CAPÍTULO 18. Sabatina 2

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ERIS

— Estou pronta para ser sabatinada — pego a garrafa térmica e me sirvo do líquido quente — como quer fazer?

Misha passa a língua sutilmente pelo lábio inferior e segura seu queixo com o polegar e o indicador. Seu rosto demonstra uma fisionomia animada e logo dá espaço para o ar de menina moleca que é a marca dela.

— Podemos fazer do jeito clássico. Eu te faço uma pergunta, se você me responder de forma sincera... pode me perguntar algo e por aí vai — ela foca em minhas mãos — pelo cheirinho disso, é limão com gengibre, não é?

Balanço a cabeça em afirmação e estendo para ela a tampa que nos serve como uma caneca.

— Pelo amor de Maria Bethânia, eu nunca pensei que fosse dizer que chá é gostoso, ainda mais esse. Você está criando um monstro, Eris. 

Mas eu só consigo rir. Chega a ser assustadora a forma como essa garota consegue roubar risadas minhas.

— Podemos fazer assim — pisco um dos meus olhos para ela — você começa. 

Quem diria que aos 26 anos eu estaria sentada no meu carro brincando de perguntas e respostas com a enteada da minha irmã. Mas se é isso o que eu preciso fazer para que ela me escute, então é isso que faremos.

— Vou começar levinho — ela limpa a garganta — qual foi o show que mais marcou a sua vida?

Eu já fui a muitos muitos shows na minha vida e nessa conta eu incluo do acústico voz e violão aos mega eventos, mas nenhum nunca vai barrar...

— Eu deveria ter uns 13 ou 14 anos e eu enchi a porra da paciência do meu pai para me levar ao Lollapalooza, porque o Foo Fighters ia tocar. Nessa idade eu já tinha mais de 1,70 m de altura mas ainda era menor... precisávamos dele. Então, ele acabou levando a Haru e eu para o tal festival. Lembro de olhar a Haru gritando animada e o meu pai com os olhos fechados, curtindo a vibe de uma música em específico. No caminho de casa, ele disse que tinha amado o show. Misha, foi o meu pai quem nos apresentou nossas bandas favoritas. Naquele dia, eu apresentei algo que ele acabou gostando... e para mim isso foi o ápice. Com certeza foi o melhor show da minha vida.

— Muito justo ter sido o melhor. Essa música... é a que você tatuou na costela? — alguém aqui é detalhista. Balanço a cabeça em afirmação enquanto Misha passeia com seus dedos pela minha perna, subindo e descendo lentamente — Walk, minha primeira tatuagem.

Eu daria muita coisa para tê-lo de volta.

Eu daria muita coisa para ter mais do meu pai que apenas um trecho de música gravado em minha pele.

— Minha vez — isso vai ser divertido — Se você pudesse escolher qualquer pessoa do mundo, quem você convidaria para um jantar?

Misha abriu um sorriso tão largo e espontâneo.

— O Belchior, sem sombras de dúvidas — automaticamente me recordo do LP que ganhei no natal deste ano e foi ela quem escolheu — eu queria apenas 10 minutos com ele para dizer: sim, eu entendi você e suas músicas, Belchior.

Misha aparenta ter muita propriedade do que fala e isso só a torna mais interessante.

— Se você soubesse quem era o meu pai quando me conheceu na noite do bar, teria se envolvido comigo? — ela me pergunta e bebe um pouco do chá.

Essa pergunta me tirou uma risada sincera.

— Você quer saber se eu seria sem juízo o bastante para me envolver com a filha de um Coronel da PM aposentado? — ela riu. — Sendo bem sincera? Provavelmente não.

ANTES QUE ELA VÁ EMBORA | ROMANCE LÉSBICOOnde histórias criam vida. Descubra agora