ele.

    Ele assentiu parecendo pensar sobre o que acabei de falar.

Eu queria muito perguntar mais e entender toda a história completa.

Acho que por instinto eu sinto necessidade de entender tudo, foi por isso que escolhi cursar Psicologia. Me identifico muito com a profissão.

Mas como percebi que era um assunto delicado pra ele, resolvi não forçar e parar por aqui.

Deixando toda a minha curiosidade pra uma futura conversa.

Aquela PessoaOnde histórias criam vida. Descubra agora