CAPÍTULO 21

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  Nesse meio-tempo os investigadores chegaram à entrada no lugar do fenômeno.
  Tinham uma feição de dezesseis ou dezessete anos de idade, embora tivessem vinte. Ostentavam óculos escuros e ternos de marca abaixo de haoris negros semelhantes a capas longas de tecido fino, enquanto que suas mangas largas e soltas lhes concediam uma aparência de apreciadores culturais.
  Uma portava um coque baixo loiro e uma saia negra até o joelho. O outro um penteado pompadour, criando um topete alto e volumoso na frente, com as laterais e a parte de trás mais curtas.
  Uma turma de sujeitos os barraram. Comissárias sorridentes, tendo um guardião a frente vestindo uma camisa branca, um jeans e um casaco negro com um crachá  da segurança.
  A dupla mostrou-lhes suas identificações.
  — Emilly Christine, ex-membro do curso de criminologia da I.V.O.
  O cartão continha o logotipo do Internato, fotografia, nome, data de nascimento, cargo, número de identificação único, uma tinta especial e um chip eletrônico.
  — Arthur Nicolas, membro do curso de criptozoologia da I.V.O., Com sua licença — combinou ele enquanto empurrava o guardião para entrar.
  O segurança o impeliu de volta, os analisou de cima a baixo e retrucou com um bafo fétido próximo do nariz de Nicolas, do tipo que ninguém gostaria de sentir mesmo soterrado debaixo de neve e precisando de respiração boca-a-boca.
  — Sabemos ler. O que querem aqui?
  — Averiguar as circunstâncias da morte de Diana Tol… Trostova… — Nicolas franziu as sobrancelhas. — Será alemão?
  — Não, Tolstova — falou a garota com alguns fios soltos ao redor do rosto. — E é russo.
  O guarda repudiou os dois.
  — Não importa a etnia dela! Não há o que investigar, ela se suicidou e ponto — dispos os braços atrás das costas respeitosamente. — Não se preocupe, sabemos velar os nossos.
  A detetive tentou argumentar com o brutamontes.
  — Senhor, não é normal uma mãe resolver pular de uma janela do terceiro andar...
  Ele expôs os dentes em chasco e recordou-se que ela era mãe.
  — Já ouvi falar de vocês. Se intrometem em assuntos que deveriam ser tratados por autoridades mais competentes.
  Emilly vociferou ao ouvir isso, pois sua estadia na I.V.O. era por ser exatamente uma autoridade competente a ajudar.
  — Fala sério?! Em meio às trevas, somos a esperança contra o inexplicável! — Ela recitou o lema da organização.
  Já o rapaz foi mais direto e pôs o dedo no peito do capanga. Os óculos refletiam o rosto enrugado do homem.
  — Eu não sei se o senhor percebeu, mas  é bastante estranho esse ser o único lugar que está chovendo na cidade toda. Engraçado, um rio aéreo que segue quilômetros em linha reta justo daqui.
  O guarda ficou sem resposta, apenas pode proferir de saliências unidas:
  — Prossigam…

  Eles rasgaram o pátio branco quadriculado. Seus haoris pareciam que iam difundir-se por toda a área. Travaram-se ao pé das escadas para o andar 2.
  Emily tirou do bolso um celular, o qual tinha um relógio clássico em sua tela. Pressionou o contador e subiram as escadas o mais normal possível.
  Mais normal porque não se sabia qual era a velocidade de um corpo prestes a morrer. Não é uma fórmula matemática que se aprende na escola, mas talvez em um curso de espiritualismo culposo.
  Ao término, tomaram outra escada, essa para o terceiro andar. Percorreram mais um pouco até pararem nas faixas amarelas escritas Do Not Enter (Não entrar). A garota cessou o contador. 3 minutos.
  O local do incidente era o almoxarifado, encontrava-se parcialmente isolado pelas faixas, mas puderam contemplar um detector de metal depois delas.
  — Emily, olhe — o investigador passou as palmas nas fitas — Nós não fomos os primeiros a chegar aqui?
  — Que eu me lembre, a agência interrompeu inclusive a FBI de se aproximar antes de nós — ainda bem. Tudo o que menos precisavam agora, eram das invejas e rixas de departamento entre os agentes Mulder e Scully, Jay e Kay, irmãos Winchester ou o casal Warren.
  — O material… parece velho. Acredito que não foram policiais que puseram isso aqui recentemente.
  Por quê? Ele pensou.
  Nicolas observou a detetive obstaculizar as tiras, aproximar-se do detector e aplicar o dedo sobre.
  — Acha que isso é um objeto anômalo?
  — Sinceramente? Não. Eles costumam fazer massacres enormes e não só uma vítima — o investigador começou a procurar marcas de luta no objeto. — É muito suspeito não terem fechado esse lugar ainda, né?…
  — Erick diria que você está sendo ridículo e daria um exemplo de como você está errado.
  — "Abusos em creches" — Nicolas mexeu os dedos em V — Seria um bom argumento, se não tivessem achado casos verdadeiros.
  A garota tirou o dedo de cima do verificador.
  — Ora, não está vendo? esse detector explica quase tudo.
  — Explica? — duvidou Nicolas.
  — Está com o relatório médico da vítima?
  — Sim, recebi no telefone. Por quê?
  — Deixe eu ver, por favor.
  O detetive tirou o aparelho do bolso e procurou nos arquivos altamente organizados o relatório.
  — Aqui — Ele clicou num PDF intitulado "traduzido" e entregou a parceira abstraída.
  — Nicolas, veja, como imaginei — Ela indicou um texto. — Diana Tolstova. Possível hora da morte: 9:30PM. Descendente de uma família russa… — Emilly satisfeita atrapalhou sua própria recitação — Falei que era russ—
  Ele prosseguiu a leitura de um jeito meio robótico:
  — … Conhecida por uma rara insuficiência cardíaca. Solicitação do uso de um marcapasso — Nicolas estalou as mãos fabulosamente. — Ah! Já sei onde quer chegar. Certas desestabilizações magnéticas, como de um detector, podem danificar esse tipo de aparelho.
  Emily colocou o dedo no queixo.
  — Isso — matutou. — Mas pelo tamanho desse corredor Diana poderia correr por ajuda. Hum, talvez, a confusão a fez cair pela janela.
  — Só há um erro nesse seu princípio — o investigador apontou para detrás do verificador — O cabo de alimentação está desligado…
  — A ponta do cabo está limpa demais e um dos plugues está torto… — a garota focou na metade do fio amassado — O culpado deve ter tido a audácia de voltar na cena do crime e ardilosamente puxar a tomada com o pé. Antes ou depois de isolarem a área, essa é a questão…
  Nicolas encolheu suas bochechas firmes.
  — Nossa, você é tão esperta. É a mais parecida com Erick…
  — Isso era para ser um elogio? Sabe que não se fala de Erick Silva nesse departamento!...
  O casal rompeu uma discussão sobre gabações, no entanto, pularam a briga quando se deram conta do trajeto da janela quebrada.
  Colocaram luvas e caminharam pelo percurso.
  O criptozoologista notou uma aguda dor no dedo do pé, que cresceu até se tornar insuportável.
  — Ai! — Ele se equilibrou com uma perna para examinar a outra.
  — Se machucou? — Emily não obteve resposta.
  Nicolas agachou-se em um rastro angular que finalizava em um quadrado sitiado, quase perfeitamente, por poeira. Esse padrão se repetia em todos os móveis.
  — O que acha que significa, Emilly?
  A jovem tramou na sua cabeça o ocorrido.
  — As instantes parecem ter sido empurrados. Note, no sentido das paredes, como se quisesse abrir espaço.
  Como se tudo fosse cronometrado para eu bater meu pé aqui.
  O adolescente agachado e cabreiro, tirou as luvas e esfregou a poeira entre os dedos. Emilly deu um tapa na própria testa enquanto o investigador monóloga:
  — Abrir espaço para o detector… há tantos outros lugares mais técnicos — Nicolas ergueu o dedo do meio em xingamento ou, decerto, buscando a direção do vento. — Hum… se essa janela não tivesse sido quebrada, essa dependência não teria correntes de ar… interessante…
  — Mas… só isso?! Ninguém estranhou um verificador sem utilidade nenhuma aqui. O que aconteceu com "não mexam na cena do delito"?!
  — A não ser que tenham feito isso a muito mais tempo. O assassino pode ter feito isso a dias para não levantar suspeitas depois.
  — Boa, além disto, o fato de que ele precisaria saber da doença cardíaca de Marilyn, implica que é alguém familiar de dentro do aeroporto — acrescentou a garota.
  Emilly avançou até a beira da extensa janela arrebentada e agachou-se mais uma vez para o chão.
  — Nicolas… — seu rosto ficou confuso. — Cadê o corpo?
  O criptozoologista a seguiu e executou a mesma pose da colega.
  A direção de sua visão era uma parábola vertiginosa que tinha como fim respingos escuros e vermelhos, cujo formato assemelhava-se a uma gravura caríssima de uma explosão, isto é, no lugar onde deveria existir um cadáver coberto por um saco plástico. A chuva borrifava na vizinhança do desenho bizarro, em razão do extenso beiral do teto.
  Nicolas abriu a boca para pronunciar alguma coisa mórbida e duplamente estranha.
  — Agora… seria bom que nos separássemos para procurá-la…
  A garota, como se já estivesse acostumado com essas situações, retrucou:
  — Claro, se não ferimos um dos mandamentos do terror — elevou-se limpando-se. — Ok… pelo menos temos uma coisa que personagens de filmes de terror não tem.
  O investigador agarrou seu próprio pescoço.
  — Gravatas mecânicas assassinas?
  — Não. Celulares funcionando — Ela tirou o objeto do haori, o teclado digital do bate-papo tinha letras remodeladas em taquigramas — Me escreva se vir algo… morto.
  O par, como todas as duplas do Internato, tinha sua própria linguagem estonográfica baseada no método Leite Alves, que consistia em atribuir um taquigrama para cada som vogal, consonantal ou par de fonemas homorgânicos. Existiam dez taquigramas que representam o som das consoantes, os seis fonemas homorgânicos já apresentados e as consoantes: L, M, N e R. E seis vogais (a vogal E é separada entre aguda e grave) a fim de dificultar a interpretação para qualquer um que não fosse eles.
  — Eu quero conseguir mais provas de que esse lugar é um Ponto Oculto, e você está segurando mais uma. Se eu estiver certo, aparelhos como esse não devem estar funcionando bem aqui — Nicolas também tirou algo do bolso do haori — Por isso eu prefiro uma boa e velha caderneta.
  — Que seja. Apenas fique de olho em poeira. Poeira, é a melhor amiga de um bom detetive…
  E logo eles haviam se desgrudado. Emilly foi para o segundo andar e Nicolas foi para o primeiro.

Ystería no Voo7300Onde histórias criam vida. Descubra agora