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Eu e Mickaelly nos mantemos escondidas na saída principal do restaurante durante o que parecia uma eternidade, mas não passou de duas horas depois que eu contei para ela sobre o filho de Alan. Quanto mais o tempo passava desde que eu estive perto deles, mais meu cérebro remoía o que Alan e Júlia falaram sobre nós e menos eu tinha certeza sobre Ezequiel ter olhado para mim. Se ele fosse mesmo a única pessoa que conseguia se comunicar conosco, eu teria que gastar meus últimos neurônios para entender o por que. 

Mickaelly achou melhor ficarmos de tocaia para saber mais sobre a vida desse jovem antes de tentar abordar ele, pelo menos pra gente conseguir dar chutes na direção da verdade, já que no fundo, Alan ter um filho e esse filho ser uma espécie de chave, me da vontade de desistir e deixar pra lá. Mas segundo Micka, isso seria burrice já que chegamos tão longe.

Eu ainda sinto um medo constante de Nivea aparecer e buscar uma de nós como fez com Melanie, mas não sei se agora que somos fantasmas como ela, teria como fazer um rastreamento tão preciso  na nossa direção no espaço tempo. Fora que eu nem sei se ela já sabe que não estamos mais presas nas escadas. Lembrar de Mel, me deixou repentinamente mais triste, se é que isso é possível. No fundo eu sei que seria frustrante imaginar que ela ainda esta viva por ai, mas não posso deixar de esperar o melhor dos cenários. Que se de alguma forma muito doida, podemos usar o Ezequiel para achar respostas e encontrar Melanie sã e salva.

Finalmente as risadas escandalosas dos participantes daquela mesa de jantar, se projetaram para fora das portas duplas da entrada do restaurante. Júlia e Alan vinham caminhando na frente, se despedindo do outro casal, enquanto que Gusta saiu meio que sem se despedir, parecendo chateado com todos aquele alvoroço. Caminhou sozinho pelo corredor e sumiu numa esquina adiante. Permaneci agachada atrás de um vaso de planta grande, e Micka estava do outro lado perto de umas cadeiras numa parte mais escura. Ainda não conseguia ouvir nada do que falavam, mas continuei focando no filho, que permanecia em pé atras das outras pessoas com as mãos nos bolsos e o olhar distante. Ele era bem bonito na verdade, mas muito melancólico. Quase um emo. 

Finalmente começaram a andar, os quatro mais velhos ainda mantendo uma risada forte, enquanto pegavam um corredor que tinha acesso ao elevador. Entraram todos juntos enquanto eu e Micka nos mantínhamos a uma distância segura. 

-Se eles forem pro corredor dos quartos, não vamos descobrir onde estão hospedados...- ela comentou.

-Mas se a gente entrar no elevador ele vai nos ver. - Ela olhou para com a mesma expressão que eu mantinha para ela.

Precisávamos usar a escada. Não foi preciso a gente falar nada para saber o que se passava. Claro que por opção eu nunca mais voltaria ali. Mas em uma missão como essa, era necessário. O medo de ficar presa num looping infinito me fez começar a suar. Abri a porta correndo e fiquei sem perceber se ela estava me seguindo ou não, mas subi os andares tão rápido só olhando pra cima, que no fim empurrei a porta com todas a minhas forças e quase cai no corredor iluminado do outro lado. Minha respiração estava ofegante e eu coloquei as mãos nos joelhos enquanto esperava minha visão desembaçar.  Senti o vento da porta de fechando atrás de mim mas Mick a empurrou de volta e chegou se apoiando e mim parecendo tão cansada quanto. 

Ouvi o barulho dos passos e olhei a tempo de ver o trio andando no corredor para o outro lado. Agarrei Micka pelo braço e comecei a andar atrás deles até ver Alan e entrar em um quatro e Ezequiel entrar em um logo depois. Assim que as portas se fecharam, o barulho cessou e ficamos sozinhas no corredor, meio que sem saber o que fazer. Paramos em frente a porta do Ezequiel e olhamos uma para a outra.

-Ok, sabemos os quartos, mas e dai? - Micka questionou.

-Precisamos falar com o Ezequiel. - ela me olhou com incredulidade. - Eu sei... não dá pra chegar do nada e dizer, "oi, tudo bem? sou o fantasma da garota desaparecida, será que pode me ajuda?"

-Serena, a gente vai mesmo assombrar o filho do Alan sem nem saber se ele pode ajudar?

-Você tem alguma ideia melhor? - ela cruzou os braços e ficou em silencio ainda mantendo os olhos em mim. - Faz o seguinte: deixa que eu falo. - Micka bufou.

Bati duas vezes na porta quase sem força, porque eu sei que preciso falar com ele, mas no fundo torci um pouco para que ele simplesmente não ouvisse. Ao nosso redor o corredor já era mal iluminado por causa do horário, e o único barulho era o pé de Micka batendo insistentemente no chão, enquanto eu sentia meu coração bater nos ouvidos. O que me fez pensar por um milésimo que ouvir meu próprio coração me faz sentir 1% mais viva do que realmente devo estar. No que pareceu uma eternidade, alguns barulhos vieram da porta de madeira a minha frente e eu senti que meu rosto começou a esquentar. O ranger da porta abrindo me fez esquecer completamente o que eu precisava dizer. O rosto do rapaz a minha frente parecia um pouco confuso, mas o meu deve ter sido ainda pior. Ele olhou diretamente para mim, mas a minha impressão era que estava olhando através. Senti Micka empurrar meu braço de leve, mas continuei cravada no chão em silencio absoluto porque nada me dava segurança que ele estava realmente me vendo. Ele não disse nada e não se mexeu assim como eu por pelo menos um minuto inteiro. Devagar abriu a boca como em duvida se estava falando comigo mesmo e eu continuava sem acreditar que ele podia mesmo falar comigo.

-Posso ajudar? - sua voz saiu como um sussurro mas definitivamente estava falando comigo.

- Oi! - minha voz saiu como um estalo agudo. - eu queria... - eu parei de falar e ele semicerrou os olhos azuis alternando entre mim e Micka. - Eu posso entrar? Acho que você pode me ajudar em um problema. 

-Quem é você?  - ele perguntou, mas eu estava realmente preocupada com os passos que se aproximavam pelo corredor. Olhei rapidamente para a direita e um casal de aproximava. Definitivamente eles não podiam ver o Ezequiel falando com ninguém. - Se você estiver precisando de ajuda para encontrar um lugar, no fim do corredor tem um mapa.... 

Eu comecei a falar por cima dele tentando dizer que não precisava dessa ajuda, enquanto ele deu dois passos em direção ao corredor para apontar o mapa, mas Micka se cansou e empurrou ele de volta para dentro do quarto.

-A chega! - ela espalmou as mãos no peitoral dele e fazendo força para empurrado de volta para dentro. Eu acabei entrando rapidamente e fechando a porta atrás de mim enquanto ouvia Ezequiel se engasgar e não conseguir forma nenhuma frase completa.

-Espera! Eu posso explicar! - eu levantei as mãos em palmas abertas tentando mostrar que estava querendo apenas ajuda. 

-Explica logo por favor! - Micka voltou em direção a porta e trancou ela, o que fez ele dar um salto e se assustar ainda mais. 

-Se vocês querem dinheiro, naquela gaveta tem tudo que eu tenho aqui! - Ele falou alto enquanto dava a volta pela cama de casal e se mantinha perto da janela. 

-Não! Eu não quero roubar você! Só precisamos conversar!

-Sobre o que? Quem é você?

- Meu nome é Serena, e essa é Mickaelly. E bem, atualmente você é o único que vê a gente.

-Como assim? Do que você ta falando? 

-Olha isso aqui! - Mickaelly passou por mim e jogou nele um panfleto que estava sobre uma mesa de canto em direção a Ezequiel. Ele agarrou o papel mas não parecia que estava entendendo nada. - Olha para essa meninas desaparecidas. Ta vendo? Somos nós!

O semblante dele começou a ficar ainda mais confuso com os olhos alternando entre o papel em suas mãos e nosso rostos. 

-A terceira é Melanie, mas realmente não sabemos onde ela está.

- Isso é um pegadinha? De muito mal gosto, essas meninas morreram a anos atrás. 

-Não! Somos nós! Estamos presas aqui, nem sabemos como nem porque, mas você é o único que está nós vendo. 

Ele pareceu definitivamente confuso, colocou uma das mãos na cabeça e negou novamente andando para trás até bater as costas contra a parede. Eu me aproximei tentando fazer contato visual.

-Ezequiel... é seu nome não é? - ele voltou os olhos para mim.  - Eu preciso mesmo da sua ajuda. Eu quero voltar para casa, mas... m-mas...

Meus olhos pesaram e eu senti meu corpo cair. Alguma coisa me segurou antes que eu atingisse o chão, senti mãos em meus braços mas minha vista era breu e eu senti meu corpo ficar enquanto minha alma se afastava em direção a algo desconhecido. Ouvi algo parecido com meu nome mas não pude me segurar e deixei me levar a um lugar novo. 


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⏰ Última atualização: May 15 ⏰

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Prisioneira MarítimaOnde histórias criam vida. Descubra agora