Prisioneira Marítima

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Não to acreditando que eu fui selecionada pra essa viagem. Aquele trabalho nem rendeu muito, e eu nem gastei tanto tempo muito menos material. Na verdade foi um passatempo sem nenhum tipo de interesse. A princípio me senti mal porque tinha muita gente que queria fazer uma viagem desse tipo, pois nunca mais terão oportunidade na vida. Mas cá estou, embarcando nesse Cruzeiro internacional. Nossa viagem vai começar aqui mesmo no Rio de Janeiro, e vamos passar um tempo rodando no oceano Atlântico até chegar a Europa, e passará por vários países da União Europeia. Eu não imaginei que com 20 anos viajaria num desses. Simplesmente inacreditável já olhando de fora, chama atenção de qualquer pessoa que esteja ao redor. Ele é um cruzeiro ecológico que foi reformado de um antigo navio que estava apodrecendo em um cemitério de navios, mas essa empresa, a EC, agora está comprando essas carcaças clássicas e reformando fazendo máquinas incríveis pra viajar o mundo afora. Inacreditável que é uma empresa brasileira com um projeto que virou uma febre mundial, pois eles conseguem ter uma economia de até 70% de materiais para a reforma do cruzeiro graças aos antigos navios que estavam abandonados. Daí várias faculdades do Brasil fizeram esse concurso nacional para os alunos investirem em projetos que ajudassem os produtores da EC.
Eu faço faculdade de química a 3 anos e simplesmente bolei (com a ajuda de um professor) uma forma de remodelar o lixo gerado no Cruzeiro, sem precisar descartar nada na água e tornando o acúmulo mais compacto, e nisso é possível mais dias de viagem antes de ter que descarregar lixo. Uma ideia que já devia ter sido pensada a muito tempo e que eu até achei que já existisse. Mas gostaram tanto que me chamaram pra isso.

Também chamaram a Melanie. Eu e ela somos vizinhas de rua, mas não somos muito amigas desde infância quando fomos estudar em colégios diferentes, e por acaso agora fomos fazer faculdade na mesma universidade. Mas isso não mudou nada, continuamos afastadas porém tratamos uma outra com educação e por causa de nós termos sido as únicas ganhadoras da nossa universidade, não conhecemos mais ninguém. Inclusive o meu pai, ficou de dar uma carona para nós duas hoje que vamos embarcar. Ele e mamãe, passaram às últimas semanas inteiras falando sobre todos os cuidados que eu deveria ter dentro de um cruzeiro.

-Imagina só minha filha, se você parece nisso com seu pai. Também vai ter muito enjoo então leva muito remédio para todos os dias.

Eu sou filha única, mas não sei porque. Quando eu era mais nova meus pais sempre falaram em ter outra menina, mas não aconteceu. E agora eles já estão velhos demais pra isso. Passaram assim, a depositar todos os planos para o futuro em mim. Mas não acho que estou indo pelo caminho errado, mas não estou indo pelo caminho que eles queriam que eu fosse. Mamãe sempre diz que eu devia ser modelo. Ela foi quando era mais nova até quando tinha idade, mas logo conheceu o papai, casou cedo e deixou o sonho de lado. Acho que ela queria que eu realizasse esse sonho por ela. Mas eu não tenho o mínimo jeito para fotos, muito menos para passarela. Já meu pai é advogado a muitos anos, e minha mãe acabou entrando nisso depois. Ele sempre quis que um filho dele também se tornasse advogado, para ter uma família toda no juizado. Mas eu não levo o menor jeito para isso... Até fiz alguns testes de aptidão antes de escolher a faculdade pra ver se, pelo menos, em um deles não dava advocacia pra eu tentar, mas não funcionou. Sempre fui apaixonada por química, desde que entrou na minha grade escolar quando eu estava na sétima série. Quando disse isso pela primeira vez pra minha mãe, ela ficou muito paranoica. Pois não acreditava que isso daria futuro a alguém, mas eu pude provar o contrário quando arranjei um emprego fixo antes mesmo de ser aprovada na faculdade e que conheço muitos químicos que estão famosos e ricos pelo mundo. Mesmo assim o meu pai, até hoje nesse último dia enquanto estou entrando no Cruzeiro, pergunta o seguinte:

-Você tem certeza que quer seguir como química?-Ele perguntou quando o carro parou em frente à porta principal do Porto e se virou pra mim me encarando com os olhos azulados. Minha mãe fez o mesmo e me encarou, e eu olhei para Melanie que estava também olhando pra mim esperando uma resposta.