Capítulo 20

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Os dias passaram.
Rogério e António partiram em direcção a Lisboa para apanharem o navio que os levaria ao Brasil.

Rogério saiu de casa pela manhã.  Deu um abraço no pai e um beijo na mãe como fazia habitualmente.

Deixou uma carta onde explicava tudo e o porquê de ir embora.
Sabia que seu pai não ia concordar,  então, nem perdeu tempo com explicações.
Explicava tudo na carta e pedia perdão.

Na cidade apenas George, Rodolffo e Juliette sabiam a verdade e essa estava bem guardada.

Desde o último encontro de Rodolffo e Juliette na casa que era agora dos dois , nunca mais se viram.
Juliette vivia a chorar, mal comia e não falava com ninguém.

Os dias dela eram passados entre a cama e o jardim.  Sua mãe fazia de tudo para a animar mas não resultava.  Seu pai começava a preocupar-se.  Ela sempre foi tão alegre e viva e agora parecia alheia a tudo e todos.

Deambulava pelo jardim durante horas e depois sentava-se com o olhar no vazio.

O seu pai olhava através da janela do escritório e sentia um pouco de culpa.  Ontem tinha ido ter com ela e contou-lhe sobre o negócio com George, como recuperou os seus bens e sobre a sociedade da qual ela agora fazia parte.

Ela ouvia tudo em silêncio.  No final apenas balbuciou:  que bom.  Fico contente por ti.

A - E por ti?  Não estás contente com o que podes conseguir para ti?  A sociedade de construção é um bom negócio.

J - Não me interessa. Só quero ficar no meu cantinho.

R - E o Rodolffo?  Lembra-te filha que lá atrás eu disse que não ia interferir mais na tua vida.

J - Ficou tudo no passado.  Eu não mereço.

A - Mereces ser feliz sim.  Queres que eu peça para ele vir aqui?

J - Não quero ver ninguém pai.  Vou para o meu quarto.

E assim passava os dias.  Hoje chamei o Dr. Ângelo, médico que acompanha a família desde sempre.

Pedi para ele consultar Juliette.  Talvez ela tivesse alguma doença.

No final da consulta o médico apenas disse que ela tinha tristeza.
Não conhecia nenhum remédio para a tristeza.  Pediu que fizessem ela divertir-se que passava.

Os Magalhães resolveram dar uma festa nos jardins de sua casa.  Convidaram vários jovens nomeadamente antigos colegas de liceu de Juliette, incluindo Rodolffo e seus pais.

Quando este chegou,  Artur de Magalhães pediu para falar com ele a sós.

A - Meu jovem!  Sei que em tempos não te tratei decentemente e por isso as minhas desculpas.
Não sei o que se passou entre ti e a minha filha mas em nome da vossa amizade peço que não te afastes dela.
Ela vive fechada no quarto, chora o dia todo,  não fala com ninguém.
Talvez contigo ela se abra.

Sempre frequentaste esta casa, embora,  noutras circunstâncias,  mas hoje eu peço que a frequentes sempre que desejares na qualidade de nosso amigo.
Organizei esta festa para ela mas ela não quer ver ninguém nem sair do quarto.

R - Deixemos o passado de lado.  Posso ir falar com ela?  Talvez me ouça.

A - Vai lá meu jovem e fico grato por tudo.

Artur adorava a filha.  Apesar de às vezes parecer grosseiro e não o demonstrar ele faria tudo para vê-la feliz.

Rodolffo subiu as escadas, parou em frente ao quarto de Juliette e bateu à porta.
Como ninguém respondeu resolveu girar a maçaneta e abri-la.

Juliette estava sentada na cama.  Os olhos vermelhos de quem chorou muito. Estava um pouco pálida. Tinha um pedaço de papel na mão que Rodolffo logo identificou como uma das suas cartas.

A seu lado uma caixa fechada com Rodolffo escrito na tampa.

R - Oi!  O que é que a menina está aqui fechada a fazer quando rola uma festa lá fora?  Como estás?
Sentou-se ao lado dela e passou o braço por cima dos ombros dando-lhe um beijo na cabeça.

J - Eu não pedi festa!  Quero ficar sózinha.

R - Porquê,  o que se passa? Que é isso que estás a ler?

J - Coisas que me faziam feliz.

R - E já não fazem?

J - As lembranças sim.  A vida real não.

Rodolffo tirou a tampa da caixa e viu todas as cartas que ele havia escrito para ela.  Porém notou que havia grupos de 2 envelopes.  Pegou num deles e reparou que uma carta era dele mas a outra não.  O envelope estava em branco.

R - Quem é que te escrevia ao mesmo tempo que eu? 

J - Ninguém.  Podes abrir.

Rodolffo abriu o envelope e constatou que cada um deles era resposta às suas cartas.
Olhou para Juliette que já chorava novamente.

R - Não chores.  Porque não me enviaste as cartas?  Eu teria ficado tão contente em recebê-las.  Sofri muito com a tua falta, mas, nunca deixei de escrever.

J - Eu sei. Eu estava muito magoada e magoei quem não queria.   Não mereço nem amizade de ninguém.

T - Não digas isso.  Todos errámos.  Nossos pais já se resolveram.  Temos que seguir em frente.
Tens que sair deste quarto.  Lá fora está um mundo inteiro à espera de nós.
Tens que voltar a ser a menina alegre por quem me apaixonei.

J - Logo vais encontrar outra paixão.

R - É isso que tu queres, que eu conheça outra pessoa?

Ela não respondeu.  Estava de cabeça baixa dobrando a carta e colocando-a no envelope.

R - Eu vou querer ler essas cartas dirigidas a mim.

J - Podes levar.

R - Não quero levar.  Fazemos o seguinte: venho aqui todos os dias, e lemos uma carta por dia juntos.  Tu lês a minha e eu leio a tua.  No final falamos sobre elas.  Pode ser?  Aceitas a minha presença todos os dias?

J - E não vai atrapalhar a tua vida?
Eu não mereço isso.

R - Quem sabe se mereces ou não sou eu.  Lembra-te que apesar deste longo afastamento eu amo-te.
Nada da menina ler as cartas sózinha.   Só quando eu chegar,  combinado?

Juliette encostou a cabeça no peito dele.

J - Abraça-me.

Rodolffo beijou-a nos lábios e apertou-a contra si.  Ela parecia assustada querendo protecção.

Pelo menos conversou com ele e não o rejeitou.  Mas Rodolffo percebeu que ela não estava bem.  Na faculdade haviam debatido durante muito tempo o tema Depressão.   Os médicos mais antigos davam primordial importância às doenças do corpo.   As novas gerações focavam também a parte psicológica.

Juliette poderia estar com depressão.
Tudo o que ele observou levava a essa conclusão.

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